Desencarnação: problemas e soluções
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Jorge Gomes |
A viagem de retorno à vida espiritual é inevitável.
Há quem creia que
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nada se passa
depois da morte do corpo físico, subsistem os
que têm dúvidas e, por fim, há quem estude e
tenha uma ideia da problemática decorrente do
fenómeno da desencarnação. |
A primeira e indispensável pergunta de quem começa a
abordar o assunto é esta: a sede da consciência reside
mesmo no cérebro?
Muitas pessoas acreditam que sim. Aparentemente,
danificar o cérebro leva à morte do corpo material.
Ainda assim, nem sempre é esse o resultado, como ocorreu
com o famoso caso de Phineas Gage, nos Estados Unidos,
no século XIX: um trabalhador ferroviário de 25 anos
sofreu um acidente e ficou com uma barra de ferro a
atravessar-lhe a cabeça, destruindo boa parte do lobo
frontal esquerdo. Ao contrário das expectativas
recuperou, mas a personalidade afável que tinha
alterou-se: exteriorizava com alguma frequência estados
de irritabilidade que não lhe permitiram arranjar
trabalho, até que passado um par de anos normalizou e
tornou-se cocheiro de diligências (carruagens puxadas a
cavalo que antecederam os primeiros autocarros).
De qualquer modo, a interpretação simplista, de que sem
cérebro não há vida, não satisfaz os factos.
Recordo-me da minha avó que, no século passado, idosa
quanto baste, quando um locutor da televisão dizia
bom-dia, atenciosa, respondia-lhe sempre. Acreditava que
ele a estava a ver como ela o via, e seria má educação
silenciar. Expliquei-lhe algumas vezes que o senhor da
TV não nos estava a ver e não nos ouvia. Ela nunca
acreditou em mim, nem tão pouco me ofereceu o benefício
da dúvida.
O cérebro do corpo físico, como elucida numa
argumentação inteligente e factual o livro "Ciência da
vida após a morte", de Alexander Moreira-Almeida,
Humberto Schubert Coelho e Marianna Costa,
investigadores do NUPES-UFJF, não será mais do que o
equivalente a um aparelho de televisão como o de lá de
casa. O cérebro estará apenas a reproduzir o que o ser
espiritual (Espírito) está a emitir. Destruído o
cérebro, o "emissor da consciência" continua a funcionar
nela mesma.
Posto isso, seria leviandade ignorar evidências muito
sugestivas. A seleção de maior qualidade enquadra
fenómenos de experiências de quase-morte (EQM), de
mediunidade e de crianças que se lembram de vidas
passadas.
O caso Laufmann
Na "Revista Argentina de Psicologia Paranormal", de 28
de janeiro de 2020, Muldoon e Carrington (1951/1969)
descrevem este caso de experiência de quase-morte (EQM)
de W. Laufmann, um vendedor que tinha sido hospitalizado
por ter contraído uma doença não especificada,
aparentemente grave, em Omaha (EUA, Nebrasca).
Nas palavras do próprio Laufmann, “Estava ali, no meio
do quarto, e vi claramente o meu corpo, morto e deitado
na cama. Comecei a sair do quarto e encontrei um dos
médicos. Surpreendi-me… ele não me disse nada. Como o
médico não fez nenhum esforço para me impedir, fui em
direção à rua, onde encontrei um amigo, o Milton Bose.
Tentei cumprimentá-lo, dando-lhe uma palmadinha nas
costas, mas o meu braço atravessou-o. Era impossível
fazer com que me desse atenção. Vi-o atravessar a rua e
olhar para a montra de uma loja onde estava exposta uma
“roda gigante” em miniatura”.
Laufmann regressou ao seu quarto no hospital. Viu os
médicos à volta do seu corpo físico. Discutiam o seu
estado. Viu um dos médicos a aplicar uma corrente
elétrica nos seus pés, sentiu uma dor intensa e voltou a
corpo”. Isto tudo foi confirmado a posteriori.
O fantasma do órgão
Na prestigiada publicação científica THE NEW ENGLAND
JOURNAL OF MEDICINE, saiu a público em 22 de julho de
2024 um artigo intitulado "Phantom of the Organ",
escrito por um médico, John Guzzi.
Em síntese, após um transplante de fígado, ao despertar,
o paciente começa a ver uma senhora que mais ninguém vê:
o vulto de uma mulher de baixa estatura, de meia-idade,
de pele escura.
O médico não rejeita o relato do paciente. Tenta
compreendê-lo.
O beneficiário do transplante descreve a senhora
(Espírito desencarnado) como sendo bem intencionada.
Sente até paz na sua presença. O estado geral de saúde
do paciente era bom, mas a equipa médica interpreta a
visão: Seria delírio? Ou efeitos colaterais dos
medicamentos?
A dada altura do internamento no hospital o paciente
sente que esse Espírito é a própria doadora do fígado.
Intrigado, o médico vai conferir: pergunta ao colega que
extraiu o órgão transplantado qual era o aspeto de quem
doou o fígado e descobre que a descrição coincide com a
aparência do vulto descrito pelo paciente: “Uma senhora
de baixa estatura, de meia idade, pele escura”.
Outro caso entre muitos: Sam Taylor
Conhecidos por CORT (cases of reencarnation type/casos
sugestivos de reencarnação) há uma pesquisa divulgada
num artigo científico de Jim Tucker (2008), tão
interessante como tantos outros que este psiquiatra
investigou. Trata-se de Sam Taylor, uma criança
norte-americana.
Quando contava 18 meses, Sam disse ao pai, enquanto este
lhe mudava as fraldas: “Quando eu tinha a tua idade,
costumava mudar as tuas fraldas". Depois disso, o menino
adiantou que tinha sido o avô do atual pai na vida
anterior. Forneceu detalhes da sua vida e da dos seus
familiares.
Certa vez, a mãe de Sam perguntou-lhe se tinha irmãos ou
irmãs na vida anterior. Afirmou correta e
espontaneamente que havia uma irmã que fora assassinada.
Quando Sam tinha quatro anos e meio, a mãe mostrou-lhe
uma fotografia de um grupo com 16 meninos e 11 meninas:
Sam escolheu o jovem correspondente ao avô.
Forneceu outras informações corretas como o lugar
favorito do avô na casa, a comida que a sua avó lhe dava
todos os dias ("milkshake"), com que aparelho o
preparava (utilizava um processador, em vez de
liquidificador), que o pai de Sam tinha um brinquedo
especial (volante) em criança e também mostrou
espontaneamente o carro do avô numa fotografia.
Em suma, vistos estes três ramos de casuística
investigada com a maior seriedade, verifica-se que
categorias diferentes de fenómenos apontam para a
sobrevivência do ser espiritual.
O corpo físico não será, por isso, a fonte da vida, mas
um aparelho biológico perecível através do qual a vida
se exprime na recolha de experiências e aprendizagem.
Isso é muito significativo.
Viagem inevitável
A desencarnação é um fenómeno inevitável, uma viagem
anunciada sem conhecimento da data de partida. Sendo o
ser humano um Espírito que possui corpo espiritual e
corpo material, quando este último morre há um
desligamento e a existência do ser transfere-se para o
Plano Espiritual.
A obra de Allan Kardec é vasta e informativa sobre os
problemas que podemos enfrentar diante do fenómeno da
desencarnação. Particularmente no livro "O Céu e o
Inferno" tece considerações amplas, começando por
explicar que essas regiões não existem como as religiões
desenham. São apenas estados de consciência e, mesmo
quando enfrentamos dificuldades na vida espiritual,
podemos melhorar de vida e encontrar atividades que
multipliquem paz e alegria.
Como seria de esperar, todos esses estudos que Kardec
desenvolveu em meados do século XIX, na França,
replicam-se de forma espontânea nas atividades habituais
nos centros espíritas, sobretudo nas reuniões
mediúnicas. Era de esperar: são fenómenos naturais
subordinados a leis da natureza.
Estas reuniões semanais, fora do horário de trabalho
profissional, regra geral, têm em vista auxiliar
Espíritos necessitados de esclarecimento,
oferecendo-lhes apoio. Como naqueles momentos revelam
dificuldade em ultrapassar pelos seus próprios meios
estados de alma dominados pela inércia afetiva, estados
depressivos, por uma mente traumatizada pela iminência
de um acidente, desejo de vingança, rancor, mágoa, etc.,
numa imensa variedade de problemas, logo de início os
diálogos de auxílio começam por expor Espíritos
desencarnados com índice variável de sensação de dor
física e/ou psicológica, embora também, em elevada
minoria, de aparente ausência de dor.
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Neste universo de necessidade de ajuda, a maioria dos
Espíritos com que dialogamos nem sequer sabe que já está
na vida espiritual.
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Toda esta casuística deriva da realidade interior
habitual em cada um no seu dia a dia, já que vai ser
esta a retrair ou expandir as perceções espirituais,
ocultando ou revelando os benfeitores da Vida Maior que
a todos atendem, desde que desejem ser ajudados e
consigam fixar em si o auxílio generosamente oferecido.
É, assim, útil utilizar o dia a dia como o ginásio da
mente, no sentido de a espiritualizar. As recomendações
de Jesus de Nazaré sobre as virtudes – generosidade,
humildade, capacidade de perdoar, amor tão incondicional
quanto possível – devem ser de uso frequente. Só assim
se vence a inércia afetiva, eliminando uma miríade de
problemas normais, mas não definitivos, da libertação do
corpo físico, finda que esteja a bolsa de estudo que a
presente vida material configura.
Por palavras conhecidas, diferentes, mas sempre
realistas, Allan Kardec deixou bem explícito este
espelho de leis da natureza que regulam o ser humano:
"fora da caridade não há salvação".
Fonte dos gráficos - Pôster
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Jorge Gomes, ex-vice-presidente da Federação Espírita
Portuguesa, escritor e membro da ADEP - Associação de
Divulgadores de Espiritismo de Portugal, reside na
cidade do Porto, Portugal.