No âmago da condição humana, a diversidade de
orientações sexuais transcende fronteiras culturais,
temporais e religiosas. A homossexualidade, uma
expressão da rica tapeçaria da identidade sexual, é um
fenômeno moldado pelos intrincados fios da história,
entrelaçado com os desafios contemporâneos dos aspectos
sociais e entranhado nas profundezas dos aspectos
psicológicos individuais.
Uma recente publicação no site da BBC1, sobre a punição
da homossexualidade com a pena de morte em alguns
países, serviu de alicerce para a estruturação deste
artigo, a respeito das complexidades apresentadas sobre
a visão restrita e inflexível acerca da
homossexualidade. As questões descritas têm o foco de
atenção para a análise da temática sob a égide da
Doutrina Espírita. Também se propõe a lançar luzes sobre
o assunto, na busca de esclarecimentos e instruções
sobre a ocorrência da homossexualidade e seu vínculo com
o processo evolutivo de cada Ser, bem como apresentar
que a homossexualidade se encontra como degrau evolutivo
nos propósitos da criação de Deus Pai, por meio do Seu
mais magnânimo atributo: o amor.
A concepção do ser humano como um ser espiritual em
constante evolução instiga uma profunda reflexão sobre a
diversidade sexual e o amor. A perspectiva espírita
enfatiza a importância do respeito mútuo, da aceitação e
da compreensão de que a orientação sexual constitui
apenas uma dimensão na jornada espiritual de cada
indivíduo. Ao explorar a interseção entre a
homossexualidade e o Espiritismo, emerge um diálogo
entre duas esferas frequentemente consideradas
separadas. Contudo, a visão Espírita direciona para a
compreensão sobre as nuances da sexualidade,
proporcionando perspectivas que podem enriquecer nossa
compreensão e fomentar a mútua aceitação.
No plano espiritual, a conceituação de gêneros
transcende a dualidade homem/mulher e se expande para
incluir uma compreensão mais ampla da energia e da
consciência. Algumas tradições espirituais consideram a
existência de energias masculinas e femininas em cada
ser, independentemente do sexo biológico, e enfatizam a
integração equilibrada dessas energias como parte do
caminho espiritual. Nesse contexto, a diversidade de
gêneros é vista como uma manifestação da riqueza e
complexidade da consciência universal, convidando à
aceitação, compreensão e respeito mútuo.
Sendo a reencarnação um processo fundamental da evolução
espiritual, os Espíritos têm a oportunidade de vivenciar
uma ampla gama de experiências, que incluem os
diferentes gêneros da criação e suas orientações
sexuais. A conceituação de gêneros no plano espiritual
não está restrita a um livro específico na doutrina
espírita, mas sim é derivada da interpretação dos
princípios fundamentais contidos nas obras de Allan
Kardec, que aborda temas relacionados à natureza da
alma, evolução espiritual e a pluralidade das
existências, que fornecem a base para a compreensão da
diversidade de experiências e identidades no plano
espiritual.
Ao mencionar a bissexualidade como um fenômeno que pode
estar presente em quase todas as criaturas, Emmanuel2 destaca
a complexidade e a diversidade das experiências
espirituais ao longo das existências terrenas. Essa
visão ampla e respeitosa das múltiplas vivências do
Espírito contribui para uma compreensão mais abrangente
da sexualidade, dentro do contexto da evolução
espiritual de cada criatura, em que as diferenças
individuais são valorizadas e compreendidas como
oportunidades de crescimento. A homossexualidade pode
ser reflexo das diversas vivências do Espírito ao longo
de suas encarnações, nas quais assumiu diferentes papéis
de gênero. Essa perspectiva busca explicar a
complexidade das identidades de gênero e orientações
sexuais, relacionando-as a um percurso evolutivo
espiritual ao longo do tempo.
Essas reflexões nos convidam a compreender a diversidade
humana sob uma ótica mais ampla, que considera não
apenas a realidade presente, mas também as experiências
passadas do Espírito em sua jornada evolutiva.
Essa abordagem amplia a compreensão de que o sexo
biológico atual não é o único determinante das
inclinações do Espírito, e que a jornada evolutiva
envolve uma diversidade de experiências para o
crescimento espiritual.
O codificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec3,
apresenta uma compreensão fundamental do Espírito como
sendo um ser incorpóreo e inteligente, desprovido de um
corpo físico. Ao questionar se os Espíritos têm sexo, a
resposta é clara: "Não como o entendeis, pois que os
sexos dependem da organização. Há entre eles amor e
simpatia, mas baseados na concordância dos sentimentos".
Aqui, é ressaltado que a noção de sexo está ligada à
organização física, enquanto o amor e a simpatia entre
os Espíritos se baseiam em afinidades espirituais,
independentes de gênero.
Ele explora mais profundamente a questão da diferença
entre os sexos no mundo espiritual4.
destacando que homens e mulheres têm deveres especiais,
igualmente importantes na ordem das coisas, sendo dois
elementos que se completam mutuamente. Kardec afirma
que, mesmo após a destruição do corpo físico, a
influência do organismo material pode persistir por
certo tempo. No entanto, à medida que o Espírito avança
em seu desenvolvimento, a influência da matéria se
apaga, e a questão do sexo se torna secundária diante
das características espirituais.
A escolha do sexo do corpo é considerada parte do plano
reencarnatório. É determinada pelas necessidades de
aprendizado e evolução do Espírito. Pela narrativa de
André Luiz5,
compreendemos o processo pelo qual os Espíritos passam
no planejamento antes de reencarnar, no qual escolhem
diversos aspectos de sua futura vida, incluindo o sexo
do corpo que irão habitar. Esse processo de escolha é
guiado por mentores espirituais e visa proporcionar as
experiências necessárias para o desenvolvimento
espiritual do indivíduo. Entre os Espíritos
desencarnados de evolução mais elevada, a escolha do
sexo para a reencarnação ocorre de maneira diferenciada,
envolvendo a renúncia de si mesmo. Algumas almas
grandiosas femininas podem solicitar em suas encarnações
a vestimenta masculina, para cumprir tarefas específicas
que requerem a renúncia de si mesmas. Essa ideia se
baseia na compreensão de que a evolução espiritual
envolve uma série de aprendizados, desafios e provações,
e que as almas, em sua busca pela elevação moral e
espiritual, podem escolher reencarnar como homens ou
mulheres para experienciar situações e contextos
diversos. Nesse contexto, a Doutrina Espírita enfatiza a
importância do amor ao próximo, da evolução moral e do
serviço desinteressado como caminhos para a elevação
espiritual.
Enfatiza Rodolfo Caligaris7 a
importância da relação sexual no casamento, destacando o
respeito, a compreensão mútua e o amor como elementos
fundamentais para uma vida sexual saudável e
satisfatória. Na doutrina espírita, o tema da
sexualidade também é abordado, porém com enfoque na
importância do equilíbrio e da vivência da sexualidade
de forma responsável e respeitosa.
A doutrina espírita ensina que a sexualidade é um
aspecto natural da vida humana, mas que deve ser
vivenciada com responsabilidade, respeito ao próximo e
dentro dos princípios do amor e da fraternidade. A
relação sexual no casamento é vista como uma expressão
do amor entre os cônjuges, devendo ser baseada no
respeito, na fidelidade e na busca pela evolução
espiritual conjunta.
Quanto à condição masculina ou feminina, relacionando-se
aos princípios da reencarnação e da lei de causa e
efeito, a doutrina espírita enfatiza que o uso
irresponsável da sexualidade, como a promiscuidade ou o
abuso sexual, é considerado prejudicial ao
desenvolvimento espiritual, exigindo correção. No
entanto, não condena a expressão sexual em si, mas
destaca que as relações devem ser baseadas em amor,
respeito e consentimento mútuo, independentemente da
orientação sexual.
Em suma, na visão espírita, quando se aborda a
homossexualidade, a luz recai sobre o amor e o respeito
que devem tecer as tramas da orientação sexual. A
essência reside no nobre tecido moral e ético que dá
forma aos relacionamentos, em que a orientação sexual
dos corações envolvidos é eclipsada pela grandeza desses
valores. Conforme o Espiritismo, ações prejudiciais às
consciências, seja no âmbito sexual ou em outros
aspectos da vida, demandam correção, encarada como uma
oportunidade para o crescimento espiritual, já que as
experiências e escolhas na vida terrena influenciam a
jornada espiritual das almas.
Referências bibliográficas:
1 ROSAS,
Paula. Os países que punem a homossexualidade com
pena de morte. [S. l.]: BBC News Mundo, 16
jan. 2023. Para ler, clique aqui: LINK -
Acesso em: 12 set. 2023.
2 XAVIER,
Francisco Cândido. Vida e Sexo. Pelo Espírito
Emmanuel. 1. ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 1970, p. 41-42.
3 KARDEC,
Allan. O Livro dos Espíritos. ed. Rio [de
Janeiro]: FEB, 2006, q. 200.
4 KARDEC,
Allan. Revista Espírita. Jornal de Estudos Psicológicos.
9° ano. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 1993,
p.6.
5 XAVIER,
Francisco Cândido. Missionários da Luz. Pelo
Espírito André Luiz. 1.ed. especial. Rio [de Janeiro]:
FEB, 1979, p. 167-194.
6 XAVIER,
Francisco Cândido. A Terra e o Semeador.
Entrevistas. Pelo Espírito Emmanuel. 1. ed. São Paulo:
IDE, 1975, p. 55 e 56.
6 Calligaris,
Rodolfo. A vida em Família. O Ajustamento Sexual
entre Cônjuges. 1. ed. São Paulo: IDE, 1976, p. 26 e 28.