EUGÊNIA PICKINA
eugeniapickina@gmail.com
Campinas, SP
(Brasil)
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Lei Menino
Bernardo – por
uma sociedade
melhor e de paz
“A forma como
fomos tratados
quando criança é
a mesma como
mais tarde
tratamos a nossa
vida” –
Alice Miller.
Sabemos que não
é tarefa do
direito nos
transformar em
cidadãos morais
ou afetivos,
porém ele impõe
certos
comportamentos,
principalmente
em razão do
temor da sanção
(reprimenda,
multa e/ou
castigo).
Logicamente o
ideal seria que
nossa sociedade,
em relação à
criança e ao
adolescente, já
tivesse
transcendido
qualquer alusão
a “medidas
educativas”
regidas pela
pedagogia negra,
fundada no
princípio tosco
(embora
persuasivo), que
impõe a
necessidade de
fazer o educando
passar por
castigos físicos
(ou tratamentos
cruéis) a fim de
alcançar, no
futuro, o status
de “pessoa boa e
civilizada”.
Ignoram esses
pais (“cuidadores”)
que a criança,
principalmente
no primeiro
setênio, aprende
atitudes e
comportamentos
pela imitação
das ações e
exemplos
repetidos no
ambiente físico
ao qual ela
pertence. Logo,
é
responsabilidade
de quem cuida do
menor não ser um
modelo de
tirania e
repressão, mas
sim um exemplo
de empatia,
cooperação e
atitudes
democráticas.
A Lei Menino
Bernardo (1)
tem o condão de
estabelecer o
direito da
criança e do
adolescente de
serem educados e
cuidados sem o
uso de castigos
físicos ou de
tratamento cruel
ou degradante. A
proposição, de
forma clara,
aborda a
realização de
direitos que são
inerentes a
crianças e
adolescentes e
indispensáveis a
sua dignidade e
pleno
desenvolvimento.
Como um Projeto
de Lei que visa
alterar, e para
aperfeiçoar, o
Estatuto da
Criança e do
Adolescente,
como finalidade
essencial, não
busca penalizar
os pais, mas
sim, quando for
o caso,
orientá-los a
cumprirem
determinados
procedimentos,
como cursos ou
orientação
psicológica nas
hipóteses de
castigo físico,
por exemplo. A
depender da
gravidade da
situação, o
Conselho Tutelar
poderá até mesmo
acionar a
polícia.
Entretanto, tudo
isso está
estabelecido no
intuito de
proteger o menor
em situação de
“natureza
disciplinar ou
punitiva, com o
uso da força
física que
resulte em
sofrimento
físico ou lesão
à criança ou
adolescente”
(trecho da Lei
que define
castigo) (2).
Por resistência
ou ignorância
dos pais, muitas
vezes, o que
chamamos de
mau
comportamento é
apenas a
única forma
que a criança
conhece para
expressar que
suas
necessidades
básicas não
estão sendo
atendidas.
É mau e injusto
punir uma
criança porque
ela responde de
uma maneira
natural à
sensação de uma
necessidade
importante que é
negligenciada
pelo adulto. Por
esta razão, a
punição não só é
inadequada a
longo prazo, mas
é certamente
nociva.
Além disso, como
as crianças
aprendem através
dos modelos que
seus pais
representam, o
castigo corporal
transmite a
mensagem de que
bater é uma
maneira adequada
de exprimir seus
sentimentos e de
resolver os
problemas.
Se uma criança
não tem a
oportunidade de
ver seus pais
resolverem os
problemas de
maneira firme,
mas sem o uso da
violência,
reconhecendo
quem ainda se
põe indefeso
perante a casa e
a rua,
dificilmente
conseguirá ela
aprender a fazer
deste modo. Como
efeito, quando
adulta, poderá
reproduzir este
tipo de
paternidade/maternidade
incompetente e
violenta com as
gerações
seguintes.
É fato: muitos
ainda querem
educar uma
criança de forma
rude,
intolerante,
intercalada por
“castigo e
adulação”.
Desprezam que a
criança, um ser
dependente, irá
reprimir-se para
acomodar-se às
necessidades dos
(maus) pais e se
conduzirá ao
desenvolvimento
de um falso
Eu – pois o
verdadeiro
Eu não tem na
infância,
principalmente,
oportunidade de
se desenvolver e
se diferenciar,
porquanto não
encontra solo
seguro, porém
amoroso, para
experienciar/manifestar
necessidades e
apelos
infantis.
Uma educação
ética, mas
sustentada por
um forte
alicerce de
amor, atenção e
respeito, é a
única e
verdadeira
maneira de obter
um comportamento
recomendável,
baseado em
poderosos
sentimentos e
valores, em vez
de um “aparente
filho (a)
obediente e
bonzinho (a)”,
mas encapsulado
unicamente no
medo (e no
ressentimento).
Por fim, ainda
que prosperem as
críticas e os
ecos dos
resistentes ao
avanço do bom
senso, se
buscamos uma
sociedade
melhor, se
exigimos paz,
solidariedade,
precisamos
formar as novas
gerações com
novos princípios
e valores, cujos
projetos
pessoais saibam
também
priorizar, entre
outras coisas, o
respeito e a
tolerância. No
fundo, nosso
aprendizado
coletivo e
doméstico está
ainda muito
implicado com a
capacidade de
suportar melhor
uns aos outros,
sem o uso das
formas vis
da violência…
Notas:
(1) O Projeto de
Lei da Câmara
58/2014 foi (re)batizado
de Lei Menino
Bernardo em
homenagem ao
garoto gaúcho
Bernardo
Boldrini, de
onze anos, cujo
corpo foi
encontrado no
mês de abril,
enterrado às
margens de uma
estrada em
Frederico
Westphalen, no
Rio Grande do
Sul. O pai e a
madrasta são
suspeitos de
terem
participação na
morte da
criança. E esta
Lei foi aprovada
pelo Senado em
junho e está à
espera da sanção
presidencial.
(2) A Lei Menino
Bernardo define
tratamento cruel
ou degradante
como “conduta ou
forma cruel de
tratamento que
humilhe, ameace
gravemente ou
ridicularize a
criança ou
adolescente”.
Logo, a
proposição legal
estabelece,
portanto, que
pais e
responsáveis que
maltratarem seus
filhos, criança
e adolescente,
sejam advertidos
e chamados a
participarem do
Programa de
Proteção à
Família, que
oferece cursos e
tratamento
psicológico e
psiquiátrico. A
vítima do
castigo, por sua
vez, receberá
tratamento
especializado.
*Quem aplica as
medidas? As
medidas são
aplicadas pelo
conselho tutelar
da região onde o
menor reside.
**O profissional
de saúde, de
educação ou
assistência
social que não
notificar o
conselho tutelar
sobre casos
suspeitos ou
confirmados de
castigos físicos
poderá pagar
multa de três a
vinte salários
mínimos, valor
que é dobrado na
reincidência.
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