Lento
aprendizado
Recentemente
compareci à
missa de 7º
dia do marido de
uma querida
confreira. Fazia
bastante tempo
que não pisava
numa igreja. Era
uma bela manhã
de domingo e
chamou-me à
atenção a
azáfama que
antecedeu o
culto e a
predominância de
pessoas da
terceira idade
ali presentes.
Momentos antes
do culto
propriamente
dito, um senhor
de aparência
muito distinta
citou o nome do
falecido e de
outra pessoa
para mim
desconhecida,
tecendo rápidos
encômios à
figura de ambas
como fiéis
colaboradores da
paróquia. Em
seguida, algumas
pessoas
ensaiaram o
canto de algumas
músicas
religiosas –
nesse
“aquecimento”,
foram dirigidas
por uma pessoa
mais jovem que
também tocava o
órgão – que
permearam toda a
missa.
Outro senhor
provavelmente
septuagenário
percorreu – era
o padre,
conforme
constatei
posteriormente –
os corredores do
modesto local e
espalhou a
chamada “água
benta” na
plateia,
chegando,
inclusive, a
molhar uma das
lentes dos meus
óculos.
Terminada a
tarefa,
dirigiu-se para
uma entrada
localizada à
esquerda do
altar. Logo
depois voltou
devidamente
paramentado, e
iniciou a missa
sob cânticos e
apoio dos
frequentadores
que ora liam uma
parte ou outra
do roteiro da
missa. Notei que
os seus
comentários
focaram
exclusivamente
na vinda do Papa
Francisco que,
aliás,
aterrissou em
terras
brasileiras no
dia seguinte.
Francamente, não
ouvi uma prece
sequer dirigida
aos falecidos, o
que me
surpreendeu
bastante, já que
eu estava ali
para isso e
também porque um
deles – eu tinha
absoluta certeza
– estava
necessitando de
tal providência.
Não posso deixar
de comentar que
uma senhora
passou sem
cerimônia, em
certo momento,
com a
indefectível
caixinha
recolhendo
contribuições
financeiras.
Chamou-me a
atenção também a
atitude de um
assíduo e
prestativo
frequentador do
nosso modesto
centro espírita
igualmente
presente.
Explicando
melhor, fiquei
embasbacado num
primeiro momento
– tenho que
admitir – ao
vê-lo se
apresentar
diante do
prelado católico
juntamente com a
maioria para o
recebimento da
hóstia. Na
verdade, escrevo
essas linhas não
no sentido de
criticar a ele
ou a minha
experiência ali
sorvida naquele
episódio.
Entendo que cada
religião tem lá
a sua forma de
enfocar a
divindade e cabe
a cada um fazer
a sua escolha,
consoante com
aquilo que lhe
vai à alma, no
coração e na
mente que
comanda tudo,
afinal.
Mas o que mais
me intrigou foi
o fato de que
Espiritismo e
Catolicismo são
religiões muito
diferentes e,
por alguma razão
para mim
desconhecida,
esse
companheiro,
apesar de ouvir
as palestras em
nossa casa
religiosa já há
alguns anos,
aparentemente
não percebeu
ainda. Buscando
alinhar
explicações
deparei – em
minhas
cogitações – com
o inalienável
direito à
liberdade de
escolha de cada
um – o
livre-arbítrio.
Lembrei-me que
há pessoas que
não conseguem se
fixar numa coisa
só (religião, no
caso em questão)
e, por isso,
elas estão
sempre à procura
de “algo novo”
com sofreguidão.
De certa
maneira, atiram
para todos os
lados na ânsia
de aplacar,
talvez, o fogo
que lhes arde no
íntimo.
Por mais que
apelemos a elas
a manter a
fidelidade,
mesmo que
temporária –
para que
averíguem por si
mesmas a
seriedade e
profundidade dos
princípios
expostos pelo
Espiritismo –,
elas
simplesmente não
conseguem. A
propósito, temos
conhecimento de
determinada
pessoa que vai
ao centro
espírita, mas
que também
recebe um padre
para benzer-lhe
a casa. Por mais
que lhe falemos
que obsessão só
se cura pela
mudança de
comportamento e
atitudes – tal
pessoa
geralmente dorme
nos dias de
exposição
evangélica –,
não conseguimos
êxito. Outros há
também que não
escondem o
colarzinho
pendurado nos
seus pescoços
com o santinho
de devoção e, às
vezes, nos falam
de novenas,
embora assistam
regularmente às
palestras da
nossa casa.
Mas ainda
cogitando outros
motivos
potenciais,
recordei-me de
que o
Espiritismo é
uma religião que
apela à
simplicidade, à
ausência de
atavios e
singeleza nos
encontros. E
muitas pessoas
se sentem
desconfortáveis
com isso. Ou
seja, associam
religião a um
conjunto de
ritos e cânticos
variados,
indumentárias
extravagantes,
preleções
abstrusas etc.
Em
contrapartida, a
nossa verdade é
a dos Espíritos,
pois são eles a
base de todo o
conhecimento
erigido.
Recordei-me que
cada um de nós
está num estágio
evolutivo.
Portanto, o
desenvolvimento
da
sensibilidade, o
raciocínio
atilado e o
progresso
espiritual são
conquistas
pessoais e
intransferíveis,
assim como
obtidas por meio
de árduo
esforço. O
aperfeiçoamento
dos valores
esposados é
lento e só é
alcançado
através de muita
reflexão e
autocrítica.
Acorreu-me à
mente que o
Espiritismo é
uma doutrina
absolutamente
precisa ao expor
a nossa precária
condição moral,
de almas
comprometidas e
devedoras, bem
como firme em
destacar o
roteiro do
sofrimento como
medicamento
reparador. Nesse
sentido, não
chega a ser
surpreendente
que o
Espiritismo
ocupe ainda uma
posição tão
modesta no
cenário
religioso
brasileiro.
Afinal de
contas, palavras
como disciplina
mental, conduta
ética e ilibada,
renúncia aos
gozos mundanos,
afastamento dos
vícios, intensa
meditação e
leituras, preces
constantes e
sacrifícios
pessoais
simplesmente
assustam a
maioria das
pessoas. Além
disso, o
Espiritismo não
faz promessas
mirabolantes e
nem apela à
teologia da
barganha, mas
aponta com
clareza que cada
um é o próprio
autor da sua
cura ou doenças.
É por isso tudo
que a
denominação de
consolador
prometido
lhe assenta
perfeitamente.
Enfim, concluí
que entender e
aceitar de
coração todo
esse rico e
desafiador
conteúdo leva
tempo e é
normal.