Cinco-marias

por Eugênia Pickina

 

Criar um filho com compromisso com a verdade


O teu trabalho é a oficina em que podes forjar a tua própria luz.
 Emmanuel


Você tem um filho pequeno e quer ensinar a ele ser verdadeiro, comunicar-se sem mentir.

Há duas atitudes que ajudam a reforçar na criança a importância do compromisso com a verdade.

Primeira atitude: a todo custo evite o medo. Amedrontar uma criança é uma estratégia pobre de educação. É um recurso que exige muito pouco de nós e que não funciona realmente. E é abrir a porta para a criação, a invenção, a mentira.

No geral, as crianças mentem para se defenderem contra a violência dos adultos – e não só surras ou castigos severos, mas também toda forma de correção que seja injusta, excessiva, inadequada, muito mais relacionada ao desejo de punir do que a uma proposta honesta de educar bem.

Na convivência com os pais, quando uma criança percebe na flexibilização da verdade a única maneira de escapar da ira e tirania, ela muito provavelmente narrará uma história diferente daquela que envolve sua parcela de responsabilidade no acontecido… Mentirá para se proteger (e isso poderá tornar-se um hábito).

Cometemos erros, óbvio. E podemos demonstrar para os nossos filhos nossa própria dificuldade de criar com as palavras quando nos sentimos desconfortáveis, envergonhados, constrangidos. Se de manhã cedo alguém em casa nos pergunta, por exemplo: “Não estou achando a chave. Você a deixou em algum lugar?” Nós podemos, na frente da criança, responder: “Eu adoraria dizer que não perdi, mas eu perdi sim”. Ou ainda: “Eu queria poder dizer que foi o gato, mas eu deixei em cima da pia”. Isso revela à criança que a realidade é menos flexível do que parece, mesmo quando isso é constrangedor. E podemos falar a verdade sem receio das consequências.

Segunda atitude: converse sobre os sentimentos da criança que a levaram a uma ação errada.

Quando se esqueceu de fazer a tarefa da escola, a criança podia estar frustrada, chateada, com raiva, contrariada, triste, com saudades, sentindo-se sozinha, querendo carinho, ou muitas outras coisas. E conversar sobre os sentimentos que causaram o comportamento dá-nos chance de uma conexão profunda com a criança.

Nós todos estamos dispostos a muita coisa para não perdermos a chance da conexão com nossos pares (isto é, a chance de nos sentirmos dignos de amor). Se isso é colocado em risco, podemos mentir e ter comportamentos pouco saudáveis para nós e para os outros. Por isso, em casa, com nossos filhos pequenos, preservar ambientes emocionalmente seguros é tão importante. Só num terreno seguro, sem risco de perda de afeto, a verdade pode brotar e se desenvolver com segurança. Mas, ao contrário, se o meio for violento, regido por um autoritarismo duro, rígido, no qual haja constante necessidade de luta, proteção e defesa, a criança criará muros e escapismos, apoiando-se, por exemplo, nos refúgios da imaginação e, com isso, no afrouxamento de sua relação com a verdade.

Sem a sombra do medo, a criança consegue falar a verdade e se tornar pouco a pouco uma força para a melhora do mundo. No dia a dia, toda vez que a criança disser a verdade, nós devemos ajudar com conexão, segurança e amor. Uma boa comunicação se faz assim. Uma que tem compromisso com a verdade e nunca, portanto, está fundada no medo ou no autoritarismo fechado ao diálogo.


 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita