Especial

por Cláudio Bueno da Silva

Exemplos vivos do movimento que precisamos construir

 

O mundo tem passado por significativas mudanças nas últimas décadas. Tudo está sendo recriado, adaptado, reinventado. Com o movimento espírita não deverá ser diferente.  Precisará se reorganizar de modo a não ficar anacrônico, sem conseguir se comunicar com o seu principal alvo: o ser humano. Não me refiro aos princípios doutrinários do Espiritismo, mas à forma de expressá-los e torná-los conhecidos.

Parece ser clara a necessidade de uma revitalização que englobe novas formas e métodos de atuação e participação que gerem um movimento espírita propositivo, de opinião e colaboração junto à sociedade. Que não apenas seduza pela reflexão dos seus princípios universais, mas que comova e estimule os adeptos a participarem convictamente do processo de transformação do mundo através desses princípios.  

O movimento espírita, dentro e fora do Brasil, tem inumeráveis exemplos de homens que trabalharam incansavelmente em muitas frentes de atuação, para consolidar no seu meio o Espiritismo aplicado à vida cotidiana. Sem os incríveis recursos que se tem hoje, esses homens fizeram no passado, apenas com as mãos e o coração, o que se espera de todo espírita consciente.

É espantoso o dinamismo, a convicção e a coerência desses desbravadores, que devem servir de modelo para a construção de um movimento espírita coerente, convicto e dinâmico que possa atender às angústias e necessidades dos homens contemporâneos.

Quanto mais atenta for a leitura das microbiografias que deixo abaixo, mais se reconhecerá a grandeza moral desses Espíritos, e quanto compreenderam com precisão a Doutrina Espírita. Reparem na amplitude de suas atividades. Reparem que todos viveram “no meio dos homens, dos seus irmãos”. Exatamente como fez Jesus.

Anália Franco (1853-1919)

Professora, alfabetizou meninos e meninas, brancos e pretos, pobres, enjeitados, combateu a fome e a ignorância. Feminista, escritora, jornalista, abolicionista e espírita convicta, defendeu os direitos da mulher, apoiou mães e filhos, órfãos e viúvas. Montou uma gráfica e publicou “A voz maternal” e “Álbum das meninas” em defesa da educação e justiça para todos. Fundou mais de 100 instituições de instrução e caridade. Criou cursos profissionalizantes, ensinando muita gente a “pescar”.


Cairbar Schutel (1869-1938)

Esse espírita escreveu em uma de suas mais importantes obras (Vida e atos dos apóstolos) o vigorosíssimo capítulo “Comunidade Cristã” no qual se lê isto: “quando o povo perguntou a João o que deveria fazer, o Batista respondeu: 'Aquele que tem duas túnicas, dê uma ao que não tem; e aquele que tem comida faça o mesmo'”.

“A dizer com franqueza – continua Cairbar Schutel – segundo a linguagem dos tempos atuais, os dois grandes Revolucionários Cristãos (Jesus e João Batista)eram francamente comunistas”. E finaliza: “Naturalmente que não se tratava de um Comunismo materialista, mas poderíamos intitulá-lo Comunismo Cristão”.

Cairbar Schutel teve importante participação no cenário político e social do interior paulista, atuou fortemente na imprensa espírita, foi escritor, radialista e polemista. Farmacêutico, doava remédios aos pobres. Acolhia doentes em sua própria casa. Culto e desprendido, se impunha moralmente na defesa dos princípios espíritas.

Eurípedes Barsanulfo (1880-1918)

Tornou-se espírita lendo Léon Denis. Nos seus estudos viu logo a força da Doutrina para educar a população. Altruísta, fez caridade a não poder mais; mentor da instrução e da cultura, escreveu muito contra os ataques ao Espiritismo, e por isso foi perseguido na Imprensa; médium portentoso, foi perseguido pela Igreja. Educador sempre lembrado.  Sacudiu a pequena cidade de Sacramento e todo o triângulo mineiro com a sua fidelidade irrestrita à verdade.

Fundou centro espírita, fundou farmácia popular com distribuição de remédios gratuitos. Fundou o Colégio Allan Kardec onde se aprendia astronomia e fundamentos da doutrina espírita. Atuou na política como vereador, trabalhando muito pelos pobres. Na juventude envolveu-se com as artes dramáticas.

Batuíra (1839-1909)

Fundou um jornal que se autodefinia como “órgão do espiritismo científico”. Os recursos que amealhou com o trabalho da vida inteira, aplicou-os junto aos pobres de São Paulo. Vegetariano. Desprendido dos bens materiais. Amante do Teatro, juntava estudantes e intelectuais em suas apresentações culturais. Polemizava com religiosos em defesa do Espiritismo. Abolicionista, protegia escravos foragidos. Sua casa era um misto de albergue, orfanato, hospital, centro espírita. Não desprezava os ricos, mas dava-se melhor com os pobres.

Herculano Pires (1914-1979)

Fiel tradutor das obras de Allan Kardec. Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo e vice-presidente do Sindicato dos Escritores de São Paulo. Defensor intransigente dos princípios doutrinários do Espiritismo. Denunciou adulterações de obras espíritas, bem como os movimentos paralelos que se intrometeram no movimento espírita. Mais de trinta anos com uma coluna de crônicas espíritas no jornal Diário de São Paulo. Escreveu mais de 80 livros. Fundou a revista Educação Espírita onde expõe temas do interesse da pedagogia espírita.

Jorge Rizzini (1924-2008)

Militou na literatura acadêmica, ganhando prêmios. Escreveu para teatro e para a infância e juventude. Biógrafo de Herculano Pires e outras personalidades. Fez televisão. Polemista, defendeu com unhas e dentes o Espiritismo e médiuns perseguidos pela igreja e pela imprensa. Fez na França e Estados Unidos vídeos históricos sobre Allan Kardec e as irmãs Fox.  Foi médium de poetas e músicos do além. Organizou famosos festivais de músicas mediúnicas. Atuou dentro e fora do movimento espírita. Referências ao seu nome são encontradas em revistas de circulação mundial. Idealista, autêntico e fiel à Doutrina Espírita.

Léon Denis (1846-1927)

Filósofo, escritor, participou de inúmeros congressos espíritas. Além das questões doutrinárias, tratou de relevantes temas sociais, discorreu sobre o valor da mulher na sociedade. De ideias socialistas, compreendeu muito bem as propostas originais da filosofia espírita. Detalhou magnificamente os prejuízos causados pelo catolicismo às ideias genuínas do cristianismo. Teve sempre um bom relacionamento com as classes operárias, colaborando com os seus trabalhos.

Selecionei esses nomes pela diversidade enorme de atividades em que atuaram.

Conclusão

Esses nomes não apenas referendaram os princípios fundamentais da Doutrina, como trouxeram contribuições práticas e teóricas no sentido de ampliar o entendimento doutrinário. Nenhum deles se preocupou com movimento religioso em si, mas com a formação de homens melhores na construção de uma sociedade melhor.

São praticamente unanimidade no que se refere ao seu caráter pessoal, à lisura, à honestidade intelectual, em que pese não serem perfeitos. Todos dedicaram suas vidas ao próximo. Todos se empenharam no combate ao mal, à ignorância. Todos viveram e lutaram pela educação intelectual e moral dos seus concidadãos, pela justiça social, pela transformação da sociedade através do amor, do conhecimento, da arte, da ciência e da revelação das verdades espirituais sem misticismos, sem religiosismo ingênuo, piegas.

Este é o movimento que os espíritas contemporâneos precisam construir doravante, coletivamente, inspirados por estes ilustres personagens do passado recente. Um Espiritismo que, erguendo a bandeira da caridade e soprando o clarim da liberdade e fraternidade, “desperte no povo gostos mais nobres, aspirações mais altas”; um “Espiritismo que pode influir poderosamente sobre a economia social e a vida pública”, como sonhava Léon Denis.

    

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita