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por Sandro Drumond Brandão

 

Orientações evangélico-doutrinárias no ambiente de trabalho


Ensinam os Espíritos ser missão dos encarnados trabalhar para o aperfeiçoamento uns dos outros e de suas instituições. [1]

Ambos os encargos aparecem lado a lado, em razão da feição sociointeracionista das criaturas, que na relação com o meio e com seus pares desenvolvem-se.

No interior das instituições as relações ocorrem a todo tempo impondo aos indivíduos o convívio uns com os outros, desafiando-os em seus vícios e virtudes.

Danielle Marques dos Ramos e Virgílio Gomes do Nascimento, em sucinto exame sobre a família, trataram do conceito de instituição[2]:

 

Foi Hegel quem deu destaque às instituições colocando-as na posição de fundadoras da sociedade (LOURAU, 1996). Sem as instituições a vida social seria impossível, pois elas servem de fonte norteadora para o que é permitido ou não; são elas que limitam a ação do indivíduo dentro de um espectro em que a racionalidade seja valorizada; sem as instituições o ser humano viveria na natureza levado apenas por seus instintos mais básicos: sede, fome, sexo, descanso. Portanto, as instituições são criações humanas para regulação de seu convívio social, ou, nas palavras de Durkheim (apud SCOTT, 1996, p. 10), "são produtos da interação humana".

 

Destacaram, ainda, que mencionado conceito é tido por muitos autores como algo complexo, sendo muitas vezes tratado como sinônimo de organização[3]. No entanto, isto não será empecilho para o desenrolar deste modesto ensaio. Como ensina Kardec[4] na presença de um “(...) objetivo tão importante, seria pueril fazer uma questão de princípio de uma questão de palavra. Isto provaria que se liga mais importância às palavras do que à coisa.”

Empresas, órgãos públicos e entidades são ambientes de trabalho onde desenvolvem-se diariamente, no interior e fora de suas delimitações físicas, relações sociais de poder, hierarquia e cooperação regidas por um conjunto de normas e princípios, a orientarem seus integrantes na realização de seu escopo institucional.

Celeiro de relações sociais, mencionadas organizações coletivas naturalmente impõem a seus integrantes convivência direta e aproximada, a lhes reivindicar um dever. Aqui falamos do dever moral e não o imposto pelas profissões. Daquele que “(...) principia, para cada um de vós, exatamente no ponto em que ameaçais a felicidade ou a tranquilidade do vosso próximo; acaba no limite que não desejais ninguém transponha com relação a vós.”[5]

Este íntimo encargo moral, entregue ao livre-arbítrio do ser e regulado pelo aguilhão de sua consciência, é efeito de sua condição de obra da Criação, sendo norte em todas as suas relações sociais, incluindo a profissional.

Desta forma, é possível importar de maneira crítica as exortações evangélico-doutrinárias para um manual de postura do indivíduo perante o seu trabalho. Vejamos, então, algumas destas recomendações.

Não devemos falar mal do local de trabalho, pois é preciso recordar que aonde nos encontramos e com quem convivemos resulta da iniciativa do Poder Maior, que nos supervisiona os caminhos. É preciso nos manter fieis aos desígnios divinos atendendo as obrigações que nos foram reservadas. Paulo ressalta que cada despenseiro deve se manter fiel.[6]

Devemos nos abster da fofoca e da maledicência no ambiente de trabalho pois, não pode a língua estar a serviço de nossos melindres e leviandades, bem como não nos compete a condição de críticos de Deus, mas, a de cooperador. Assim nos alertou Tiago:

 

“Irmãos, não faleis mal uns dos outros. Quem fala mal de um irmão, fala mal da lei e julga a lei; e, se tu julgas a lei, já não és observador da lei, mas juiz.” (Tiago, 4:11.)

 

O mau humor e o azedume no ambiente de trabalho dever ser evitado pela aceitação das adversidades do dia e para prevenirmos o contagio[7] espiritual e emocional do meio e dos colegas de trabalho. Paulo nos alertou que não devemos nos deixar vencer pelo mal.[8]

A insubordinação no ambiente de trabalho olvida os deveres sagrados do subalterno. O Espiritismo nos ensina a resignação em relação à nossa atual posição, nos lembrando ser ela prova para a humildade necessária ao nosso adiantamento. Jesus nos ensinou que devemos dar “(...) a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.” (Mateus, 22:15).

Imprescindível a cooperação através do trabalho em equipe a nos recordar que devemos executar da melhor maneira possível a missão que nos foi confiada. Pois nisto, como nos lembra o Mestre Jesus, “(...) todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros.” (João, 13:35.)

A soberba no ambiente do trabalho também deve ser afastada. Cristo nos ensinou que a humildade é a virtude a desencadear todas as outras.

 

“Quando fores convidado por alguém para um casamento, não te reclines no primeiro lugar, para que não aconteça que alguém mais digno do que tu tenha sido convidado e quem convidou a ti e a ele venha a te dizer: ‘Dá o lugar a este’. Então irás, envergonhado, ocupar o último lugar.” (Evangelho de Lc,14: 8-10)

 

Quando líderes no ambiente profissional devemos compreender que a autoridade é uma delegação de que teremos de prestas contas. Seu exercício deverá ser providencial. Não se pode descurar dos subordinados quanto à fixação da boa diretriz e do bom exemplo, bem como no que toca ao adequado tratamento a eles dispensado[9]. Assim nos orienta o Mestre:

 

Se alguém deseja ser o primeiro, será o último, e servo de todos”. (Marcos, 9:35)

Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas.” (João 10:11)

 

Se em nosso ambiente profissional Deus nos testa com um adversário e a perseguição lembremos que amar um inimigo é a mais sublime aplicação do princípio da caridade, pois, representa autossuperação, uma vitória sobre o orgulho e o egoísmo.

 

“Aprendestes que foi dito: “Amareis o vosso próximo e odiareis os vossos inimigos.” Eu, porém, vos digo: “Amai os vossos inimigos; fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos perseguem e caluniam, a fim de serdes filhos do vosso Pai que está nos céus e que faz se levante o Sol para os bons e para os maus e que chova sobre os justos e os injustos. Porque, se só amardes os que vos amam, qual será a vossa recompensa? Não procedem assim também os publicanos? Se apenas os vossos irmãos saudardes, que é o que com isso fazeis mais do que os outros? Não fazem outro tanto os pagãos?” (Mateus, 5:43 a 47.)

 

No ambiente profissional, o encarnado tem a oportunidade de, através da observância dos preceitos cristãos, auxiliar o progresso do outro e da instituição a qual esteja vinculado. Ocupação sem fruto é ofício sem utilidade.


Referências bibliográficas:

DIAS, Haroldo Dutra (Trad.), 1971- O novo testamento, tradução de Haroldo Dutra Dias. – 1. ed. – 11. imp. – Brasília: FEB, 2020.

KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018.

KARDEC Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2013.


 

[1] KARDEC Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2013. P. 301.

[2] LINK-1 Acesso: 18.02.2024

[3] “A existência de hierarquias representativas de poder é muito maior nas organizações do que nas instituições (SCOTT, 1996). É claro que dentro de uma instituição como a família, por exemplo, essa verticalidade é notada na posição ocupada pelo pai, pela mãe e pelos filhos. Contudo, nestas as diferenças de poder são naturalizadas e não se apresentam como socialmente construídas. Em uma empresa, o poder exercido pelos diretores está "escrito" nas normas de funcionamento da mesma; a hierarquização é produto dos indivíduos, não é natural; esta é abertamente definida. Isso se torna evidente quando um novo membro é aceito na organização. Este deve tomar ciência das regras organizacionais vigentes através de outros colegas mais antigos e passar a adotar os valores inscritos nessa organização (SCOTT, 1996)” LINK-2 Acesso: 18.02.2024

[4] LINK-3 Acesso 18.02.2024.

[5] KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. P. 237.

[6] “Além disso, requer-se nos despenseiros que cada um se ache fiel.” – Paulo. (2ª Epístola aos Coríntios, 4:2.)

[7] “Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda?” – Paulo. (1ª Epístola aos Coríntios, 5:6.)

[8] “Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem”. – Paulo. (Romanos, 12:21.)

[9] “Fiz-me fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos para, por todos os meios, chegar a salvar alguns.” – Paulo. (1ª Epístola aos Coríntios, 9:22.)


 

     
     

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 Revista Semanal de Divulgação Espírita