Criar um filho com compromisso com a
verdade
O teu trabalho é a oficina em que podes forjar a tua
própria luz. Emmanuel
Você tem um filho pequeno e quer ensinar a ele ser
verdadeiro, comunicar-se sem mentir.
Há duas atitudes que ajudam a reforçar na criança a
importância do compromisso com a verdade.
Primeira atitude: a todo custo evite o medo. Amedrontar
uma criança é uma estratégia pobre de educação. É um
recurso que exige muito pouco de nós e que não funciona
realmente. E é abrir a porta para a criação, a invenção,
a mentira.
No geral, as crianças mentem para se defenderem contra a
violência dos adultos – e não só surras ou castigos
severos, mas também toda forma de correção que seja
injusta, excessiva, inadequada, muito mais relacionada
ao desejo de punir do que a uma proposta honesta de
educar bem.
Na convivência com os pais, quando uma criança percebe
na flexibilização da verdade a única maneira de escapar
da ira e tirania, ela muito provavelmente narrará uma
história diferente daquela que envolve sua parcela de
responsabilidade no acontecido… Mentirá para se proteger
(e isso poderá tornar-se um hábito).
Cometemos erros, óbvio. E podemos demonstrar para os
nossos filhos nossa própria dificuldade de criar com as
palavras quando nos sentimos desconfortáveis,
envergonhados, constrangidos. Se de manhã cedo alguém em
casa nos pergunta, por exemplo: “Não estou achando a
chave. Você a deixou em algum lugar?” Nós podemos, na
frente da criança, responder: “Eu adoraria dizer que não
perdi, mas eu perdi sim”. Ou ainda: “Eu queria poder
dizer que foi o gato, mas eu deixei em cima da pia”.
Isso revela à criança que a realidade é menos flexível
do que parece, mesmo quando isso é constrangedor. E
podemos falar a verdade sem receio das consequências.
Segunda atitude: converse sobre os sentimentos da
criança que a levaram a uma ação errada.
Quando se esqueceu de fazer a tarefa da escola, a
criança podia estar frustrada, chateada, com raiva,
contrariada, triste, com saudades, sentindo-se sozinha,
querendo carinho, ou muitas outras coisas. E conversar
sobre os sentimentos que causaram o comportamento dá-nos
chance de uma conexão profunda com a criança.
Nós todos estamos dispostos a muita coisa para não
perdermos a chance da conexão com nossos pares (isto é,
a chance de nos sentirmos dignos de amor). Se isso é
colocado em risco, podemos mentir e ter comportamentos
pouco saudáveis para nós e para os outros. Por isso, em
casa, com nossos filhos pequenos, preservar ambientes
emocionalmente seguros é tão importante. Só num terreno
seguro, sem risco de perda de afeto, a verdade pode
brotar e se desenvolver com segurança. Mas, ao
contrário, se o meio for violento, regido por um
autoritarismo duro, rígido, no qual haja constante
necessidade de luta, proteção e defesa, a criança criará
muros e escapismos, apoiando-se, por exemplo, nos
refúgios da imaginação e, com isso, no afrouxamento de
sua relação com a verdade.
Sem a sombra do medo, a criança consegue falar a verdade
e se tornar pouco a pouco uma força para a melhora do
mundo. No dia a dia, toda vez que a criança disser a
verdade, nós devemos ajudar com conexão, segurança e
amor. Uma boa comunicação se faz assim. Uma que tem
compromisso com a verdade e nunca, portanto, está
fundada no medo ou no autoritarismo fechado ao diálogo.