Artigos

por Mário Frigéri

 

A menina que não nasceu


Lemos há muitos anos em Seleções do Reader’s Digest de fevereiro de 1966 uma página memorável intitulada “Um diário inacabado”, de 
H. Schwab. O assunto ficou latejando em nosso inconsciente até que resolvemos escrever um poema sobre ele e demos-lhe o nome de “Diário de uma flor despetalada”. Ele apresenta uma narrativa comovente sobre o ciclo de vida de uma criança não nascida, expressa através do diário imaginário da própria criança. No título é utilizada a metáfora da flor para simbolizar a vida humana em seu estado mais frágil e precioso, criando uma atmosfera de ternura e sensibilidade ao longo dos versos.

A estrutura do poema, dividida em entradas datadas de diário, contribui para a sensação de progressão temporal e desenvolvimento do ser em gestação, desde a concepção até o trágico desfecho. Cada entrada revela novas descobertas e emoções da criança em formação, desde a alegria inicial até a ansiedade pelo contato com os pais.

A linguagem poética é simples e acessível, característica que reforça a inocência e pureza do nascituro, enquanto as rimas suaves e o ritmo cadenciado conferem fluidez e harmonia ao poema. Destaca-se também a repetição de temas como a relação com os pais e a curiosidade sobre o mundo exterior, elementos que reforçam a identificação emocional do leitor com a narrativa.

No entanto, é o desfecho abrupto e chocante que realmente impacta o leitor. Ele evoca uma mistura de tristeza, indignação e reflexão sobre a fragilidade da vida e as consequências de decisões tomadas de forma precipitada e irresponsável. Esse final surpreendente visa a transmitir uma mensagem poderosa sobre o valor e a sacralidade da vida humana desde seu início mais vulnerável.

Enfim, o poema combina uma narrativa delicada e poética com uma profunda e impactante mensagem sobre a beleza e a fragilidade da vida humana em seu estado mais embrionário. Através de uma linguagem simples e acessível, o poeta convida o leitor a refletir sobre temas complexos como o amor, a perda e o valor da vida, deixando uma marca indelével na consciência e na sensibilidade de quem o lê.

 

DIÁRIO DE UMA
FLOR DESPETALADA

 

5 de outubro

Hoje eu estou tão contente!

Começou minha vidinha!

Sou pequenina semente,

E também sou menininha...

 

19 de outubro

Eu já cresci um pouquinho.

Mamãe sabe? Ainda não...

Mas eu estou bem pertinho

De seu meigo coração.

 

25 de outubro

Já se desenha a boquinha...

Vou sorrir muito amanhã!

A primeira palavrinha

Que vou dizer é... mamã.

 

31 de outubro

Sou pura como a açucena,

Mas já tenho uma vaidade:

Embora assim tão pequena,

Já sou gente de verdade!

 

3 de novembro

Sinto o coração batendo

E dando leves saltinhos...

Também já estão crescendo

As perninhas e os bracinhos!

 

7 de novembro

Meu coração vai parar

Um dia... eu não sei quando.

Mas pra que me preocupar?

Eu só estou começando!

 

16 de novembro

Vou crescendo cada dia

Um pouquinho... sempre mais,

E toda a minha alegria

É logo abraçar meus pais.

 

19 de novembro

Meus dedinhos são tão finos

E transparentes, meu Deus!

Mesmo assim tão pequeninos

Eu os adoro: são meus!

 

24 de novembro

Mamãe ouviu, com receio,

Do doutor, pela manhã,

Que já me traz no seu seio...

Você está bem, mamã?

 

8 de dezembro

Já quase vejo! Isso vai

Excitando este “bebê”:

Como será meu papai?

Mamãe, como é você?

 

15 de dezembro

Meus olhos... são cor do céu,

Meus cabelos... cor de ouro.

Já tenho n’alma um troféu:

Meus papais são meu tesouro!

 

19 de dezembro

Logo, mamãe, quero estar

Abraçada ao seu colinho;

Também mal posso esperar

Pra lhe fazer um carinho!

 

24 de dezembro

Eu sinto o seu coração

Batendo juntinho ao meu.

Pode haver na Criação

Alguém mais feliz que eu?

 

25 de dezembro

Socorro! Estou morrendo!...

O meu coração parou!

Ó meu Deus... não compreendo...

A minha mãe... me M-A-T-O-U!...


Mário Frigéri é poeta, escritor, autor e youtuber com a mente e o coração voltados para o esplendor do Evangelho e da Doutrina Espírita. Reside em Campinas-SP.


 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita