LEONARDO MARMO MOREIRA
leonardomarmo@gmail.com
São José dos Campos, São
Paulo (Brasil)
Emancipação da alma,
animismo e mediunidade:
onde termina um fenômeno
e começa o outro?
A determinação de uma
“fronteira” definitiva
que separe os fenômenos
denominados “Emancipação
da Alma”, “Animismo” e
“Mediunidade” não se
trata de uma tarefa
trivial. Tais definições
e, sobretudo,
diferenciações,
constituem estudos
complexos, pois,
provavelmente, não
exista uma distância
cabal entre esses
fenômenos. Este contato,
no mínimo “interfacial”
entre os fenômenos em
questão, ocorre devido
ao fato de que estes
três processos psíquicos
têm sua fundamentação
básica nas propriedades
do Perispírito.
De fato, tais fenômenos
estão calcados nas
características de
maleabilidade e
expansibilidade do
Perispírito. Alguns
autores, como a própria
Dona Yvonne Pereira,
utilizam a expressão
"Mediunidade de Sonhos",
denotando que, pelo
menos em alguns casos, o
sonho poderia se tratar
de um fenômeno
mediúnico, além de ser
uma Emancipação da Alma.
Realmente, a Emancipação
da Alma e a Mediunidade
são dois fenômenos muito
correlacionados.
Poderíamos dizer
"fenômenos irmãos".
Inicialmente, é
importante registrar que
Emancipação da Alma,
Animismo e Mediunidade
não são fenômenos
excludentes, pois podem
acontecer
concomitantemente. A
Emancipação da Alma
assim como o Animismo
poderiam, a priori,
acontecer das duas
formas, isto é, com ou
sem a presença de uma
atuação significativa de
um Espírito
desencarnado. A
Mediunidade, todavia,
sempre estaria associada
a uma manifestação
anímica, mesmo que tal
contribuição anímica
fosse muito pouco
representativa.
Possivelmente, Kardec
diferenciou a
Emancipação da Alma da
Mediunidade propriamente
considerada para
facilitar didaticamente
o nosso aprendizado.
Realmente, há fenômenos
de bilocação
(desdobramento), bem
como de Dupla Vista
(também chamada
Clarividência), em que
não existe a detecção de
nenhum Espírito
desencarnado. Neste
caso, pode-se afirmar
que se trata de
fenômenos, em princípio,
somente de Emancipação
da Alma, pois não existe
a participação ostensiva
e detectável pelo
encarnado de uma
inteligência
desencarnada.
No entanto, se nós
sonhamos e contatamos um
Espírito desencarnado,
tendo, por exemplo, uma
revelação espiritual,
esse fenômeno não deixa
de ser, realmente,
mediúnico, pois está
associado a um contato
com um ser espiritual
desencarnado. Seria, por
conseguinte, um fenômeno
misto, pois abrangeria
Mediunidade e
Emancipação da Alma, em
concordância com Allan
Kardec em "O Livro dos
Espíritos". Se, por
outro lado, ocorrer um
desdobramento simples,
sem nenhum contato com
entidade espiritual
desencarnada, podemos
dizer que foi apenas uma
Emancipação da Alma
“simples”, o que não
impede que, em outra
oportunidade, o mesmo
indivíduo apresente um
fenômeno misto ou
somente mediúnico, pois
a predisposição aos dois
fenômenos apresenta uma
mesma raiz fundamental
que é a facilidade de
maleabilidade e expansão
do Corpo Espiritual.
Vale lembrar que Chico
Xavier, Dona Yvonne do
Amaral Pereira e Divaldo
Pereira Franco,
indiscutíveis
referências doutrinárias
em matéria de
Mediunidade com Jesus,
sempre apresentaram,
concomitantemente aos
fenômenos mediúnicos,
extraordinários
fenômenos de Emancipação
da Alma.
De fato, a famosa
afirmação "Todos são
médiuns", que é
utilizada excessivamente
nos centros espíritas, é
apenas uma meia verdade.
Todos são médiuns em
potencial, como todos
que saibam escrever são
escritores em potencial;
como todos os que saibam
falar são oradores em
potencial; como a
semente de mangueira é
uma mangueira em
potencial etc.
Entretanto, é importante
convir que, dentro de um
determinado momento
específico no tempo, não
é razoável considerar
que uma enorme mangueira
é exatamente a mesma
coisa que uma semente de
mangueira. Seria o mesmo
que considerar que todas
as colheitas são obtidas
imediatamente após as
plantações,
independentemente do
tipo de semente
plantada.
O fato de todos serem
médiuns em potencial não
significa, portanto, que
todos são "médiuns de
ação", ou seja, "médiuns
ostensivos". Quando nós
dizemos de forma simples
e objetiva "João é
médium", queremos dizer
que sua mediunidade é
significativamente
ostensiva, isto é, que
ele é um médium de ação,
implicando que a
intensidade da
Mediunidade desse
indivíduo é
representativamente
superior àquela
encontrada na maioria
das criaturas humanas.
É também importante
asseverar que a
mediunidade basal comum
a todos os indivíduos,
por um lado, é, de fato,
significativa (em função
da importância dos
fenômenos intuitivos),
mas, por outro lado, é
tão sutil que faz com
que a maioria da
humanidade ignore a
própria existência da
Mediunidade. Se fosse
minimamente intensa para
todos os indivíduos do
planeta, não existiriam
tantos materialistas no
mundo. Não há como
comparar tal Mediunidade
com alguém que vê um
Espírito ou que
psicografa uma mensagem
mecanicamente. Trata-se
de uma análise
incoerente, pois os dois
tipos de fenômenos são
de intensidades
totalmente
desproporcionais! E
muitos dirigentes
espíritas,
equivocadamente,
utilizam dessa premissa
para respaldar um amplo
e irrestrito acesso às
reuniões mediúnicas, sob
o pretexto de que “todos
são médiuns”.
Kardec precisou frisar
esse fato (“Todos são
médiuns”), pois essa
"Mediunidade basal",
comum a todas as
criaturas, é o que faz
com que todos possam ser
obsidiados e/ou
inspirados por
“Espíritos de luz”. Isto
ocorre, pois todos nós,
em maior ou menor grau,
conscientes disto ou
não, manifestamos a
chamada "telepatia", que
é um pré-requisito
basilar do fenômeno
mediúnico. Desta forma,
Kardec valorizou esse
ponto, pois,
possivelmente, queria
utilizar essa discussão
para despertar o nosso
senso de
responsabilidade
espiritual com relação
aos próprios
pensamentos. Seria uma
maneira de ratificar,
ilustrar e dar maior
dimensão ao "Vigiai e
Orai" de Jesus. Ademais,
seria reforçar a
necessidade de reforma
íntima e vigilância de
todos os espíritas,
médiuns ou não. Afinal,
todas as pessoas, sem
exceção, podem vir a ser
obsidiadas, justamente
em função da
possibilidade de
comunicação telepática
com outrem, o que é
inerente a todos os
seres espirituais,
encarnados ou não.
A discussão deste tema
nos leva, indiretamente,
a analisar a definição
de Mediunidade. Entre
várias definições
coerentes com os
postulados Kardequianos
encontradas no movimento
espírita, é possível que
uma definição bem
próxima àquela utilizada
por Divaldo Pereira
Franco em suas palestras
favoreça a nossa
compreensão inicial do
fenômeno mediúnico:
"Mediunidade é uma
faculdade de intercâmbio
espiritual inerente ao
Espírito que
determinada
predisposição orgânica
e/ou perispiritual
favorece em maior ou
menor grau sua
manifestação". Essa
definição consegue
abranger, por exemplo,
os fenômenos mediúnicos
que ocorrem no mundo
espiritual, já que não
restringe o fenômeno
mediúnico a um processo
puramente físico.
Importante adir que tal
definição também é
respaldada pelos ensinos
do Dr. Bezerra de
Menezes na obra de
Yvonne Pereira
"Recordações da
Mediunidade", onde o
Benfeitor afirma que os
grandes médiuns são
preparados para suas
tarefas, normalmente, em
mais de uma encarnação,
denotando que é uma
faculdade do Ser
Espiritual, muito
embora, também dependa
de condições
perispirituais e
orgânicas.
Um adendo relevante diz
respeito aos termos
vidência e
audiência/clarividência
e clariaudiência, pois,
de fato, existe certa
confusão no movimento
espírita, e, muitas
vezes, só conseguimos
decodificar o que o
autor está enunciando
pelo contexto da frase.
No entanto, o emprego
dos referidos termos
utilizados por Allan
Kardec, ainda parece ser
o mais conveniente.
Para o Codificador do
Espiritismo, vidência
seria basicamente a
Mediunidade de ver
Espíritos desencarnados,
e clarividência, também
chamada Dupla Vista,
seria o fenômeno de
Emancipação da Alma
associado à faculdade de
ver algo material além
das limitações dos olhos
de carne através de um
desdobramento
perispiritual
(Emancipação da Alma).
De forma similar,
audiência seria
fundamentalmente a
mediunidade de ouvir os
Espíritos desencarnados,
enquanto que
clariaudiência seria
ouvir algo material além
do alcance dos ouvidos
de carne, ou seja, com
os "ouvidos
perispirituais", através
de desdobramento
perispiritual
(Emancipação da Alma).
Obviamente, há casos em
que os dois fenômenos
acontecem
concomitantemente, pois
o indivíduo pode
desdobrar-se, conversar
e ver um Espírito
desencarnado em um local
físico distante.
Contudo, os dois
fenômenos poderiam
acontecer de forma
independente.
O termo "Animismo" foi
cunhado por Alexander
Aksakof, autor de
"Animismo e
Espiritismo". Kardec
discute a mesma ideia,
mas não utiliza esse
termo. Alguns também
utilizam o termo "Personismo",
mas essa expressão não
foi consagrada pelo uso.
De qualquer forma, assim
como ocorre com o termo
“Passe”, de autoria de
Samuel Hahnemann, e com
a palavra “Ectoplasma”,
criada por Charles
Richet, o “Pai da
Metapsíquica”, o
Movimento Espírita
utiliza regularmente tal
expressão para designar
basicamente a
manifestação dita
“paranormal”, em que o
Espírito atuante é o
próprio médium. Vale
ressaltar que tal
fenômeno de maneira
nenhuma pode ser
confundido com
mistificações
conscientes, onde,
obviamente, não há a
ocorrência de um
fenômeno paranormal
real.
Com relação à
Mediunidade, também é
importante fazer uma
pequena distinção entre
a percepção
extrassensorial
ou
suprassensorial
“simples” e a
Mediunidade “Completa”.
As crianças até a faixa
etária dos sete anos,
por exemplo, estão
vivenciando um processo
sob certo aspecto
incompleto de
encarnação, o que torna
o indivíduo nessa fase
mais predisposto a um
contato de natureza
espiritual. Entretanto,
essa condição, na
maioria das vezes,
aumenta um pouco a
predisposição mediúnica,
o que pode não ser tão
decisivo do ponto de
vista da ocorrência de
fenômenos ostensivos
propriamente ditos, se o
reencarnado já não
apresentar um nível
significativo de
mediunidade. Chico,
Divaldo, Raul e Yvonne
já manifestavam intensos
fenômenos mediúnicos
nessa faixa etária e
continuaram durante toda
a vida, porque eram
"médiuns de ação". No
caso destes notáveis
exemplos, inclusive,
podemos tranquilamente
afirmar que se trata de
portadores do chamado
“Mediunato”. Em
indivíduos que não são
médiuns de ação, esses
contatos mediúnicos na
primeira infância
poderiam acontecer, mas
em um grau muito menos
efetivo. Aliás, nesta
mesma obra (Recordações
da Mediunidade), Dr.
Bezerra de Menezes
afirma, através de D.
Yvonne Pereira, que os
médiuns que manifestam
significativa
Mediunidade desde a
primeira infância,
normalmente, são os
médiuns mais seguros,
pois já foram preparados
para essa tarefa em
vidas anteriores.
Realmente, a vida
missionária destes
irmãos ilustra a
coerência desta
afirmação.
Os animais, por exemplo,
também poderiam
apresentar uma percepção
espiritual, o que não
deixa de ser um
rudimento de
mediunidade. Porém, a
Mediunidade em sua
proposta mais profunda à
luz da Doutrina
Espírita, implica em uma
finalidade de bondade e
iluminação intelectual
de todos os envolvidos
no processo psíquico em
questão. Tal
diferenciação é
discutida pelo Professor
Herculano Pires em sua
obra intitulada
“Mediunidade”.
Aliás, Kardec discute a
mediunidade dos animais
no capítulo 22 de "O
Livro dos Médiuns"
(intitulado "Da
Mediunidade dos
Animais"), mas, de fato,
é um texto apenas
introdutório sobre tão
complexo tema.
Inclusive, são dignas de
registro as excelentes
notas de rodapé do
Professor J. Herculano
Pires, na versão da
LAKE, que muito
contribuem para uma
melhor compreensão desse
capítulo. É possível que
o Codificador do
Espiritismo,
conscientemente, tenha
deixado alguns pontos
para o futuro, talvez
por entender que não
tínhamos naquele momento
histórico condições para
discussões mais
profundas sobre o nível
de consciência dos
animais.