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por Eleni Frangatos

 

Eu sou espírita!


Sou espírita há relativamente pouco tempo, aproximadamente há 10 anos. Nasci na África, mais precisamente em Moçambique, e desde criança somos ensinados e acabamos nos habituando a observar com atenção tudo o que está à nossa volta, até porque, muitas vezes, nossa sobrevivência no meio da selva depende de nosso estado de alerta. E, meus queridos leitores, ao observar os animais, encontramos comportamentos similares aos nossos. Por isso, a facilidade em identificarmos num ser humano as características de um determinado animal.

Tudo isto apenas para dizer o quanto gosto de prestar atenção também nas situações e no ser humano no dia a dia.

Assim, gostaria de comentar alguns procedimentos, que vejo nos espíritas. Desde já, faço bem claro que, felizmente nem todos os espíritas procedem da mesma forma.

Vamos à primeira questão: Eu sou espírita.

Já cansei de ver e ouvir espíritas falando sobre a sua “adesão” ao Espiritismo.

Dizem: “Eu sou católica (o). Na verdade, todos nós somos católicos (depois meio a medo como que justificando), mas “virei” espírita e estou vindo de vez em quando ao Centro (aí, olha para ver a reação dos seus interlocutores) e acrescenta: mas, quem é católico, sempre é católico”.

Minha pergunta: Afinal, o que é esta pessoa que vai ao Centro Espírita regularmente, frequenta os cursos da Casa, e AINDA se manifesta em público desta forma?

Recordo uma reunião de executivos a que estive presente e onde eu era a única mulher. De repente, um dos executivos, o mais importante, disse, nem lembro mais qual o motivo: “Eu sou católico”. E eu, automaticamente, reagindo como uma bola de ping-pong, naquele vai e vem, disse bem segura de mim: “Eu sou espírita”. Daquela reunião iria surgir um projeto que me daria uma excelente remuneração pelo meu trabalho. Fez-se um silêncio “gelado”. E eu fiquei firme, olhando o “poderoso” tranquilamente nos olhos. De repente, ouvi outro executivo: “Eu também sou espírita”, e mais um, abrindo um grande sorriso: “Eu também”. A tensão aliviou, houve troca de sorrisos e o “chefão” disse: “Eu respeito, sou católico, mas respeito”. E eu no mesmo tom: “Eu também. Sou espírita, mas respeito profundamente todas as outras religiões”.

Bem, saí de lá com um projeto que me rendeu um bom dinheiro e, ACIMA DE TUDO, afirmando o que na realidade sou: “Eu sou espírita”.

Aqui na cidade onde moro, soube de um Centro que mandou fazer uns adesivos para colocar no vidro traseiro do carro. “EU SOU ESPÍRITA”.

Procurei um desses adesivos, mas já haviam sido todos distribuídos.

Falando com o Presidente, mostrei minha estranheza por nenhum - da centena de carros ali estacionados - mostrar sequer o tal adesivo. E a resposta veio pronta: sabe, a maior parte são carros de luxo e é perigoso, porque o pessoal, quando vê que somos espíritas, arranha os carros e depreda e dá um prejuízo danado! Isto que estou contando ocorreu há um ano, mais ou menos, não foi no século passado... Recordei a diferença entre estes e os Cristãos devorados pelos leões na Roma antiga...

E aí o Presidente, querendo aliviar o assunto e tentando lidar com a questão com um pouco de humor, acrescentou: veja quantos carros, a casa está cheia, dá um contentamento olhar esse mar de gente. E eu ia responder da minha forma, mas guardei meus pensamentos. Eu ia perguntar: “que importa ter uma centena ou mais de carros, a maior parte de luxo, se os motoristas que os dirigem”... (não sei a razão precisa, mas me lembrei da minha África e das avestruzes que acreditam que, enfiando a cabeça na terra, ficam bem protegidas e escondidas de tudo.)

Temos que ter cuidado... - Nossa Doutrina nos ensina que devemos acolher a todos e fazer o bem sem olhar a quem. Assim, as portas de nossas Casas Espíritas encontram-se abertas a todos os seguidores de outras religiões, distribuímos cestas básicas a todos os que necessitam e não fazemos qualquer distinção se o que recebe a cesta é Espírita, Evangélico, Católico, Budista, ou até mesmo se é Ateu.

Mas, o que me causa estranheza é ouvir certos dirigentes dizerem: “Temos que ter cuidado, porque há evangélicos presentes e não podemos ferir seus sentimentos, ou não devemos pressionar” (esta última assertiva até dá para entender, desde que consideremos que não podemos pressionar alguém a “virar” espírita).

Cheguei a ouvir o absurdo: “Não podemos falar de Nossa Senhora, porque há Evangélicos presentes”. O que me foi ensinado é que Nossa Senhora, para os espíritas, é um Espírito Iluminado, Superior, assim como todos os outros santos da Igreja Católica.

A minha pergunta é:

- Os Evangélicos e Católicos, que vêm aos Centros Espíritas nos dias das famílias que precisam de ajuda e recebem uma cesta básica semanalmente, sem qualquer distinção, não estão cientes de que vêm a uma Casa Espírita? Se a sua intenção é apenas a de receber sua subsistência (o que, aliás, é a maior parte), qual a razão de NÓS termos que ter cuidado? Por acaso os Pastores e os Padres têm que ter cuidado quando um espírita resolve ir a um Templo ou a uma Igreja? Se não estamos pressionando ninguém, por que temos que ter cuidado? Desculpem-me os leitores, mas até hoje ainda não entendi.

Se a Casa é espírita e, com base nas obras de Allan Kardec, se ensina a Doutrina Espírita Kardecista, por que temos que ter cuidado se estão presentes católicos, evangélicos, ou outros irmãos nossos de outros segmentos?

Não podemos falar que somos espíritas - Há pouco tempo, prestava serviços, como médium, na doação de energia positiva e espiritual, de cura, para um grupo de senhoras com câncer de mama. É um trabalho difícil, porque algumas destas senhoras, já com metástase, sabem que seu estado é terminal. Mulheres jovens - dá uma angústia muito grande, mesmo sendo espírita e sabendo a explicação destas situações -, muitas têm filhos pequenos e não têm com quem deixá-los, e o grande sofrimento já nem sequer é o câncer que as devora, nem a morte que se aproxima, mas o pânico de onde, como e com quem vão ficar seus “filhotes”.

Fui chamada pelo responsável dessa Fundação e informada que eu não podia dizer que sou espírita, não deveria mencionar Deus, mas falar apenas numa forma de energia... Amigos (as), é difícil trabalhar assim, não assumir o que você é na realidade e não poder defender a Doutrina que se escolheu e nem falar em Deus que, no meu caso concreto, é a força incontestável da minha Fé – não o Deus que se ensina nas escolas, o castigador, vingativo, controlador, mas O BOM, O EQUÂNIME, O AMOROSO, Aquele que sempre nos perdoa e acolhe, e Aquele que NUNCA nos decepciona, embora nós o façamos constantemente!

E para terminar:

Nós não somos Espíritas de mesa branca! - Desde o Período da Pedra Lascada, ou Paleolítico, calcula-se que 12 mil anos A.C. aproximadamente, já encontramos indícios de que o Homem acreditava na continuidade da vida após a morte. Há pinturas rupestres retratando possíveis guerreiros mortos com sua arma (uma pedra lascada ou, mais tarde, polida) ao lado do corpo para poder se defender na nova dimensão. Isto se encontra muito mais claro e detalhado na época da Antiguidade, na Babilônia, no Egito, onde, além da arma, era colocada comida para que nada faltasse ao morto do outro lado, na sua continuação de vida. Nos túmulos dos Faraós, encontrados nas célebres Pirâmides do Egito, além de armas e comida, encontramos também verdadeiros tesouros para que nada possa vir a faltar a tão ilustres senhores.

Portanto, vamos seguir juntos neste simples raciocínio.

Naquela época, já se acreditava que havia uma continuação de vida!!!

No século XIX, Allan Kardec - com base nesta crença e com estudos e experiências minuciosas, às quais dedicou grande parte da sua vida e rigorosa e criteriosamente analisou tudo o que vivenciou nesta área, sendo ele um brilhante intelectual e profundo estudioso – resolveu organizar todo o vasto conhecimento e nisso foi auxiliado pela Espiritualidade. Toda a sua meritória obra, solidificada numa disciplina de trabalho hercúlea, nos oferece a DOUTRINA ESPÍRITA e seus fundamentos.

Não é que já não havia antes este conhecimento empírico que nos levava a crer que existia vida após a morte. Kardec codificou esses conhecimentos e daí a DOUTRINA ESPÍRITA KARDECISTA.

Então, nós não somos Espíritas de mesa branca.

Nós somos, sim, Espíritas Kardecistas e é esta a Doutrina e apenas esta que deve imperar nos Centros Espíritas que divulgam a Doutrina Espírita de Allan Kardec. Nada de folclore, nada de complementos, nada de última moda... Apenas: sou espírita kardecista!

E, me perdoem os leitores, porque tenho um orgulho e um destemor grande (e aí peco na pureza de meu Espiritismo, porque o orgulho é o pior dos sentimentos, mas aqui é no sentido sadio) de poder dizer sempre e sempre, na minha tentativa de ser alguém que tem um coração generoso, que procura ajudar sempre quem está em dor ou em necessidade, que cai num dia, mas levanta e sacode a poeira, e segue novamente nessa eterna luta de procurar ser melhor a cada dia e poder dizer: Eu sou espírita kardecista!


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita