A expiação desconhecida
É bem conhecida dos espíritas a existência de expiações,
e alguns as associam, de imediato, à palavra carma, do
sânscrito, antiga língua sagrada indiana, significando
ação ou ato deliberado.
A Terra, ainda em estágio de mundo de provas e expiações
justifica, plenamente, a existência generalizada dos
sofrimentos, dores, dificuldades, cruzes, pontuando o
nosso cotidiano.
Revendo a definição de expiação, temos:
Expiação – pena que sofrem os Espíritos como punição das
faltas cometidas durante a vida corporal. A expiação,
sofrimento moral, ocorre no estado de erraticidade como
o sofrimento físico ocorre no estado corporal. As
vicissitudes e os tormentos da vida corporal são, ao
mesmo tempo, provas para o futuro e expiação do passado.1
Portanto, expiar está associado a uma falta, deslize, ou
algum erro, praticado em existências passadas, ou nesta
mesma, pois a nossa vida atual possui também o seu
passado, dito recente. Além disso, o conjunto de
tormentos da vida corporal, servem para não só expiar o
passado, mas também surgem, naturalmente das provas que
devemos enfrentar, de forma regular, pois sem elas,
jamais se atingiria a perfeição relativa.
Interessante destacar que no plano espiritual, em
princípio, não há expiação física, pois o Espírito está
livre da matéria, contudo o processo de desencarnação é
lento, ou seja, a influência provocada pelo perispírito,
ainda muito material, causa no Espírito um verdadeiro
tormento, quanto mais intenso, quanto mais tenha sido a
vida sensual e egoísta do Espírito, durante a sua última
reencarnação.
Quando se lê em obras subsidiárias que o Espírito tem
sede, fome, frio, cansaço..., deve-se entender estes
sofrimentos e dores como abstratos, pois o ser imortal, do
lado de lá, prescinde do alimento e do agasalho, mas
ainda sente estas necessitadas, pois o seu processo de
desencarnação, que significa a perda dos desejos e
necessidades materiais que possuía na Terra, ainda não
se completou, é preciso tempo e paciência, de modo que o
perispírito se desmaterialize.
O primeiro significado destacado, na definição anterior,
está bem enraizado nos adeptos da Doutrina espírita,
fala-se em doença, pobreza, fome..., e, imediatamente,
pensamos em expiações, esquecendo-nos, contudo, das
provas, com a capacidade de também comunicar estas
situações, são as expiações desconhecidas, da
maioria.
É por isso que na terceira obra fundamental do
Espiritismo, há um conceito fundamental para estabelecer
a diferença entre estes dois mecanismos de evolução - a
prova e a expiação. Oportuno lembrar que as missões
completam a lista de possibilidades para promover o
nosso progresso:
Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado
neste mundo denote a existência de uma determinada
falta. Muitas vezes são simples provas buscadas pelo
Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu
progresso. Assim, a expiação serve sempre de prova, mas
nem sempre a prova é uma expiação.2
Essa nuance sobre o conceito de expiação, pode ser
também notada por meio da leitura mais atenta da obra
mais básica do Espiritismo. Nesta, percebe-se,
claramente, um tipo de expiação que não está vinculada
apenas a deslizes passados, entretanto, todos nós a
experimentamos em grande extensão, e a todo momento:
Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?
“Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los
chegar à perfeição.
Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para
alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as
vicissitudes da existência corpórea: nisto é que
consiste a expiação. [...]3
Observemos não ter sido enfatizado ser esta expiação
apenas o resultado de condutas passadas, não, o próprio
processo de ocupar um corpo de carne - encarnar, impõe
ao Espírito certos desconfortos, tais como, fome, frio,
dor, sofrimentos físicos, medo, todos exemplos de
expiações sob a óptica de Deus.
É um tanto desconcertante observar o significado de
expiação sob este prisma, ou seja, já expiamos pelo
simples fato de encarnarmos pela primeira vez e, mais à
frente, toda a vez que reencarnamos. Cada vivência em um
mundo material define uma série de dificuldades,
chamadas também de expiações, aspecto pouco notado por
muitos.
Mais à frente, na mesma obra, encontramos:
Qual a finalidade da reencarnação?
“Expiação, melhoramento progressivo da Humanidade. Sem
isso, onde estaria a justiça?”4
Nesta resposta, é enfatizada a expiação como mecanismo
de construção do progresso dos Espíritos, sem distinguir
ou destacar uma das duas modalidades.
Dentro deste entendimento, quando se diz que a Terra
está caminhando para a categoria de Mundo de
Regeneração, e, conforme já foi revelado, a consolidação
desta transição está muito próxima, há que se observar
que nesta nova etapa evolutiva do planeta ainda se darão
muitas expiações para as almas que ainda têm que expiar
– faltas passadas, acrescidas das expiações
características da condição de Espírito reencarnado, ou
seja, as dores e sofrimentos comuns a todos os seres
vivos.
Referências:
1 KARDEC,
Allan. Instruções práticas sobre as manifestações
espíritas. Tradução Wallace Rodrigues. ed. 5.
Matão/SP: O Clarim, 1978.
2 KARDEC,
Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.
Tradução Evandro Noleto. ed, 2, imp. 1. Brasília/DF:
FEB, 2013. Bem-aventurados os aflitos. cap. V, it. 9.
3 KARDEC,
Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução Evandro
Noleto. ed. 4. imp. 5. Brasília/DF: FEB, 2018. q. 132.
4 KARDEC,
Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução Evandro
Noleto. ed. 4. imp. 5. Brasília/DF: FEB, 2018. q. 167.