Muitos curiosos desembarcavam desconfiados em Pedro
Leopoldo e saíam de lá assombrados. Um dos observadores
atentos entrevistados pelo repórter Clementino, de O
Globo, foi Melo Teixeira, professor de Psiquiatria
da Universidade de Belo Horizonte. Ele se sentou próximo
do rapaz e cravou nele seus olhos clínicos. Quando Chico
Xavier largou o lápis sobre o papel repleto de frases do
além, o médico perguntou quais as sensações do transe.
O médium
falou sobre o torpor e a impressão vaga de uma tênue irradiação.
O psiquiatra deu o diagnóstico: “Não se pode negar: estamos
diante de um fenômeno lídimo, visto, presenciado. Haverá,
naturalmente, os que acusam este rapaz de fabricar pastiches. É
uma hipótese para observador distante e superficial. Sentimo-nos
diante de uma força ultra normal”.
O repórter
Clementino, porém, precisava de mais evidências. Decidiu fazer
perguntas em inglês. Uma
das questões: Have you, spirits, any power upon the future of
our living friends? (Vocês,
os espíritos, têm algum poder sobre o futuro de nossos amigos
vivos?). A resposta, assinada por Emmanuel, começava com uma
censura à referência aos amigos vivos: "Todos nós estamos
vivendo", garantiu em bom português.
O repórter
de O Globo leu os parágrafos escritos pelo rapaz, mas não
se convenceu. Queria respostas em inglês. Em vez de fazer o
pedido ao entrevistado, ele resolveu experimentar uma técnica
espírita: a de enviar uma "espécie de prece insistente ao
rapaz". "Inglês, inglês", mentalizou. O texto veio em português.
Quando Clementino já estava prestes a voltar ao ceticismo
habitual, apareceram, sob a resposta, dezoito linhas em inglês.
Do you have more questions? Clementino de Alencar mudou.
Emmanuel, citado como "guia" de Chico Xavier nas primeiras
reportagens, virou o Amigo Invisível.
O repórter
voltou para o Rio, um mês depois, convencido da honestidade do
autor de Parnaso de Além-Túmulo. E suas reportagens
atraíram caravanas de curiosos a Pedro Leopoldo. A maioria dos
visitantes saía do Rio de Janeiro e de São Paulo atraída pelo
porta-voz dos poetas mortos e voltava para casa impressionada
com as consultas médicas do Dr. Bezerra. Bastava escrever o nome
e o endereço numa ficha para receber, no fim da noite, receitas
sempre homeopáticas assinadas pelo espírito do médico. Ninguém
precisava revelar a doença para ter acesso ao diagnóstico
escrito por Chico Xavier.
Muitos,
impressionados com os poderes do protegido de Emmanuel, chegavam
a oferecer dinheiro ao rapaz pobre como prova de gratidão. Ele
recusava: “Ajude o primeiro necessitado que encontrar”. Outros
lhe entregavam presentes. Chico se livrava deles com pressa e
discrição. Numa noite, ganhou um relógio de ouro suíço. Na tarde
seguinte, visitou uma doente, Glória Macedo. Pobre, ela
costumava perder a hora de tomar os remédios receitados pelo Dr.
Bezerra por falta de relógio. Chico deixou o presente da véspera
sobre a mesa da "paciente".
Do livro As
Vidas de Chico Xavier, de Marcel Souto Maior.
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