Benedita Fernandes nasceu aos 27
de junho de 1883, em Campos
Novos de Cunha (SP), sendo filha
de Maria Josefa Nascimento, que
era viúva. Portadora de atroz
obsessão, autêntica subjugação,
Benedita perdeu o contato com a
família e perambulava sem rumo.
Certa feita, causava tantos
incômodos à população que foi
recolhida à Cadeia Pública da
cidade de Penápolis.
Àquela época não existiam
hospitais ou atendimentos para
tal fim. O carcereiro Padial e
depois o Sr. Marcheze deram
assistência à mulher doente,
principalmente com passes, e
Benedita, premiada pela
necessidade, recebeu o
chamamento libertador; uma feita
depois de uma crise muito forte,
ouvira: "Benedita, se promete
consagrar-te, inteiramente, aos
enfermos e pobres, sairás curada
daqui".
Ela recobrou a consciência e
resolveu rumar para Araçatuba.
Chegou ela, totalmente
desequilibrada pela mediunidade
que lhe aflorava os sentidos, a
Araçatuba, região alta noroeste
de São Paulo localizada a umas
seis horas da capital paulista.
Foi bondosamente amparada e
recolhida em nome da
fraternidade por um casal amigo.
Mais tarde, refeita, começou a
recolher aqui e ali, crianças
desvalidas, surgindo assim um
modestíssimo lar, hoje o Lar
Benedita Fernandes de Araçatuba .
Certa feita, as crianças
não tinham o que comer. Benedita
explicou-lhes que se elas fossem
ao portão, Jesus as auxiliaria.
Elas se postaram à entrada do
Lar, com o estômago a doer. Ora,
passava por ali um homem chamado Ricieri, que era vendedor numa
carrocinha, de buchos, rins,
fígado, um tripeiro, enfim.
Ricieri perguntou-lhes o que
elas faziam ali fora. "− Estamos
esperando Jesus para nos dar de
comer". Ele lhes respondeu: "− Digam
pois lá dentro, para a mãezinha
de vocês, que Jesus chegou! E
daquele dia em diante, com as
sobras do tripeiro, não houve
mais fome por lá. Ainda, ele
também, em cada casa que parava,
falava aos fregueses daquele
pequeno abrigo e muitos passaram
a auxiliar.
Conta-se que, um dia,
Benedita Fernandes viu jogado a
um monturo, morto, e quase
devorado por urubus, o corpo de
um antigo mendigo, seu
conhecido, que pela carência socioemocional, era considerado
louco. Ela ali mesmo jurou que
jamais alguém, considerado
louco, ou mesmo os loucos,
ficariam sem o seu amparo.
Passou a recolhê-los e
abrigá-los num quartinho. Quando
em crise, os dementes avançavam
para ela, mas essa mulher de
seios fartos, cabelos carapinha
e sorriso de esperança,
sentava-se numa cadeira próxima,
aconchegava-os ao seu regaço,
colocava a cabeça dos
desvairados no seu colo,
acalmava-os com preces, passes e
boas palavras e a crise ia
regredindo, e eles ficavam
calmos, pacificados pela força
irresistível do amor.
O Prefeito da cidade, vendo
que aquela era uma boa causa,
passou a auxiliá-la com recursos
financeiros, mas um dia, esse
dinheiro, essencial, passou a
não mais chegar. E ela, ao
reclamá-lo com o Prefeito, soube
que não mais o teria. Não
titubeou. Era mulher de fibra
vigorosa, avisou ao mandatário
que soltaria os loucos todos por
não poder sustentá-los. Eles
ficaram então, por algumas
horas, vagando pela cidade de
Araçatuba e, assim, Benedita
Fernandes obteve novamente a
subvenção e pôde continuar a
deles tratar no que é, hoje, o Sanatório
Benedita Fernandes de Araçatuba.
Além da obra de assistência,
atuou como médium,
principalmente passista, e na
evangelização das crianças.
Merece destaque que o
Espírito que anteriormente a obsediava, veio a se transformar
em um dos seus colaboradores
espirituais. Benedita Fernandes
tornou-se igualmente uma das
pioneiras do atual movimento de
unificação dos espíritas quando
fundou, aos trinta de agosto de
1940, a União
Espírita Regional da Noroeste,
sendo eleita sua presidente.
Mantinha correspondência
com Cairbar Schutel, que sempre
publicava notícias sobre o
trabalho dela, no histórico
jornal O
Clarim. Era visitada por
lideranças expressivas como João
Leão Pitta e por Leopoldo
Machado. Sentiu-se mal às 23
horas do dia oito de outubro de
1947, quando conversava com as
crianças, aconselhando-as.
Desencarnou à uma hora e trinta
minutos do dia nove de outubro
de 1947, vítima de colapso por
insuficiência cardíaca. Muitos
anos mais tarde, Ricieri passou
a consultar-se no atual INCA, no
Rio de Janeiro, devido a um
doloroso câncer no pulmão.
Sabedor que Divaldo Franco
estaria num Culto, na residência
do casal Irene e Aristides
Silva, no Flamengo, para lá
então se dirigiu com a esposa
Matilde e com os confrades Ana e
Geraldo Guimarães. Divaldo
Franco, na sua discrição,
naquele dia, tomando
conhecimento do caso do doente,
disse-lhe de chofre, para
espanto de todos que ali se
encontravam:"− É,
Ricieri, você, como todos nós,
vai desencarnar, mas há aqui um
venerando Espírito a me dizer
que irá recebê-lo e auxiliá-lo
no trânsito pós-morte. Diz-me
ela também, que você a conhece
bem, desde os tempos das
sobras... Está ela a agradecer,
a dizer obrigada pelas sobras!" "− Sobras?
Ah, então é D. Benedita
Fernandes! Pergunte-lhe se eu
não poderia ter uma moratória.
Preciso de um tempo para
terminar a obra dos esgotos no
Lar de crianças da minha cidade.
Divaldo, será que posso pedir
além da moratória, que minhas
dores sejam minimizadas?"
Divaldo ficou a escutar Benedita
Fernandes. "− Ela
me diz que sim, que a moratória
ser-lhe-á concedida. Mais tarde,
você sentirá uma dor forte no
coração e no pulmão. Aí será
chegada a hora da viagem..." −completa-lhe
Divaldo. Depois, o médium
oferece ao doente a terapêutica
do passe renovador e suave
perfume balsâmico invade o
ambiente. Ricieri e a esposa
Matilde foram para casa; para
espanto dos médicos, a dor havia
passado. Um ano após esses
acontecimentos, o bondoso
tripeiro já havia terminado os
esgotos do abrigo, quando sentiu
uma fortíssima e aguda dor no
peito, avisou a mulher,
deitou-se e, tranquilamente,
desencarnou, auxiliado,
certamente, por esse Espírito
dedicado que se chama Benedita
Fernandes. A psicografia de
Francisco Xavier registra o
trabalho de Benedita Fernandes,
que é intitulada Num
Domingo de Calor, assinada
por Hilário Silva, e publicada
pelo Anuário
Espírita 1964
(IDE).
Nos anos 70 e 80, Divaldo
Pereira Franco psicografou
várias mensagens de autoria de
Benedita Fernandes. Estas estão
incluídas em livros do mesmo
médium. Por ocasião do cinquentenário de suas obras,
lançamos um livro sobre Benedita
– Dama
da Caridade, inicialmente
editado pela então União
Municipal Espírita de Araçatuba,
na qual reunimos informações
sobre a vida e as ações desta
notável obreira, bem como as
mensagens espirituais dela ou
alusivas a ela.