Nuances da lei do trabalho
As cenas pungentes e correspondentes consequências
referentes à recente tragédia ocorrida no Largo do
Paissandu, em São Paulo, na qual um prédio público
(invadido por pessoas sem-teto) em chamas desabou,
requer mais profundas considerações em termos de
aspectos humanos, sociais e espirituais. Assim sendo, é
preciso lembrar que a maioria das pessoas que ali viviam
estava desempregada, e isso também ocorre com outras que
enfrentam as mesmas condições em várias partes do país.
Como bem reportou um programa jornalístico, os
indivíduos perdem o seu emprego, os minguados recursos
são logo exauridos e aí as alternativas de vida
tornam-se minimalistas. Em suma, milhares de seres
humanos estão vivendo penosamente porque lhes falta o
básico, isto é, um trabalho digno que lhes permita ter
uma existência decente.
Com efeito, a situação laboral no planeta é preocupante
não apenas pela sua magnitude – calcula-se que cerca de
1 bilhão de pessoas ou 33% da força de trabalho mundial
estejam desempregadas na atualidade. Tais estimativas
fornecidas pelo Instituto Galluplevam também em
conta os autônomos, particularmente aqueles que se
assemelham aos autênticos desempregados dada a
insignificância da renda por eles auferida (menos de US$
2,00 por dia). Por isso, as cifras do instituto são
muito maiores do que as divulgadas pela Organização
Internacional do Trabalho (5,6%).
Além disso, quando se considera a força de trabalho
mundial – cerca de 3,3 bilhões de pessoas, isto é, os
que estão empregados ou procurando por uma ocupação com
vínculos legais – apenas 7% ou 214 milhões de
trabalhadores têm um bom emprego (medido aqui pelo nível
de engajamento com as organizações). Em outras palavras,
não há um trabalho que possa ser classificado de bom
para espantosamente 3 bilhões de pessoas que aspiram e
desejam um. Por isso, se nada de sólido for feito,
talvez nunca venham a ter um na presente existência.
Portanto, por qualquer ângulo que se observe, é patente
que a dimensão do trabalho está sob considerável
turbulência no planeta. Há, obviamente, analistas que
defendem que o importante é a possibilidade de ter um
trabalho em si. Todavia, isso não é suficiente, pois os
seres humanos consideram a atividade laboral como algo
muito mais profundo, muito além do salário e dos
benefícios.
Ou seja, uma boa parte das pessoas almeja obter significado no
que fazem para viver. De modo geral, essa sensação
preenche-lhes a alma, bem como lhes dá forças e
inspiração para acordar todos os dias dispostas a fazer
a diferença por meio do seu trabalho. Assim sendo, a
receita do referido instituto é inegavelmente
providencial: os líderes globais precisam priorizar a
criação de bons empregos.
Na sua seminal obra, O Livro dos Espíritos, Allan
Kardec identificou a proeminência do trabalho na obra
divina. Com efeito, os Espíritos lhe informaram
tratar-se de assunto da mais alta relevância (ver
Terceira Parte, Capítulo III da citada obra). Nesse
sentido, nos comentários referentes à questão nº 685, o
Codificador argumentou que:
“Não basta se diga ao homem que lhe corre o dever de
trabalhar. É preciso que aquele que tem de prover a sua
existência por meio do trabalho encontre em que se
ocupar, o que nem sempre acontece. Quando se generaliza,
a suspensão do trabalho assume as proporções de um
flagelo, qual a miséria. A ciência econômica procura
remédio para isso no equilíbrio entre a produção e o
consumo. Esse equilíbrio, porém, dado seja possível
estabelecer-se, sofrerá sempre intermitências, durante
as quais não deixa o trabalhador de ter que viver. Há um
elemento, que se não costuma fazer pesar na balança e
sem o qual a ciência econômica não passa de simples
teoria. Esse elemento é a educação, não a
educação intelectual, mas a educação moral. [...]”.
Com efeito, o fator moral tem pesado muito pouco na
percepção dos poderosos do mundo. Refiro-me
especialmente aos que se julgam acima do bem e do mal.
Ou seja, àqueles que acreditam que a sua riqueza e
interesses egoísticos devem prevalecer acima de todas as
misérias humanas, àqueles, enfim, que podem encetar o
progresso geral, mas se deixam prender à indiferença e
ausência de compaixão pelo sofrimento alheio.
Daí a pertinente observação formulada pelo Espírito
Emmanuel, no livro Vinha de Luz (psicografia de
Francisco Cândido Xavier), “Lembremo-nos de que há
serviço divino dentro e fora de nós. A favor de nossa
própria redenção, é justo indagar se estamos cooperando
com o espírito inferior que nos dominava até ontem ou se
já nos afeiçoamos ao espírito renovador do Eterno Pai”.
Emmanuel frisa ainda (na obra Fonte Viva, também
psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier), que
“Na qualidade de político ou de varredor, num palácio ou
numa choupana, o homem da Terra pode fazer o que lhe
ensinou Jesus”. Aliás, o Mestre inesquecível deixou-nos
muito claro que o Pai Celestial trabalha, assim como ele
(ver João, 5: 17). Então, pode-se inferir que o trabalho
é um imperativo na Criação Divina. Desse modo, o desafio
planetário de melhorar substancialmente a
empregabilidade, e, por extensão, as condições de vida
para a humanidade, está colocado. Sob a égide de Jesus e
seus ensinamentos podemos vencer esse atraso moral e
proporcionar o trabalho abençoado para todos os
indivíduos que desejam ser úteis e produtivos na seara
divina.
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