A benevolência que não faz seleção...
É muito comum após as palestras que realizo nos centros
espíritas, mais especificamente nos bastidores, surgirem
perguntas referentes ao momento em que vivemos.
Como, por exemplo, lidar com divergências de toda ordem
de maneira leve e respeitar o ponto de vista alheio? Em
geral, a tendência é fazer com que nossa forma de ver o
mundo vença a disputa retórica, afinal, quem não quer
ter razão? Quem não quer bradar aos quatro ventos que
ganhou um debate verbal?
Entretanto, quando temos o Espiritismo a nortear nossa
conduta é muito mais coerente buscarmos a verdade ao
invés de uma vitória que pode até ser considerada de
Pirro.
Os Espíritos, aliás, ajudam nesta tarefa de fazer com
que respeitemos todos, principalmente aqueles que em
determinados momentos estão a divergir de nós.
Pois bem, essa ajuda dos Espíritos encontra-se em O
Livro dos Espíritos, na questão 886.
Dizem os Espíritos a Kardec que o sentido da caridade
conforme entendia Jesus é:
Benevolência para com todos, indulgência às faltas
alheias e perdão das ofensas.
Os Espíritos poderiam ter parado na benevolência com
todos que a resposta já estaria perfeita, o que vem
depois trata-se de algo a mais.
Percebam que a benevolência é geral, não importa se
torce para o time A ou B ou se vota em A ou B.
Aliás, a grande beleza da benevolência é para com o
divergente.
A generosidade se faz mais bela quando direcionada aos
adversários no campo das ideias. Qual o mérito, aliás,
de ser benevolente com quem pensa como nós? O mérito é
pequeno, até porque é um processo um tanto quanto
narcísico, pois ao celebrar junto ao convergente a
benevolência estamos, de certo modo, olhando para o
espelho.
O ponto é que, quase sempre, nossa benevolência é
seletiva: aos amigos a caridade, aos adversários minha
implacável perseguição.
Se o pensar caracteriza a individualidade do sujeito,
não dispensar ao outro benevolência é querer apagá-lo do
mundo, é não permitir com que seu pensamento possa
transitar e isto, por si, é um atentado contra a
liberdade; liberdade, inclusive, impressa e explicada
nas páginas de O Livro dos Espíritos.
A realidade é que quando nego ao outro o direito de
existir o que menos sou é benevolente. E existir implica
em ter o direito de pensar o oposto do que, a propósito,
pensa a maioria. A benevolência, contudo, não necessita
dizer “sim” ao que lhe traí, ao contrário disso, a
benevolência permite-nos também discordar. Não se chama
benevolência a concordância apenas para agradar ou
impedir o conflito, isto seria um contrassenso, chama-se
benevolência o ato de respeitar e dar dignidade ao
pensamento alheio mesmo que este nos contrarie.
A propósito, você, eu, nós, estamos dispostos a
"conceder", de forma benevolente, o direito ao outro de
existir?
Um ponto a pensar...