A arte de falar, o dom de escutar e a
beleza de praticar
O nosso ativo mais precioso é o tempo. E como temos nos
comportado em relação ao “falar e escutar” em nosso dia
a dia? Será que já aprendemos a escutar? Se não for um
“dom” mesmo, saber ouvir as pessoas é certamente uma
arte.
Partilhar também é muito bom. Você fala dos próprios
sentimentos e ouve o outro falar dos seus. É uma via de
mão dupla: passamos e também recebemos ajuda e
espiritualidade.
Há 2 mil anos, numa epístola, o apóstolo Tiago já
assinalava: “Confessai as vossas culpas
uns aos outros, e orai uns pelos outros para que
sareis...”.
A moderna psicologia recomenda, igualmente, partilhar
sentimentos, assim como a medicina faz recomendações
nesse sentido: se você não quiser adoecer interiormente,
procure falar, conversar com alguém sobre seus
sentimentos. Muitas vezes, em vez da boca, o remédio
entra pelo ouvido, substituindo a angústia ou aflição
pela paz e esperança.
Nessa arte de bem ouvir é necessário ter generosidade e
complacência, além da disponibilidade para escutar. É
necessário ainda despir-se de preconceitos, não julgando
o interlocutor por sua aparência, linguagem, gênero ou
posição social.
Quem escuta não deve ter pressa em dar solução ou
oferecer proposta, porque, muitas vezes, aquele que
partilha quer apenas encontrar alguém que o escute e o
entenda no momento que passa.
Relato aqui duas histórias sobre o cuidado que se deve
ter também no falar, porque somos senhores de tudo o que
pensamos e não dizemos, mas nos tornamos escravos
daquilo que falamos.
Vieira era um aprendiz na espiritualidade. Enquanto o
corpo dormia, comparecia a reuniões na Vida Maior. E
certa noite foi surpreendido. Estava sonhando com o
velho Barbosa, que insistia em dar-lhe explicações sobre
sua vida, já que Vieira durante o jantar havia falado
muito da vida do velho para seus familiares.
Como não sabia da história completa do amigo, agora
desencarnado, e fizera comentários desairosos na opinião
do morto, Barbosa veio tomar satisfação.
E Vieira, acordado por amigos espirituais, comenta
consigo: — Será possível que o velho Barbosa morto veio
irritado conversar comigo por aquilo que eu disse? Não é
verdade! Alguma coisa que comi no jantar deve ter
provocado este pesadelo...
Conta-se também de famoso orador, notabilizado pelas
belas dissertações que fazia em palestras emocionadas,
diante de numerosa plateia. No meio dos espectadores,
destacava-se um velho frequentador, sempre atento ao
orador e reconhecido pelas mensagens que recebia. Como
todos estamos de passagem nesta escola, retornando
depois à vida espiritual, eis que o consagrado orador e
o velhinho também retornaram ao mundo maior.
O orador, depois de um período de sofrimento, foi
socorrido pelo velhinho, que o escutara com atenção, mas
de quem nunca soubera o nome. Vendo que seu fã de
cadeira vinha em seu socorro, envolto em suave
claridade, não resistiu ao desejo de perguntar:
— Qual o segredo para irradiar tamanha luz e
encontrar-se tão bem?
— Segredo, não sei se existe. Só sei que eu praticava
tudo o que você dizia.
Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é editor da Editora
EME.
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