O jejum e as atividades espirituais
A vida na Terra durante a pré-história não foi um
período fácil. Não
apenas pelas dificuldades particulares do ambiente, mas
também pela própria condição evolutiva do ser humano. A
versão moderna do Homo sapiens sapiens já
constava há 130.000 anos atrás e
tem adaptações em seu corpo que permitiu maior
flexibilidade e eficácia para enfrentar os desafios da
época do que seus antecessores. Além do crânio e do
cérebro, uma das grandes questões era a alimentação que
exigia também uma estrutura e funcionalidades do corpo
para estocar energia quando houvesse escassez de comida.
O que não era raro naquele tempo. Sabe-se que as
primeiras populações humanas eram caçadoras e migravam
em busca da sobrevivência de acordo com as condições
climáticas e a disponibilidade de alimento. Não é de
estranhar então que, se houvesse necessidade de estocar
comida, haveria de ser algo relacionado com as carnes e
gorduras, fonte de calorias e sobrevivência. O corpo
deveria criar algum tipo de mecanismo para se ajustar
aos períodos de fartura e de escassez. Além disso, os
próprios seres humanos deveriam criar estratégias
comportamentais que amenizassem tal problema. Segundo
pesquisas da Universidade de Tel Aviv,
há evidências que os hominídeos aprenderam a estocar
ossos de cervos em suas cavernas e lugares de convívio
há mais de 400.000 anos atrás. Guardar partes
específicas de certos animais, com interesse neste caso
dos tutanos e ossos, parecia ser uma fonte segura de
calorias para amenizar os dias incertos. Diferentemente
dos tempos atuais que há disponibilidade 24 horas de
comida e prateleiras e gôndolas repletas de opções.
Apesar de ainda existir problemas de alimentação e fome,
a condição humana melhorou. Não é de se admirar então
que, atualmente 10% da população brasileira sofre de
diabetes e que, no mundo há mais de 530 milhões de
pessoas com tal problema relacionado, em boa parte, ao
excesso crônico de alimentação.
Apesar do problema ser multifatorial, uma das possíveis
alternativas para evitar esta exposição crônica e
distúrbio do sistema gastroenergético é o jejum. A
atividade de ficar longas horas ou até mesmo dias sem se
alimentar possibilita gastar os recursos economizados no
corpo humano, ao invés de levar o sistema a fadiga
crônica e a exaustão.
Se usado com equilíbrio e bom senso, o jejum pode
auxiliar tanto no correto funcionamento do sistema
digestivo, como também permitir que haja uma maior
capacidade da pessoa operar sua vontade espiritual. Nem
tudo é matéria e não se deveria viver com a finalidade
de satisfação do estômago, da gula e de seus prazeres
materiais. É essencial perceber que a vida vai além. Há
propósitos mais elevados. Ademais, com o jejum é
possível enriquecer sua força espiritual a ponto de
estar mais capacitado para enfrentar situações de embate
espiritual. Por exemplo, na passagem de desobsessão
presente no Evangelho de Marcos (Cap. 9), um pai
desesperado traz seu filho para ser tratado por Jesus.
A criança está com um espírito impuro e que nem mesmo os
outros apóstolos conseguiram retirar. Segundo o mestre
Nazareno: "Essa espécie [de espírito impuro] só sai pela
oração e pelo jejum" (Marcos 9:29). Se a oração conecta
a pessoa com Deus, através do jejum vem o reforço da fé,
da energia e da confiança. Jesus então jejuava e
mantinha-se fortalecido através de sua prática.
Certamente o jejum sozinho não é suficiente para dar
este booster energético, mas acompanhado de
outras práticas pode se tornar um combo vencedor.
Oração, meditação, jejum, passes, água fluidificada,
leituras edificantes, solilóquios são alguns exemplos de
práticas espirituais que podem nos auxiliar nesta
jornada.
Entretanto, é preciso ser coerente e não ser extremista
a ponto de usar o jejum para prejudicar o corpo ou
então, usar o jejum como um ritual externo sem
propósitos. A medida do bom senso é fundamental.
Cada vez mais é preciso o equilíbrio e a harmonia, bem
como a possibilidade de estender o jejum para além da
dimensão física, em especial, aos sentimentos negativos,
críticas e criações mentais inferiores. É vital parar de
se alimentar de tais “comidas”, pois, para que as boas
obras sejam concretizadas no exterior, é preciso que o
imaterial esteja robusto e capacitado para levar a
empreitada adiante.
Enfim, o jejum é um meio que pode auxiliar no alcance
dos fins, lembrando sempre que: “Não é o que entra pela
boca que torna o homem impuro, mas o que sai da boca,
isso é que torna o homem impuro” (Mateus, 15,11.)