Pedras do caminho
“Amai vossos inimigos...” –
Jesus (Mt, 5:44.)
Essa afirmativa de Jesus pede reflexão e análise
especial. Diz para que amemos nossos adversários, porque
ninguém precisa nos lembrar de amar aqueles que têm para
conosco gestos carinhosos e palavras ternas, com quem
compartilhamos interesses comuns e alegrias mútuas, pois
isso é fácil.
Com essa atitude, nada acrescentamos de útil ao esforço
que realizamos para nosso progresso espiritual. Aliás,
na Terra, só traduzimos o verbo amar sob tal forma de
exteriorização. Todavia, o amor pode resplandecer sem
essa exteriorização superficial. Alguém duvida do amor
de Deus por nós? Quem, em sã consciência, duvida de que
foi o amor de Jesus por nós e a esperança que deposita
na nossa capacidade de nos transformarmos em luzes que O
fez vir até nós em sacrifício? Amar aqueles que nos
caluniam e ofendem, obrigando-nos ao sacrifício íntimo
do entendimento fraterno, da compreensão do limite
evolutivo em que o outro se encontra – certamente o
mesmo que o nosso – para que a harmonia prevaleça, isto
sim, é manifestação inequívoca de amor, e tem
inestimável valor perante o Pai.
Ele próprio, ao nos confiar duras tarefas e rudes
experiências, junto àqueles com quem compartilhamos a
existência, seja neste planeta ou em outros mundos,
mostra-nos a Infinitude do Seu Amor para com todas as
criaturas. Todavia, impossível pretender amá-los como
amamos os queridos do nosso coração.
Então, o que Jesus quis dizer com isso? Que convite é
esse que não conseguimos compreender? Qual a essência do
ensinamento desejado? O Apóstolo Paulo, na Carta aos
Romanos, capítulo 12, vv 21, dá-nos a resposta ao
escrever: "Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o
mal com o bem”. Diante da assertiva, parece-nos claro
que não basta apenas deixar de fazer o mal, mas é
fundamental fazer o bem; que não é suficiente não termos
uma atitude negativa, mas torna-se indispensável
desenvolvermos atitudes positivas. Seria o mesmo que
termos uma “meia-bondade” – desculpa educada – ou sermos
mais ou menos honestos sem, contudo, penetrarmos no
nosso campo íntimo para a transformação necessária,
mantendo-nos, somente, na superfície do sentimento.
Podemos citar alguns exemplos significativos dessa
“meia-bondade”, seguindo a orientação de Emmanuel: 1 – o
favor adiado; 2 – a reprovação de permeio com o elogio,
o nosso tão conhecido e exaustivamente praticado “bate e
assopra”; 3 – esquecer deliberadamente o prêmio pela
conduta correta em qualquer atividade exercida; 4 –
continuar ajudando os que não nos ofendem, porque é mais
fácil e mais agradável; e, 5 – desculpar sem modificar o
íntimo, o tão comum “perdoo, mas não esqueço”.
Todos os nossos pensamentos, ações e palavras estão nas
raízes dos sentimentos que abrigamos em nosso mundo
íntimo – boca fala do que tem no coração. Quando
encarnados, por conta do grau evolutivo em que nos
encontramos, nossos pensamentos oscilam entre o
altruísmo e o egoísmo, a prodigalidade e a sovinice que
provocam distúrbios mentais, gerando doenças no âmbito
do espírito e do corpo, muitas vezes de difícil
diagnóstico.
O mal que está dentro de nós, e que se exterioriza por
nossas ações e palavras, retorna a nós, em cumprimento
da Lei de Causa e Efeito ou Lei de Ação e Reação, com
grandes prejuízos. O Evangelho nos pede: “Perdoai
vossos inimigos”, “Orai por aqueles que vos caluniam e
perseguem” para que aprendamos a não ter mais que
pedir perdão a Deus ou ao próximo pelos nossos erros,
porque não teremos mais ofendido ninguém.
O evangelista Pedro perguntou a Jesus quantas vezes
deveríamos perdoar aquele que nos ofende, e o Mestre
respondeu setenta vezes sete, estabelecendo, assim, a
infinitude de vezes que devemos praticar o perdão. Em
momento algum Jesus espera que possamos, por ora, amar
nossos adversários ou desafetos como amamos nossos
amigos, porque Ele sabe que um dia, queiramos ou não,
estaremos todos juntos, trabalhando na Sua seara de
Amor, como irmãos que somos.
Assim sendo, o que podemos fazer, hoje, dentro da nossa
limitação, em atendimento ao convite divino? Parece-nos
que: 1 – não devolver o mal com o mal; 2 – orar,
verdadeiramente, para que eles possam conquistar, como
também estamos tentando, a felicidade e a paz; 3 – não
nos alegrarmos com seus fracassos, mas torcer para que
progridam e que mais rapidamente compreendam o mal que
fazem aos outros e a si mesmos; 4 - ajudá-los, mesmo que
não saibam disso. E se pouco pudermos fazer, que sejam
as nossas preces a ajudá-los a se reerguerem. Lembra
Emmanuel que não basta cerrar os punhos e esbravejar
contra a sombra noturna. É preciso acender uma luz.
É imprescindível e urgente a renovação para melhor.
Necessitamos crescer para a Vida Superior e nos
convertermos “em auxiliares preciosos da divina
iluminação do espírito, na convicção de que a sementeira
do exemplo é a mais duradoura plantação no solo da
alma”.¹ E prossegue o benfeitor espiritual,
acrescentando que precisamos aprender com o Cristo a
sermos a mensagem persuasiva do amor para que se
estabeleça entre os homens o domínio da eterna luz.
Bibliografia:
1 – Emmanuel (Espírito) – Palavras de Vida Eterna,
[psicografado por] F. C. Xavier – Edição CEC, 20. ed.,
Uberaba-MG, 1995 - Lições 30 e 31.
2 - _________Fonte Viva, [psicografado por]
F.C.Xavier – Editora FEB – 31. ed., Rio-RJ, Lição 162.
3 - Kardec, Allan – O Evangelho segundo o Espiritismo –
Cap. 9 e 12.