Concurso de tragédias
O título é estranho? Num planeta de provas e expiações
onde existem muitas pessoas estranhas, ele acaba
por se encaixar, como procuraremos explicar.
Existe em determinadas pessoas a necessidade de chamar
atenção para os problemas que a afligem como um
mecanismo para inspirar piedade, compaixão, comiseração
ou algo parecido. Transformar a pessoa queixosa no
centro do Universo dos sofrimentos. Essa atitude dá
origem ao concurso de tragédias como iremos
exemplificar.
Duas pessoas se encontram e ambas estão com gripe. Uma
diz assim: “Estou com uma gripe! Me dói muito a cabeça”.
A outra que também está com a mesma enfermidade
responde: “Ah! Eu também! Minha garganta dói muito!”.
Como numa espécie de réplica, a primeira acrescenta à
sua doença: “Mas além da forte dor de cabeça, estou
também com dor nos dois ouvidos! Que coisa horrorosa!”.
A segunda, então, soma mais uma queixa: “Além da forte
dor de garganta, tenho tido uma febre muito alta que me
impõe um grande mal-estar!”. Dito isso, a primeira volta
à carga para valorizar suas queixas: “Pois é. Além da
dor de cabeça, da dor nos ouvidos, estou também com os
meus olhos doendo!”. A tréplica por parte da segunda não
se faz esperar: “Que coisa horrível, não? Acredita que
além da dor de garganta, da febre alta, parece que um
caminhão passou sobre meu corpo quebrando todos os
ossos?”.
Pronto! Instalou-se o concurso de tragédias.
Se o exemplo não foi muito convincente, citemos outro.
Duas pessoas que fraturaram a perna se encontram para
falar dos seus dramas, e uma coloca o seguinte: “Sabe
que tive uma fratura horrorosa na minha perna?”. A outra
participante do concurso de tragédias logo argumenta:
“Que coincidência! Também quebrei a minha, mas em dois
lugares! A sua foi num lugar só, não é?”. A primeira
logo responde: “Foi, mas o osso saiu para fora da pele!
Você não imagina a dor!”. A segunda que é dona
das duas fraturas pergunta preparando o terreno para
vencer a disputa: “Mas quantos parafusos você precisou
colocar para consertar a sua perna?”. A primeira
responde sem perceber a manobra da rival para
vencer o concurso: “Seis parafusos!” Já imaginou?!
Seis!”. E a segunda, com ares de vencedora dá o
xeque-mate: “Isso não é nada. Eu precisei colocar doze
parafusos, porque quebrei em dois lugares!”.
É o concurso de tragédias muito concorrido entre
determinadas pessoas que desconhecem o alerta que nos
faz o irmão José através da psicografia de Baccelli no
livro Não Nos Deixes Cair Em Tentação, na página
intitulada Palavra e Auto-Obsessão. Ensina ele:
“Assim, nunca admita que você esteja mais doente do que
realmente possa estar nem que os problemas que você
faceia sejam maiores do que realmente possam ser.
Não se fragilize a partir de você mesmo, ensejando que
os que estão à sua volta potencializem o seu pessimismo,
com o qual, não raro, você pretende apenas submeter a
chantagens emocionais quem se disponha a ouvi-lo.
Recorde-se de que o seu pensamento, feliz ou infeliz,
vencendo a pequena distância existente entre a sua boca
e os seus ouvidos, sempre retornará ao ponto de origem
com a força de um decreto lei”.
Recordo-me, assim como muitos outros confrades
espíritas, da ocasião em que Jerônimo Mendonça procurou
Chico para praticamente se despedir do médium mineiro,
porque uma hemorragia muito forte ameaçava-lhe a
existência. Recebeu energias do plano espiritual pelas
mãos do Chico curando o problema e a explicação daquela
forte hemorragia: era provocada pelo fato de Jerônimo
estar acatando a condição de “coitadinho” em seu íntimo,
palavra essa pronunciada pelas pessoas que o viam
naquela situação de grande comprometimento físico.
Essas disputas de concurso de tragédias induzem ao
desequilíbrio emocional que atrai Espíritos interessados
em que nossa situação seja realmente cada vez mais
grave.
Onde existe a ferida, existe a mosca, se não se tomar os
devidos cuidados. E onde existe o desequilíbrio existe o
Espírito inferior ou que ignora o que a sua presença
possa causar, valendo-se da oportunidade que estamos
proporcionando gratuitamente a ele por força de não
colocarmos em prática o alerta de Jesus do orar e vigiar
para não cairmos em tentação.
Nesses tempos de transição que o planeta atravessa para
ingressar, lentamente, em um novo clima moral,
não devemos alimentar o concurso de tragédias. Aliás,
não é o planeta que irá ingressar em um período de
regeneração, mas o homem que nele habita dando espaço ao
ser regenerado que construirá um planeta melhor.
Se há que existir disputas, que seja para ver quem mais
trabalha, silenciosamente, no campo do bem em
cumprimento da recomendação de não saber uma mão o que a
outra faz.
Se o verdadeiro espírita é aquele que, reconhecendo suas
imperfeições, procura ser melhor hoje do que foi ontem,
o concurso de tragédias é uma situação que não devemos
incentivar e, muito menos, participar dela.