As iniquidades da
política
Conhecem-se,
parcialmente, as
movimentações pessoais e
de grupo, para a
ascensão e permanência
em determinados cargos e
funções, recorrendo-se,
em muitos casos, a jogos
de grandes trocas de
influências, favores e,
por vezes, fica-se com a
sensação de que “Vale
Tudo”, incluindo o que
de mais negativo se
possa imaginar nos
comportamentos humanos.
Luta-se, algumas vezes,
desesperada e
traiçoeiramente, até
contra aquelas pessoas
que nos fizeram bem, que
eram verdadeiramente
nossas amigas, porque
mais importante do que
os valores humanistas do
SER é o TER, possuir,
ainda que à custa de
méritos fabricados, de
notoriedades exigidas,
de posições de relevo
público, que
proporcionam privilégios
de toda a ordem.
É interessante
retirarem-se algumas
ideias de quem, no
terreno, porta-a-porta,
vai tentando reunir
pessoas, com
caraterísticas
heterogêneas e
complementares, para se
constituir uma equipe
que reúna as melhores
condições para
desenvolver projetos de
interesse público, para
o bem comum, em que
todos são beneficiados.
As reações de muitas das
pessoas contactadas são
preocupantes, levam-nos
a ter que parar para
pensar.
O que se verifica é que
as resistências são
imensas, e as recusas
são muitas: por um lado,
parece existir um certo
medo instalado; por
outro lado, uma muito
caraterística
mentalidade, segundo a
qual é melhor não nos
envolvermos em certas
atividades e estarmos de
bem com todas as
pessoas. Esta visão da
participação na vida
pública é, simplesmente,
inquietante.
Com efeito, se se pensar
que as pessoas não
participam com receio de
represálias, é possível
que exista algum
exagero, e/ou uma
análise distorcida sobre
as realidades locais em
geral, e em relação às
pessoas em particular,
porque, apesar de alguns
obstáculos, temos o
privilégio de viver num
país democrático, numa
sociedade pluralista,
com pessoas de bem, de
boa formação ético
moral, à frente de
prestigiadas
instituições, que têm
revelado imensas
competências: pessoais,
profissionais, morais,
éticas e cívicas,
demonstrando muita
sensibilidade para
escutar, avaliar e
tentar resolver os
problemas que lhes são
colocados, a par de uma
educação e respeito de
elevadíssimos níveis.
Por vezes afigura-se-nos
que uma autoalegada
elite persiste em
métodos que nada têm de
comum com os valores de
uma sociedade
civilizada, com as boas
práticas democráticas,
com os mais elementares
preceitos de boa
educação, do dever ético
moral de ajudar as
pessoas que, em dados
períodos das suas vidas,
precisaram de auxílio,
sabendo-se que quem
detém o poder também é
passível da tentação de
abuso de autoridade que
todo o poder confere, no
contexto e esfera legal
em que ele deve ser
exercido.
Acresce um outro medo, o
qual resulta da eventual
possibilidade de
prejuízos resultantes da
tomada de posições, a
favor ou contra
determinadas realidades
político-ideológicas.
Quem tem uma qualquer
dependência do público,
este, enquanto potencial
cliente de bens e
serviços, receia sofrer
através da perda desses
mesmos compradores
porque, possivelmente,
não comungam de ideais
idênticos e, como forma
de o demonstrar, no
exercício de uma
mentalidade muito
afetada por exemplos
correntes e concretos,
uns mais recentes,
outros mais remotos,
deixam de ser
consumidores dos
produtos comercializados
pelos primeiros. Então,
a solução encontrada por
estes é não se
envolverem em nenhuma
atividade que possa
ferir outros ideais ou
mesmo alguns
preconceitos enraizados
numa determinada
cultura.
No que a um outro
argumento é apresentado,
para a recusa em
participar, tem a ver
com uma certa estratégia
segundo a qual: “O
melhor é estar de bem
com toda a gente”
ou, como se costuma
dizer: “Agradar a
Gregos e Troianos”
e, ainda, “Estar de
bem com Deus e com o
Diabo” e assim, se
não nos envolvermos em
nada, e fizermos “boa”
cara com todos, ninguém
nos vai fazer mal.
Bom, este argumento que,
infelizmente, até poderá
ter algum fundo de
verdade, não deveria
colher a aceitação
generalizada porque: “é
praticamente impossível
alguém dar-se bem com
toda a gente, na medida
em que nem todas as
pessoas se dão bem
comigo, logo, para eu me
relacionar bem com toda
a gente, sabendo eu que
não sou bem aceito,
considerado, estimado e
respeitado por essa
mesma gente, então, das
três, uma: ou jamais
serei aceito por toda a
gente porque não agrado
a todas as pessoas; ou,
apesar de saber isso, se
eu quero demonstrar que
estou de bem com todas
as pessoas e com elas me
relaciono bem, então,
talvez esteja a ser
hipócrita, falso; ou,
finalmente, não tenho o
mínimo caráter, um
pouquinho de vergonha e
dignidade e, muito
menos, respeito por mim
próprio”. É impossível
ser tudo, para todos,
porque todos somos
diferentes.
E se, em certas
atividades,
concretamente, todas
dependem diretamente do
público, é necessário
utilizar-se um muito bem
estudado e aplicado
“marketing”; outras há
que exigem, para quem
assim for capaz de o
fazer, sem vergonha nem
sinceridade, um
comportamento de
simpatia, sorrisos,
promessas e tudo quanto
for de muito
sofisticadamente
afetivo, para captar, em
certos períodos muito
críticos, a adesão das
pessoas, incutir-lhes
uma determinada
orientação
político-partidária
para, no culminar deste
período, as pessoas
estarem convencidas de
que devem apoiar esta ou
aquela ideologia; este
ou aquele projeto,
acreditando em promessas
e noutras pessoas que,
depois de eleitas para
os cargos que
ambicionavam, depressa
se esquecem da palavra
dada e de quem as
apoiou.
E, enquanto os
argumentos referidos são
sistematicamente
invocados, na busca da
constituição de listas
político-partidárias,
conotadas a uma
determinada força
política, para as
autarquias locais, ao
nível das Assembleias de
Freguesia/Juntas de
Freguesia das pequenas
comunidades rurais e
semiurbanas, parece que
já em relação à formação
de equipes para as
Câmaras Municipais,
Assembleia da República
e Parlamento Europeu, a
dificuldade está em
excluir tanta gente
interessada, ao ponto de
se verificarem conflitos
internos nos próprios
partidos e forças
políticas proponentes,
incluindo, de quando em
vez, a demissão de
personalidades que: ou
não são integradas
naquelas listas; e/ou
alguém indicado por elas
fica em lugar não
elegível ou mesmo de
fora.
Por outro lado, também é
do domínio público que
nas eleições para as
grandes instituições
nacionais e
internacionais, os
candidatos concorrentes
partem como que
protegidos por símbolos
diversos, incluindo os
de um aparelho
partidário, e que é a
força do partido que
vence, porque muitos
candidatos nem sequer
são minimamente
conhecidos dos
eleitores, aliás,
aqueles, quando figuras
ditas importantes, se
necessário, até se
apresentam num círculo
eleitoral, a centenas de
quilômetros da sua área
de residência, porque o
importante, sob todos os
aspetos, é ser-se eleito
para órgãos de prestígio
nacional e/ou
internacional, que
proporcionam jogos de
influências, que são
financeiramente bem
remunerados e desfrutam
de benefícios de sócio
estatutário acima da
média do comum dos
eleitores.
Poder-se-á analisar o
grau de exigência, a
dimensão das
responsabilidades e os
requisitos para se ser
integrado numa lista
para a eleição a um
determinado órgão do
sistema político,
depois, comparar com o
que se pede à maioria
dos candidatos, por
exemplo, às
Assembleias/Juntas de
Freguesia da esmagadora
maioria das autarquias
locais, bem como o nível
de comprometimento,
conhecimentos,
experiências e,
eventualmente,
habilitações literárias
que lhes são exigidos.
No entanto, pergunte-se:
a) Quantos autarcas das
Câmaras Municipais e das
pequenas e médias
freguesias já foram
julgados e condenados
por alegados crimes,
nomeadamente de
corrupção, desvio de
fundos, peculato,
falsificação de
documentos? b) Quantos
deputados dos
parlamentos nacionais e
europeus foram
sentenciados por
idênticas infrações? c)
Quantos membros dos
governos nacional e
europeu já forma
castigados por
semelhantes violações?
Pode-se, com direito ao
contraditório, defender
que, afinal, Presidentes
de Câmara ou de Junta de
Freguesia têm muito mais
responsabilidades do que
outros eleitos para
órgãos de natureza
legislativa e,
inclusivamente, estão
sujeitos a mais
vulnerabilidades porque,
sendo órgãos executivos,
quantas vezes sem
grandes apoios dos
poderes centrais, para
resolverem problemas
complexos, de natureza
social, cometem
irregularidades, não em
proveito próprio, mas
para mitigar situações
de autêntica miséria.
O Poder Local, ao nível
das freguesias, tem
sido, de fato, o parente
pobre do sistema
democrático. Os
representantes do poder
local ainda são vistos,
por diversos políticos e
muitos cidadãos
nomeados, como uma
alavanca para os
projetar para órgãos de
soberania,
prestigiantes,
influentes e rentáveis.
Ainda há quem olhe para
os autarcas das
freguesias rurais como
uns cidadãos
semianalfabetos, ou
pouco menos, que sendo
populares no seio das
suas comunidades, são
considerados excelentes
“catalisadores” de votos
que, no terreno, no “dia
a dia”, no “cara a cara”
com o povo, vão-se
defendendo como podem, e
ainda protegem a força
política que
representam, bem como os
candidatos a cargos de
superior categoria,
prestígio e benefícios
e, indiretamente, todos
os que depois vão ser
nomeados para
secretariados e
assessorias.
São também, e em certa
medida, aqueles autarcas
que, genuinamente,
prestigiam e dão sentido
à verdadeira democracia,
que em muitas aldeias
portuguesas mais se
aproxima de uma
democracia direta, isto
é: os eleitos sempre no
meio do povo, com o povo
e preocupados com o seu
povo.
Onde está o respeito
pelas autarquias locais
ao nível das
Assembleias/Juntas de
Freguesia? Onde está o
reconhecimento pelo
serviço prestado e a
desenvolver por estes
autarcas? Onde está a
dignidade que a Nobreza
do Poder Local
Democrático das
Freguesias deve merecer
dos restantes órgãos de
soberania? Quem está
verdadeiramente ao lado
dos autarcas das
freguesias? Seguramente,
o povo simples, anônimo,
generoso, a quem
retiraram, em mais de
mil freguesias, o seu
único “baluarte”?
A imposição da fusão das
freguesias revela bem a
consideração e o
respeito que existe por
estas autarquias locais,
demonstra,
inequivocamente, sob a
capa de um qualquer
argumento econômico, de
uma alegada poupança de
uns miserabilíssimos
euros que,
provavelmente, até será
uma quantia ínfima se
comparada com gastos
luxuosos e supérfluos
noutros níveis do poder,
que os milhões de
cidadãos, apoiados pelas
suas Assembleias/Juntas
de Freguesia, são
cidadãos de segunda ou
terceira categorias e
que os seus autarcas são
meros “peões”, jogados
ao sabor de certas
conveniências.
Peremptória, mas
respeitosamente,
deixa-se aqui o desânimo
democrático de um tal
estado de coisas.
Rejeita-se aqui a
indiferença e a
humilhação que querem
impor, apenas e por
enquanto, aos autarcas
das freguesias. Apela-se
agora ao bom senso, aos
valores magnânimos da
democracia que no Poder
Local das Freguesias
têm, por ventura, o seu
expoente máximo,
conseguindo resultados
fantásticos para a
melhoria das condições
de vida das populações.
É justo que se corte no
suntuoso, no supérfluo,
se apoie mais os
carenciados, os
desprotegidos,
vulneráveis e
enfraquecidos pelas
agruras, quantas vezes
de uma vida de
privações, de doença, de
sofrimento. São as
Autarquias Locais, ao
nível das freguesias,
através dos seus
eleitos, que melhor
conhecem estas situações
de um país que caminha
para os vinte por cento
da população no limiar
da pobreza e a passar
fome: crianças, jovens,
adultos e idosos que já
comem das “marmitas” que
as Instituições de boa
vontade vão
distribuindo, quase pela
calada da noite, nas
grandes cidades. Que
procuram nos caixotes do
lixo alguns alimentos,
roupas e outros objetos
de primeira necessidade.
É por tudo isto que a
dificuldade em
constituir listas de
cidadãos para as
pequenas freguesias é
muito difícil e,
eventual e
compreensivelmente,
muitas pessoas, para
este nível do poder
local, não se querem
envolver, todavia e
talvez porque o regime
esteja inquinado, se
forem convidadas,
algumas até serão
“empurradas” e
aconselhadas para outros
níveis do exercício do
poder político, seja de
eleição, seja de
nomeação,
independentemente da
experiência e da idade,
elas surgem em altos e
muito bem renumerados
cargos. Tais cidadãos,
muitos, ainda jovens,
que até serão o futuro
do mundo, deveriam
passar, primeiro, pelo
terreno; depois, para os
gabinetes.
Todos estes jovens,
depois de obterem
estudos muito
importantes em diversas
áreas
científico-tecnológicas,
são necessários ao
desenvolvimento do país,
para contribuírem para a
qualidade de vida das
pessoas, referindo-se
aqui, apenas, e a título
de exemplo: médicos,
enfermeiros,
professores,
investigadores,
engenheiros, arquitetos,
juristas e muitos outros
profissionais
qualificados, os quais
poderiam dar a sua
cooperação, no terreno,
no seio das populações
das nossas freguesias,
em vez de emigrarem e
colocarem ao serviço de
outros povos o que
aprenderam no seu
próprio país, à custa
dos impostos dos seus
concidadãos.
É urgente dignificar o
poder local das
freguesias, atrair os
nossos jovens para esta
primeira realidade da
governação. Os jovens
têm de ser incentivados
a iniciarem a sua
participação
cívico-política no
terreno das
dificuldades, perante as
situações concretas e
complexas das populações
para, um dia mais tarde,
nos gabinetes da “alta
governança”, saberem
decidir com verdade,
realismo, sabedoria,
justiça e magnanimidade,
porque, para se tomarem
boas, sábias e íntegras
decisões, é preciso
conhecer-se a realidade
profunda da sociedade. |