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por Josias Bezerra Farias e Maria Cristina de Abreu

“Não vim destruir a lei”


No artigo “Por que Israel não tem constituição e como funciona o Judiciário no país?”, publicado em março de 2023 no portal G1, as jornalistas Fernanda Berlinck e Nayara Fernandes discorrem sobre a crise política em Israel. “Tal crise se dá devido a um pacote de novas medidas propostas pelo primeiro-ministro e que essencialmente ampliam os poderes do Parlamento em relação à Suprema Corte no país.”

Israel é um país que não tem Constituição Federal, e os Poderes são orientados por “Leis Básicas” que foram criadas como esboço de uma possível “Lei Maior”. Até o surgimento das Leis Básicas a nação israelita, por longa data, foi direta ou indiretamente orientada pelos escritos sagrados do profeta Moisés.

No tempo em que os hebreus atravessaram o deserto, vindos do Egito, no Monte Sinai Moisés recebeu diretamente do Senhor os dez mandamentos, uma lei invariável, de caráter divino, com muita influência no comportamento humano até os dias atuais.

Além dos dez mandamentos, Moisés precisou também formular, naquela época, leis civis destinadas a disciplinar costumes e preconceitos que os hebreus traziam desde quando foram escravizados no Egito. Acrescentou outros seiscentos e três mandamentos e deste conjunto originou-se o “Pentateuco”, ou simplesmente “Torá”.

“A Torá compõe os 5 primeiros livros do livro sagrado da religião judaica e tem origem no termo hebraico Yará, que significa ensinamento, instrução ou lei. É considerada um guia para os judeus, com 613 mandamentos que ensinam como devem ou não agir, seja nas relações sociais, familiares, religiosas, por exemplo”.1

Necessário foi que a estas Leis Moisés atribuísse caráter divino com a intenção de impressionar e fazer com que aquelas pessoas, ignorantes naquele tempo, pudessem obedecê-las. O aspecto divino destas leis girava em torno de um Deus terrível, que castigava e punia quem não as cumprisse.

Um Espírito Israelitacitado por Kardec no primeiro capítulo do livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, nos diz que “A moral que Moisés ensinou era apropriada ao estado de adiantamento em que se encontravam os povos que ela se propunha regenerar [...]”.2

Analogamente à necessidade de Moisés, países que não têm Constituição Federal, ou aqueles regidos por “Leis Básicas” (como a nação israelita, por exemplo), se veem impelidos a “complementar” sua legislação de modo a abranger todas as necessidades de organização sobre os costumes, tradições, religiões etc. Contudo, será mesmo possível, através de legislação, reger todas as necessidades desse arcabouço social?

Na questão 794 d’ O Livro do Espíritos Kardec pergunta: Poderia a sociedade reger-se unicamente pelas leis naturais, (entende-se aqui lei natural como lei divina) sem o concurso das leis humanas? Objetivamente os amigos espirituais respondem“Poderia, se todos as compreendessem bem. Se os homens as quisessem praticar, elas bastariam. A sociedade, porém, tem suas exigências. São-lhe necessárias leis especiais”.3

Também o corrobora o comentário de Kardec à questão 795 d’O Livro dos Espíritos em que diz:

“A civilização criou necessidades novas para o homem, necessidades relativas à posição social que ele ocupe. Tem-se então que regular, por meio de leis humanas, os direitos e deveres dessa posição. Mas, influenciado pelas suas paixões, ele não raro tem criado direitos e deveres imaginários, que a lei natural condena e que os povos riscam de seus códigos à medida que progridem. A lei natural (divina, moral) é imutável e a mesma para todos; a lei humana é variável e progressiva. Na infância das sociedades, só esta pôde consagrar o direito do mais forte”.4

Tais colocações de Kardec remete-nos aos preceitos cristãos de que quando a Lei de Deus estiver gravada nos corações e na consciência das pessoas não haverá mais necessidade de tantas leis nem de constituições.

Entre a legislação mosaica e a chegada do Cristo passaram-se aproximadamente mil e quinhentos anos; Jesus veio habitar entre nós e pregou a palavra do Pai por todos os lugares onde passou. Numa de suas pregações, Ele disse “Não penseis que eu tenha vindo destruir a lei ou os profetas: não os vim destruir, mas cumpri-los: — porquanto, em verdade vos digo que o céu e a Terra não passarão, sem que tudo o que se acha na lei esteja perfeitamente cumprido, enquanto reste um único iota e um único ponto.” (S. Mateus, 5:17 e 18).3 Referia-se à Lei de Deus, escrita pelo profeta Moisés e, durante sua vida pública, cuidou de dar-lhe o verdadeiro significado, adaptado ao grau de adiantamento dos homens daquela época. (Só a título de esclarecimento, iota é a menor das letras hebraicas.)

“A Lei do Antigo Testamento teve em Moisés a sua personificação; a do Novo Testamento tem-na no Cristo, que introduziu [...] a moral evangélico-cristã, que há de renovar o mundo, aproximar os homens e torná-los irmãos; que há de fazer brotar de todos os corações a caridade e o amor ao próximo [...]”.3

Jesus modificou profundamente as leis de Moisés, fez uma verdadeira reforma, combatendo as práticas exteriores e as falsas interpretações, reduzindo-as à prescrição: “Amar a Deus acima de todas as coisas e o próximo como a si mesmo: aí estão a lei toda e os profetas”.3

Somente um ser animado pelo Espírito Divino poderia ter vindo para substituir o Deus severo, terrível, conhecido até então, por um Deus de puro amor; para nos dizer que a verdadeira vida não é a que transcorre na Terra e sim a que está no Reino dos Céus. Ele veio tirar todo o peso que carregamos e nos aconchegar em seu coração, nos dizendo que somos filhos muito amados de nosso Pai.

Ele disse que não tinha vindo destruir a lei de Deus e que veio aplicá-la; dizer que ela tinha que ser cumprida em toda a Terra. Mas não disse tudo, tendo em vista que o espírito humano ainda precisava alcançar um certo grau de madureza, e que a Ciência, com o tempo, contribuiria para a eclosão e o desenvolvimento das ideias.

“[...] É a lei do progresso, a que a natureza está submetida, que se cumpre, e o Espiritismo é a alavanca de que Deus se utiliza para fazer que a humanidade avance”.3

“São chegados os tempos em que se hão de desenvolver as ideias, para que se realizem os progressos que estão nos desígnios de Deus. Têm elas de seguir a mesma rota que percorreram as ideias de liberdade, suas precursoras […] a beleza e a santidade da moral tocarão os espíritos, que então abraçarão uma ciência que lhes dá a chave da vida futura e descerra as portas da felicidade eterna. Moisés abriu o caminho; Jesus continuou a obra; o Espiritismo a concluirá”.3

Jesus não destruiu a Lei de Deus, porque ela é natural, imutável, continua atual e abrange a Terra inteira. Nosso Mestre veio trazer a presença do Deus amoroso para nossas vidas. Suas palavras, cheias de compaixão, são direcionadas a cada um de nós que somos quais crianças carentes de consolo e necessitadas de sua mão segura a nos guiar no caminho de evolução; seus exemplos são como raios de luz a nos iluminar incessantemente. Cabe decidir, pelo livre-arbítrio, se vamos continuar criando leis materialistas, ou permitir que a luz do Cristo, Lei natural, seja a “Lei Maior” na regência de nossas vidas.


Bibliografia:

1. ENCICLOPÉDIA SIGNIFICADOS. Torá: o que é e significado do livro sagrado do judaísmo. Clique neste LINK, acessado em 18/03/2024.

2. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Trad. Salvador Gentile. São Paulo: Boa Nova, 2007. 287p. Cap. 1 - Eu não vim destruir a lei, p31.

3. KARDEC Allan: O Livro dos Espíritos. Trad. Salvador Gentile. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 2009. 352p. Livro III, Cap. VIII - Lei do progresso: Progresso da legislação humana, p. 250.


*Artigo participante do Concurso A Doutrina Explica 2023, promovido pelo Jornal Brasília Espírita em parceria com a revista eletrônica O Consolador e a Web Rádio Estação da Luz.
                

 

 

     
     

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