Clementino de Alencar, um correspondente do jornal O
Globo, desembarcou em Pedro Leopoldo. O carioca
estava disposto a desmascarar a "fraude mineira" e teve
a primeira oportunidade em sessão espírita no Centro
Luiz Gonzaga.
Naquela noite, ele se sentou ao lado de Chico na mesa
tosca de madeira e acompanhou, de perto, os movimentos
vertiginosos de sua mão sobre o papel. O lápis percorria
a folha na contramão - da direita para a esquerda e
rabiscava frases incompreensíveis. Um dos espectadores
arriscou: "É árabe". Era inglês, escrito de trás para
frente. A mensagem invertida, que só poderia ser lida no
espelho ou contra a luz, foi publicada em letras
garrafais no jornal carioca:
My dear spiritualist friends,
men’s learning is nothing over against of the death:
let you support your cross with patience and courage.
The pain and faith are the greater earthly treasure and
the work is the gold of the life.
But for all you, believing either not, here is the our
great message: God is our Father.
We are brothers. Let us love one another.
Emmanuel.
(Meus caros amigos espiritualistas, o conhecimento dos
homens não é nada contra a morte; suportem as suas
cruzes com paciência e coragem. A dor e a fé são os
maiores tesouros terrenos e o trabalho é o ouro da vida.
Para todos, entretanto, crentes ou não, aqui está a
nossa grande mensagem: Deus é nosso Pai. Nós somos
irmãos. Amemo-nos uns aos outros.)
O repórter apontou o erro crasso de gramática inglesa: o
uso do "the" antes do possessivo "our" na quinta linha e
divulgou a desculpa do tal Emmanuel para o deslize: ele
ainda estava estudando inglês num curso no além.
A noite de boas-vindas ao jornalista foi movimentada.
Após a exibição bilíngue, Chico colocou no papel, em
minutos, de olhos fechados, dois poemas de um certo
Olavo Bilac: "Aos Descrentes" e "Ideal".
E Clementino de Alencar avançou sobre o primeiro:
Vós que seguis a turba desvairada
As hostes dos descrentes e dos loucos
Que de olhos fechados e ouvidos moucos
Estão longe da senda iluminada
Retrocedei dos vossos mundos ocos!
A noitada só terminou depois de Chico Xavier rabiscar um
poema de Augusto dos Anjos - sobre o fim das forças do
"plasma agonizante" e outro de João de Deus.
Do livro As Vidas de Chico Xavier, de Marcel
Souto Maior.
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