EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Família e
individualidade
É verdade que a
natureza
biológica do ser
humano (o legado
dos genes) é
insuficiente
para a
composição de
sua humanidade.
Por isso, não se
deve idealizar
as famílias,
tampouco
ignorá-las,
ainda que elas
sejam feitas
para serem
deixadas.
Juntos? Se a
família é a
condição da vida
social,
igualmente ela
comporta a
mistura da
animalidade e da
cultura, e por
isso ela dá e
recebe, até para
que o filho, ou
a filha, se vá e
caminhe o seu
caminho.
De fato, na
família há peso,
tensão,
desconcerto,
memórias
encobertas, e
eu, como quase
todos, estou em
boa posição para
tudo isso sentir-e-reconhecer,
sendo esses
elementos a
densa
matéria-prima de
meus contínuos
desalojamentos.
Cansaço das
condicionalidades
que se subjugam
à lei para
compor a
passagem entre
instinto e
razão. Entre os
dois? O afeto:
para que
aprendamos não
só a ética, mas
igualmente a
solidariedade e,
com sorte, o
companheirismo.
Onde termina a
família? Na
transmissão da
educação, tão
decisiva. Onde
continua a
família? Raras
vezes nas raízes
afetivas, muitas
vezes nas
dependências,
comuns à maioria
dos humanos.
Ora, quando
estamos nas
garras de uma
dependência,
estamos sempre
no passado, no
lugar de origem
e apenas
vagamente
conscientes,
pois teimamos em
(re)viver a
antiga trama do
filho rejeitado,
do preferido da
mamãe (e
sutilmente
controlado), do
ressentimento
dos irmãos ou da
esperança do
pai... Aqui, de
volta à família,
porque nunca a
largamos.
Como não somos
uma narrativa
única, o que é
doloroso é o
reconhecimento,
com a idade, de
que temos menos
autonomia na
construção de
nossas vidas do
que havíamos
suposto. Mas e a
educação? Em
geral, há
equívocos e
lacunas, mas o
que não
encontramos no
interior de
nossa família, a
vida certamente
disporá em
outros lugares,
caso estejamos
atentos e
espontaneamente
flexíveis ao
convívio com o
outro.
Além disso,
precisamos
entender a
necessidade de
considerar
algumas das
questões mais
inconscientes
que orientam
nossas vidas
para que estas
não se tornem
tão pequenas.
Penso,
sobretudo,
naquelas
perguntas que
dizem respeito à
autoestima e à
confiança, pois,
desse modo,
possamos,
movidos pela
paciência,
discernir, nas
diversas tramas
de nossas vidas,
entre escolha
real e traição
(in)voluntária
do nosso
propósito
existencial,
porquanto
nascemos para
ser e
florescer.
O fato é: se nos
afastamos da
consciência
será impossível
discernir o que
fizerem de nós
daquilo que
somos
essencialmente.
Então,
novamente, de
volta à família,
à espera de
culpados e à
mercê de um
sofrimento
inútil que nos
deixa inermes ou
reativos,
comportamentos
infecundos...
No caminho do
coração, podemos
nos arriscar e
encarar o
desafio de nosso
projeto de
florescência
para que
deixemos de
esbarrar
reiteradamente
nos limites de
escolha que
constringiram
nossa família de
origem. Aqui
talvez resida a
nossa redenção
para que não
sejamos o
personagem menor
(imaturo) de
uma história
(programação)
que se perdeu.