Especial

por Rogério Coelho

Efeito profilático & curativo do sentimento religioso

“(...) Nos transtornos psíquicos profundos, a esquizofrenia destaca-se atemorizante, face à alienação que impõe ao paciente.” - Joanna de Ângelis[1]


Nos tempos atuais, quando o movimento espírita no Brasil e no mundo, recebe o insulto de correntes “espiritualistas” antirreligiosas, geradas pela pretensão acasalada com o obnubilamento mental de seus promotores, queremos provar, com base nos irrefutáveis pensamentos de Allan Kardec, André Luiz e Joanna de Ângelis, o quanto a religião, a expressar-se no sentimento religioso, em parceria com a ciência médica, são vitais para a saúde física e mental das criaturas...

O sentimento religioso alteia-se - nobre e sobranceiro - no contexto social, vez que o próprio Codificador asseverou[2]:“o primeiro efeito provocado pelo Espiritismo – e mais geral – consiste em desenvolver o sentimento religioso até naquele que sem ser materialista, olha com absoluta indiferença para as questões espirituais”.

Como podemos, então, elidir o aspecto religioso do Espiritismo sem ultrajar o posicionamento francamente cristalino do Codificador nesse passo?!...  Se tal absurdo fosse factível, como é o desejo das sombras umbralinas infiltradas no movimento espírita, a humanidade teria prejuízo mais superlativo do que o dano causado pela casta sacerdotal ao adulterar o Cristianismo com seus ancilosados dogmas medievais e suas cerimônias de exterioridades vazias, caldeadas por soníferos rituais de torturante mesmice.Com o Espiritismo, tal não sucederá!...

A Doutrina Espírita, riquíssima de conteúdos nobres, descortina novos horizontes ao entendimento do Ser espiritual em sua feição holística.   Ancorada em seus postulados, a humanidade logrará sua alforria espiritual do regime escravocrata das ancestrais instituições religiosas, hodiernamente anêmicas e ultrapassadas...

Após essa digressão, analisemos a ação profilática do sentimento religioso promovendo a saúde física e mental ante os transtornos fisiopsíquicos.

O egrégio Codificador do Espiritismo nos dá a conhecer[3] a dramática saga passional de Antoine Bell que assassinou, com veneno, o seu rival... Tal crime, embora não alcançado pela justiça humana, detonou um processo de esquizofrenia no criminoso, processo que eclodiu em sua reencarnação seguinte, na qual ele era empregado de uma casa bancária no Canadá.  Em crescente agravamento, sua situação redundou em suicídio. Tendo o crime perpetrado se fixado em seu psiquismo, e provavelmente perseguido pela vítima transformada em obsessor, sua consciência o exprobrava... Embora fosse um profissional competente, executando com eficiência e zelo sua função, fora do ambiente de trabalho era tomado de terríveis alucinações: perdia o sono, batia nos peitos...  Isso acontecia diariamente das 4 horas da tarde às 9 horas da manha, hora em que se dirigia à casa bancária. Um farmacêutico que o conheceu por vinte anos era, frequentemente, abordado pelo sr. Bell, que imaginou ter comprado ali o tóxico que serviu para envenenar sua vítima”.

Segundo Joanna de Ângelis82, entre outros fatores, “(...) deve-se incluir na psicogênese do transtorno esquizofrênico, a consciência de culpa das ações vivenciadas em existências anteriores, quando a delinquência assinalou o desenvolvimento do “Self” hedonista e explorador, que somente utilizou dos amigos e conhecidos para explorá-los, traindo-lhes a confiança ou covardemente destruindo-lhes o corpo em horrorosos crimes que não foram justiçados, porque passaram desconhecidos ou as circunstâncias legais não os alcançaram... Não havendo sido liberados pela reparação através dos cometimentos impostos pela Lei vigilante, insculpiram nas delicadas tecelagens vibra­tórias do corpo perispiritual a responsabilidade infeliz, que ora ressurge como cobrança, necessidade de reparação, impositivo de reequilíbrio, de recomposição social, familial, humana...

Eis que, nessa, como noutras ocorrências psicopatológicas, a interferência de seres desencarnados, impondo sua vontade dominadora sobre aquele que o infelicitou no curso de existência anterior, produz distonia equivalente àquelas que pro­cedem das psicogêneses internas e externas.   Tal imposição psíquica frequente e insidiosa afeta os neurotransmissores, facultando que moléculas — neuropeptídeos — responsáveis pelo equilíbrio das comunicações, as desconectem produzindo a alienação. A mente, que não é física, emite ondas especiais que são captadas por outras equivalentes, que sincronizem com as emissões que lhe são direcionadas. E no que diz respeito às afinidades psíquicas, a sintonia vibratória permite que sejam decodifica­das mensagens mentais por outros cérebros que as captam, conforme os admiráveis fenômenos parapsicológicos da telepatia, da clarividência, da precognição, da retrocognição, cujas experiências em laboratório tornaram-nos cientificamente comprova­dos, reais.

É natural, portanto, que não havendo a destruição do Self quando ocorre a morte ou desencarnação do ser humano, a mente prossiga enviando suas mensagens de acordo com as construções emocionais de amor ou de ira, de felicidade ou de desdita, que se fazem captadas por estações mentais ou campos “psi”, dando curso às inspirações, às percepções enobreci­das ou perturbadoras, facultando o surgimento das nefastas obsessões de efeitos calamitosos.   É muito mais vasto o campo dessas intercorrências espirituais do que se pode imaginar, sucedendo, tão amiúde, que seria de estranhar-se não as encontrar nos transtornos neuróticos ou psicóticos de qual­quer natureza...

A saúde mental, somente é possível, quando o Self estruturado em valores éticos nobres, compreende a finalidade precípua da existência humana, direcionando os seus sentimentos e conhecimentos em favor da ordem, do progresso e do bem-estar de toda a sociedade.   A liberação do ego arbitrário, desvestido dos implementos da aparência que se exterioriza pela “persona”, permite a integração do ser na vida em caráter de plenitude. Todas as terapias acadêmicas procedem, valiosas e oportunas, considerando-se a imensa variedade de fatores preponderantes e predisponentes, para o atendimento da esquizofrenia, não sendo também de desconsiderar-se a fluidoterapia, o esclarecimento do agente perturbador e o consequente labor de sociabilização do paciente através de grupos de apoio, de atividades espirituais em núcleos próprios onde encontrará compreensão, fraternidade e respeito humano, que o levarão ao encontro com o “Si” profundo em clima de paz”.

As atividades espirituais em núcleos próprios, referidas pela Mentora Amiga, podem desdobrar-se nas Casas Espíritas e aí entra o aspecto religioso como terapia. Tal aspecto é tão importante que o Mais Alto o disponibilizou já ao tempo de Moisés, conforme podemos observar nos seguintes ensinamentos de André Luiz[4]:

Missão de Moisés – Reencarna-se Moisés como missionário da renovação, para dar à mente do povo a concepção do Deus Único, transferindo-a dos recintos iniciáticos para a praça pública. Entretanto, porque a evolução dos princípios religiosos implica sempre em levantamento dos costumes, com a elevação da alma, o desbravador enfrenta batalhas terríveis do pensamento acomodado aos circuitos da tradição em que as classes se exploram mutuamente, agravando assim os próprios compromissos, para afinal receber os fundamentos da Lei, no Sinai.   Desde essa hora, o conhecimento religioso, ba­seado na Justiça Cósmica, generaliza-se no âmago das nações, porquanto, através da mensagem de Moisés, informa-se o homem comum de que, perante Deus, o Senhor do Universo e da Vida, é obrigado a respeitar o direito dos semelhantes para que seja igualmente respeitado, reconhecendo que ele e o próximo são irmãos entre si, filhos de um Pai Único.  A religião passa, desse modo, a atuar, em sentido direto, no acrisolamento do corpo espiritual para a Vida Maior, através da educação dos hábitos humanos a se depurarem no cadinho dos séculos, preparando a chegada do Cristo, o Governador Espiritual da Terra.

Os Dez Mandamentos — Os dez manda­mentos, recebidos mediunicamente pelo profeta, brilham ainda hoje por alicerce de luz na edificação do direito, dentro da ordem social. A palavra da Esfera Superior gravava a lei de causa e efeito para o homem, advertindo-o solenemente: consagra amor supremo ao Pai de Bondade Eterna, n’Ele reconhecendo a tua divina origem; precata-te contra os enganos do antropomorfismo, porque padronizar os atributos divinos absolutos pelos acanhados atributos humanos é cair em perigosas armadilhas da vaidade e do orgulho; abstém-te de envolver o Julgamento Divino na estreiteza de teus julgamentos; recorda o impositivo da meditação em teu favor e em benefício daqueles que te atendem na esfera de trabalho, para que possas assimilar com segurança os valores da experiência; lembra-te de que a dívida para com teus pais terrestres é sempre insolvável por sua natureza sublime; responsabilizar-te-ás pelas vidas que deliberadamente extinguires; foge de obscurecer ou conturbar o sentimento alheio, porque o cálculo delituoso emite ondas de força desorientada que voltarão sobre ti mesmo; evita a apropriação indébita para que não agraves as próprias dívidas; desterra de teus lábios toda palavra dolosa a fim de que se não transforme, um dia, em tropeço para os teus pés; acautela-te contra a inveja e o despeito, a inconformação e o ciúme, aprendendo a conquistar alegria e tranquilidade, ao preço do esforço próprio, porque os teus pensamentos te precedem os passos, plasmando-te, hoje, o caminho de amanhã.

Jesus e a Religião — Entanto, com Jesus, a religião, como sistema educativo, alcança eminência inimaginável: nem templos de pedra, nem rituais; nem hierarquias efêmeras, nem avanço ao poder humano... O Mestre desaferrolha as arcas do conhecimento enobrecido e distribui-lhe os tesouros.   Dirige-Se aos homens simples de coração, curvados para a gleba do sofrimento e ergue-lhes a cabeça trêmula para o Céu. Aproxima-se de quantos desconhecem a sublimidade dos próprios destinos e assopra-lhes a Verdade, vazada em amor, para que o sol da esperança lhes renasça no ser.   Abraça os deserda­dos e fala-lhes da Providência Infinita. Reúne, em torno de sua glória que a humildade escondia, os velhos e os doentes, os cansados e os tristes, os pobres e os oprimidos, as mães sofredoras e as crianças abandonadas e entrega-lhes as bem-aventuranças celestes.   Ensina que a felicidade não pode nascer das posses efêmeras que se transferem de mão em mão, e sim da caridade e do entendimento, da modéstia e do trabalho, da tolerância e do perdão.  Afirma-lhes que a Casa de Deus está constituída por muitas moradas, nos mundos que enxameiam o firmamento, e que o homem deve nascer de novo para progredir na direção da Sabedoria Divina.  Proclama que a morte não existe e que a Criação é beleza e segurança, alegria e vitória em plena Imortalidade.    Pelas revelações com que vence a superstição e o crime, a violência e a perversidade, paga na cruz o imposto de extremo sacrifício aos preconceitos humanos que Lhe não perdoam a soberana grandeza, mas, reaparecendo redivivo, para a mesma humanidade que o escarnecera e crucificara, desvenda-lhe, em novo cântico de humildade, a excelsitude da Vida Eterna.

Revivescência do Cristianismo — Erige-se, desde então, o Evangelho em código de harmonia, inspirando o devotamento ao bem de todos até o sacrifício voluntário, a fraternidade viva, o serviço infatigável aos semelhantes e o perdão sem limites.  Iniciam-se em todo o orbe imensas alterações: a crueldade metódica cede lugar à compaixão; os troféus sanguinolentos da guerra desertam dos santuários; a escravidão de homens livres é sacudida nos fundamentos para que se anule de vez; levanta-se a mulher da condição de alimária para a dignidade humana; a filosofia e a ciência admitem a caridade no governo dos povos; o ideal da solidariedade pura começa a fulgir sobre a fronte do mundo...

Moisés instalara o princípio da justiça, coordenando a vida e influenciando-a de fora para dentro.   Jesus inaugurou na Terra o princípio do amor, a exteriorizar-se do coração, de dentro para fora, traçando-lhe a rota para Deus.

Eis que o Cristianismo grandioso e simples ressurge agora no Espiritismo, induzindo-nos à sublimação da vida íntima, para que nossa alma se liberte da sombra que a densifica, encaminhando-se, renovada, para as culminâncias da Luz”.

É no sentimento religioso que vamos encontrar o imarcescível e verdadeiro significado existencial, com o qual lograremos vencer as nocivas pressões internas do “Self” e as variegadas injunções externas adversas.

Ainda segundo entendimento da Mentora Joanna de Ângelis[5], “(...) a descoberta do significado da vida é de relevante magnitude, porque dá sentido à luta e aos desafios que surgem frequentemente, convidando o indivíduo ao avanço e ao crescimento interior.

Esse sentido existencial é uma forma de religiosidade que deve possuir um alto significado motivador para que o indivíduo não desfaleça nos empreendimentos evolutivos. 

(...) Quem não cultiva um ideal religioso encontra-se fora do Fulcro Gerador da Vida, e, desse modo, desfalece com mais facilidade. (...) O esforço para encontrar-se o significado existencial deve ser contínuo, porquanto, a sua falta, o seu não conhecimento, pode produzir transtornos internos que dão surgimento a processos psiconeuróticos.

Pessoas inteligentes, lúcidas, estoicas, bem situadas financeiramente, amadas, quando perdem o sentido da vida e tombam nesse vazio existencial, que a religião sempre preenche oferecendo metas transpessoais, sentindo-se inúteis, desenvolvem transtornos neuróticos que necessitam ser superados, reencontrando a razão de ser da vida, a utilidade de viver, as imensas possibilidades que lhe estão ao alcance para se tornarem felizes e plenas.

São, portanto, valores subjetivos, como a oração, a meditação, a reflexão, a calma e o trabalho em favor da renovação pessoal, que conseguem preencher emocionalmente, reestruturando o indivíduo em relação à existência humana.

Essa viagem silenciosa é intemporal, não podendo ser realizada em determinado período de tempo, através de objetivos imediatos, mas por meio de experiências psíquicas e emocionais que transcendem a consciência atual, oferecendo-lhe meta segura mais adiante.

A necessidade da religião ressalta pelo significa­do profundo de que se reveste, oferecendo compensação e equilíbrio após a vilegiatura carnal. Então, o significado existencial incorpora-se ao consciente atual e estimula as funções do pensamento, que passarão a trabalhar pela qualidade de vida e não apenas pela conquista de coisas que poderiam pressupor a totalidade externa das aquisições.

(...) Uma identificação religiosa do indivíduo, trabalhará em favor da mudança das ambições desmedidas para a conquista do necessário, daquilo que produz poder e prazer, mas que não se transforma em gozo neurotizante de funestas consequências.

O ser humano deve aprender a ser feliz conforme as circunstâncias, introjetando e vivendo a compreensão da sua transitoriedade física e da sua Eternidade espiritual”.

Provavelmente, por ter logrado os luminíferos acumes da paz, por viver religiosamente, pautado nos sadios costumes cristãos, segundo essas luminosas indicações de Joanna de Ângelis, é que Sanson[6], apenas passados dois dias de sua desencarnação, exorou:“(...) vivei sabiamente, santamente, pela caridade e pelo amor, e tereis feito jus a impressões e delícias que o maior dos poetas não saberia descrever”. 


 


[1]- FRANCO, Divaldo. Triunfo Pessoal.Salvador:LEAL, 2002, cap. 6.

[2]- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 83.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2002, Conclusão – Tomo VII.

[3] - KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed. Rio [de Janeiro]:FEB, 2003, 2ª parte, cap.V.

[4] - XAVIER, F. Cândido. Evolução em dois mundos.7.ed.Rio de Janeiro: FEB, 1983, cap. XX.

[5] - FRANCO, Divaldo. Triunfo Pessoal.Salvador:LEAL, 2002, cap. 9.

[6] - KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed. Rio [de Janeiro]:FEB, 2003, 2ª parte, cap. I, item 8.

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita