O
brincar precisa ser livre…
Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.
Guimarães Rosa
Experimentei, na infância, muitas quedas e machucados.
Meus pais toleravam os filhos pequenos, na hora das
brincadeiras, vivenciarem certos riscos. Consideravam
importante aprender a subir em árvores, andar a cavalo,
andar de bicicleta, aventurar-se no parquinho, apesar do
risco de quedas.
Óbvio. Quando me refiro a correr riscos, não estou
pensando em deixar uma criança suscetível a acidentes ou
colocar sua vida e saúde em real perigo. A ideia aqui é
simplesmente não se comportar o adulto, o que acompanha
a criança, com um excesso de zelo, impedindo-a, por
exemplo, de subir em árvores, jogar bola, correr no
quintal ou no parque, ainda que esteja assistida pela
sua supervisão discreta.
O que me assusta é ver a criança muito protegida.
Emparedada. Proibida de aprender a andar de patins,
correr descalça na grama ou decidir jogar bola na
pracinha.
Muitas brincadeiras dão às crianças a vivência da
coragem, determinação e até mesmo o choro quando há o
tombo inesperado. Tudo isso é importante, positivo, para
uma vida mais saudável, incentivando o treino de
habilidades sociais diversas, a superação de desafios,
decepções, frustrações, segundo um cardápio muito
presente na vida de um ser humano… Afinal, como bem
alertou Guimarães Rosa: “de sofrer e de amar, a gente
não se desfaz”.
O brincar livre e as atividades que testem imaginação,
criatividade e determinação, por exemplo - as
brincadeiras que ocorrem na pracinha, no parquinho, no
quintal etc. -, promovem uma série de benefícios para as
crianças, ajudando-as a crescer mais seguras e
conscientes de seus recursos.
Infelizmente, a criança muito protegida, cujas dinâmicas
lúdicas são muito restritivas, não conseguirá incorporar
lições colhidas do brincar destinadas à fundação da
autonomia. Crescerão dependentes, assustadas, inseguras
e, muitas vezes, influenciáveis pela vontade alheia.
No dia a dia não queremos que nossos filhos se machuquem
ou sofram. Contudo, precisamos ter em mente que nem
sempre vamos estar por perto e, por isso, é essencial
preparar nossos filhos desde cedo para a independência,
mesmo que seja doloroso às vezes vê-los cair da
bicicleta, machucar o dedo, arranhar o joelho…