Tema: Coragem, solidariedade
O Leão cantor
A cidade estava em festa, o circo havia chegado, um
circo grande, bonito, colorido, embandeirado.
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Desfilava pela rua com seus melhores artistas:
trapezistas, contorcionistas, mágicos, malabaristas...
A criançada gritava, numa incontida alegria, cada carro
que passava, a multidão aplaudia.
O último era o maior, chamava mais atenção. O carro,
todo enfeitado, era o carro do leão! Um leão de juba
larga, que rugia impaciente. Ao seu lado, o domador,
todo fardado, imponente!
Quando o desfile acabou, o povo bateu em retirada. Menos
Mariazinha, uma menininha, que nem sequer foi notada.
Curiosa, ela ficou e, pela passagem dos fundos, entrou.
Viu o grande picadeiro, os trapézios pendurados, viu um
urso que dormia, depois de ter almoçado, mas eis que
ouviu, de repente, um choro na jaula ao lado.
Ficou quietinha escutando. Era o leão chorando.
Tudo aquilo a assustava, pois nunca ouvira dizer que
fera também chorava.
- Ah seu Leão, por que chora? Em que lhe posso ajudar?
Diga logo, pois senão também começo a chorar.
E o leão, entre soluços, respondeu à boa menina:
- Ah, como eu sou infeliz, como é triste a minha sina,
imagine que me obrigam a ser mau, mas, entretanto, o que
eu quero é ser bonzinho, ir à escola, estudar canto!
Naquele momento, eis que surge o domador: o temível Dom
Chibata, ao lado de outro senhor.
Assim que o pobre leão percebeu seu domador, deu um
rugido tão forte que todo o circo tremeu. Mariazinha,
ouvindo aquilo, amedrontada fugiu, mas escondeu-se num
canto e bem caladinha ouviu:
- Este leão é terrível, vive rugindo, é feroz, se
escapulir algum dia, engolirá todos nós!
Felizmente, o domador foi-se embora, e logo o leão se
acalmou. E, mais cautelosa agora, a Mariazinha voltou.
- Que domador mentiroso, dizer isso de você. Um
leãozinho tão manso, por que mentira? Por quê?
- É porque se eu não rugir, se não fingir que estou
possesso, o público não aplaude e ele não faz sucesso.
- Então, por que não confessa de uma vez ao domador que
já se cansou de ser mau e agora quer ser cantor?
- Nem pense nisso, amiguinha, que surra que eu levaria!
E, certamente, do circo ele me despediria.
Mariazinha preocupada meditava sobre como proceder.
– Deus criou todos para a felicidade e livres para
escolher. Mas... sem o leão, o circo poderia até morrer?
E neste caso… os palhaços, contorcionistas e
trapezistas, do que iriam viver?
Mariazinha estava insegura, pois queria ajudar. Fechou
os olhos, respirou fundo, e começou a orar:
– Meu Deus, eu aqui peço, me ajude a decidir. Qual a
decisão certa, o que fazer, como agir? Se o leão está na
jaula, é porque Deus quer assim? Eu, tão pequena, cuido
da minha vida, e o destino dele… não cabe a mim?
Foi, então, que um bom espírito, enviado por Jesus,
chegou pertinho dela e lhe falou. Só que não foi com os
ouvidos que ela escutou. O que ocorreu foi que ideias,
que ela nem sabia se eram dela mesma, brotaram em sua
alma, com grande calma e certeza.
Disse ele:
– Os males cessam quando nada mais têm a ensinar. É
quando, então, surge quem já não os consegue tolerar.
Deus age no mundo através das circunstâncias e de cada
atitude boa. Alguém começará o mundo melhor… não perca a
chance, Mariazinha, seja você esta pessoa!
Bem mais confiante, sentindo uma inspiração, Mariazinha
decidiu voltar a falar com o leão.
- Eu tenho uma grande ideia e, se você aceitar, para a
plateia esta noite você não vai rugir, vai cantar!
E Mariazinha explicou sua ideia ao leão, que feliz
principiou a ensaiar sua canção.
Anoiteceu, e com a noite chegou a hora marcada de
começar o espetáculo. Delirava a criançada.
A algazarra ia aumentando, e o dono do circo foi logo
anunciando:
- Tenho agora, meus senhores, a grata satisfação de
apresentar vários números da mais alta sensação.
Vieram, então, malabaristas, o urso dançarino,
equilibristas, o número de mágica e os incríveis
trapezistas.
Até que o dono do circo, disse com emoção:
- Apresentamos agora nossa maior atração: Dom Chibata, o
corajoso e seu terrível leão!
A plateia aplaudiu, e Dom Chibata no picadeiro surgiu:
– Meus senhores e senhoras, vou agora apresentar o leão
mais perigoso que eu já consegui domar. Se um dia eu me
distrair na certa estarei perdido. Prestem bastante
atenção ao seu terrível rugido!
Mas quando o leão entrou, que vergonha passou Dom
Chibata… O leão não rugiu, entrou tranquilo, de
colarinho e gravata!
Foi aquela gargalhada. Ninguém estava entendendo nada.
Dom Chibata, enfurecido, avançou para o leão, pois nunca
sofrera na vida tamanha decepção. Mas, tomando a sua
frente, Mariazinha foi ligeiro. Pulou rápido, gritando,
no meio do picadeiro:
- Parem! Meus amigos, tenham pena do meu amigo leão, ele
nunca foi de briga, ele é mesmo da canção. Eu garanto
que ele é bom, mas se querem duvidar, sem chicote, sem
cadeira, nesta jaula irei entrar.
Dom Chibata, sem esperar um segundo, gritou para todo
mundo:
- Esta menina está louca, chega a dar pena a coitada. Se
ela entrar nesta jaula, vai ser devorada.
Contudo, naquele momento, no meio da confusão,
Mariazinha entrou na jaula e se abraçou ao leão.
O pobre do Dom Chibata ficou pálido, coitado, ao ver seu
leão feroz assim desmoralizado. Tentou dizer que o leão
devia estar caducando, mas todo o povo do circo pôs-se a
gritar reclamando:
- Queremos ouvir o leão cantar, queremos ouvir o leão
cantar!
- Pois se querem que ele cante – disse o domador –
cante! Eu não ponho embaraço, só não quero é que depois
me culpem pelo fracasso!
Sem perder tempo o leão, feliz, cheio de alegria, saiu
de dentro da jaula, e começou a cantoria. Quando o leão
terminou, toda a plateia aplaudiu..
Foi um sucesso estrondoso, pois assim, nunca se viu.
Porém, o mais engraçado, de todos, quem mais gostou, foi
o próprio Dom Chibata, que emocionado gritou:
- Bravo, bravo, maravilha, sucesso fenomenal, eu garanto
que no mundo nunca se viu coisa igual!
E imitando Mariazinha, cheio de terna emoção, no meio do
picadeiro, abraçou-se ao leão:
- Meu leão, meu leãozinho, palavra de domador, nunca
mais meterás medo. Agora serás cantor.
- Viva! - disse o leão feliz. – Obrigado, boa menina,
sua vinda ao circo foi uma intervenção divina!
Por isso, meus amiguinhos, fica aqui esta lição: Fazer o
bem exige coragem, coragem maior… que a de um leão.
Adaptação de Cristiana Prada da
história O Leão Cantor – coleção disquinho.