O caminho
que eu tomo
Viajo no comboio do
pensamento entre as
estações dos sentimentos,
sensações e desejos.
Crio e recrio, vivo e
morro, nasço e renasço,
nas aventuras de um mar
revoltoso e abalador, o
mar do fluxo mental.
Quando dou conta já fui
em uma das carruagens da
montanha russa, viajando
no mundo das sensações e
emoções mentais, quando
abro os olhos ela se
desfaz e parece que não
sai de onde estava. Não
consigo manter-me à
superfície deixando-me
envolver em todo este
fluxo mental que por
vezes é construtivo mas
também se revela
destrutivo em muitas
outras alturas.
Crio ódios e amores,
alegrias e tristezas,
frustrações e
realizações, neste
reinado pessoal onde sou
Rei, mas meu poder real
é ludibriado pelo medo e
o desejo que me levam a
agir longe da razão.
Fujo a sete pés do
sofrimento e corro de
braços abertos em
direção ao prazer, não
percebendo que são
portas opostas da mesma
sala.
Tudo vive em mim, minhas
emoções são a ponta da
minha extensão interior,
não podem ser diferentes
do que sou, meus
sentimentos que me
parecem tão profundos
são minhas criações
inconscientes, meus
desejos uma nascente
exterior de um lençol de
água que não tenho a
consciência de sua
imensidão.
As ideias que tenho
sobre a vida, sobre os
outros, criadas e
arquivadas em minha
mente como imagens, que
adquiri durante a
experiência do meu
caminho, a educação de
meus pais e de meu país,
medido sempre com um
crivo da “razão” do que
me faz bem ou me serve,
tornam-se o código da
constituição de uma
república individual
onde habita quem eu
deixo e é condenado quem
eu quero. Aqui, nesta
terra desconhecida até
por mim mesmo, por não
permitir a entrada de
ninguém mais longe do
que eu quero e não ter a
coragem de penetrar nos
matagais e pântanos
internos inexploráveis,
também tem legislação da
Justiça onde a sentença
é constante, não só em
relação aos outros e a
mim, mas em relação a
tudo na vida.
Tenho a ambiguidade como
uma forma de vida, a
escolha é necessidade
constante, e esta é
sempre baseada no
achismo dos códigos
individuais, no que
conheço, no que eu sou.
Cada um de nós elege as
suas importâncias, para
uns os vícios, para
outros a religião, para
alguns o desporto,
outros a família, a
profissão, a casa etc…,
tantas que seria
impossível descrevê-las.
A importância das mais
diversas ideias ou
coisas é constituinte do
que somos, vivemos para
elas, para os desejos
que as envolvem e as
ligam a nós e
movimentam-nos muitas
vezes desde que
acordamos. Pode-nos
parecer que são
diferentes de nós, mas
na realidade a forma de
nós agirmos é uma
extensão ou ligação
entre nós e aquilo a que
damos importância, seja
a ideia ou objeto.
Então, se o que nos
motiva a ação nos leva a
criá-la em função do
motivo ou desejo, pode a
ação ser diferente da
finalidade ou faz parte
de um processo que tem
como finalidade o
desfrutar do desejo?
Todo este movimento que
existe em nós é uma
projeção de nosso ser
que por sua vez foi a
constituição do “eu” no
passado, parece uma bola
de neve da lei Ação /
Reação e as escolhas
constituíram o caminho
que foi construído e
que, por sua vez, somos
nós. É sermos um
labirinto em constante
mudança de que tentamos
fugir.
Esta construção dá-se de
uma forma sutil sem que
tenhamos consciência.
Estamos sempre a olhar
para fora, conseguimos
até compreender a
ligação dos sentidos aos
objetos externos, mas o
processo interior
falha-nos, como se
tivéssemos uma cegueira
para nós próprios.
Com uma forma de
funcionamento tão
despercebida a nós
próprios e condicionada,
pelo que somos, a que
liberdade nos damos ao
direito? |