Patrimônio Cultural dos Povos
Certos hábitos, costumes e tradições, que ocorrem no
seio das famílias, nem sempre são levados para a escola,
por razões diversas: falta de abertura por parte de
alguns dos responsáveis pelo sistema educativo, docentes,
discentes, encarregados de educação, alunos/formandos,
comissões de alunos e de pais, incluídos; ausência de
currículos extraprogramáticos; preconceitos de alguns
agentes educativos; receio de exposição por parte das
minorias étnico-sociais; recursos humanos, financeiros e
infraestruturas não previstos.
Em tais circunstâncias e reconhecendo-se um vasto
conjunto de condicionalismos, urge dinamizar a
sociedade, desde logo estabelecendo parcerias, para se
tirarem os maiores proveitos de um tão vasto e
diversificado patrimônio cultural.
Criar, rapidamente, as condições para a constituição e
funcionamento de parcerias poderá ser um primeiro passo
para a idealização e aplicação de projetos educativos
que visem a objetivos bem concretos e realizáveis, no
espaço e no tempo, com público-alvo bem determinado.
Reconhecendo-se que as famílias, e a população em geral,
não dispõem das condições mínimas para o arranque de
tais projetos, parece pertinente admitir-se que a
iniciativa parta de quem já possui conhecimentos e meios
para fomentar a participação de outros parceiros,
considerando-se estar em condições para um primeiro
contributo, a comunidade docente, na área da
investigação.
O grupo dos docentes, investigadores e pedagogos, ao
elaborarem um projeto de intervenção educativa, em
parceria com um outro agente, terá em atenção vários
elementos étnico-culturais e sociais do respectivo
parceiro, para que os objetivos delineados sejam
alcançados com os melhores resultados. Nesse sentido:
investigar quais os problemas; quais os anseios; que
tipo de participação pode um grupo dar ao projeto; é
condição importante para o êxito da ação, que se
pretende desenvolver.
Todo e qualquer projeto que ignora determinadas
situações, culturas, meios disponíveis e a adesão
responsável por parte dos futuros intervenientes poderá
estar condenado ao fracasso, e uma eventual reformulação
pode criar resistências e suspeições. O patrimônio
cultural dos povos gera nestes um sentimento
nacionalista, de orgulho histórico-cultural e até
etnocêntrico que é necessário saber compreender,
contextualizar e valorizar no ambiente multicultural.
Por isso, a envolvência da família é fundamental: «Trata-se,
consequentemente, de privilegiar uma concepção de
participação familiar que considere as necessidades, os
valores, as práticas educativas e as dinâmicas internas,
próprias de cada família, numa perspectiva de respeito
pela pessoa, pela sua cultura e pelas suas percepções
particulares. A negociação e a concertação são, pois,
abordagens a privilegiar» (DIOGO, 1998:73).
Aferir-se, uma vez mais, e na perspectiva da educação
multicultural, da importância da família, como parceiro
estratégico a privilegiar, será uma verdade irrefutável,
mesmo que se considere a crise, que um pouco por todo
mundo está a afetar as famílias, principalmente as mais
carenciadas. Criar e proporcionar condições
socioprofissionais e econômico-culturais às famílias é
um desígnio universal, que todos os responsáveis
políticos, pelas áreas da educação e da economia, devem
procurar satisfazer.
Investir na educação, em ordem à construção de uma
sociedade instruída, culta e cívica, corresponde a
terminar com a maior parte dos conflitos mundiais, a
médio prazo. No limite, significa, entre outras
interpretações, igualmente legítimas, educar para a
cidadania.
Bem no âmago da questão, estará sempre o desejo de um
novo e diferente cidadão, o qual tem de ser preparado
pelos agentes de socialização, com destaque,
principalmente no tempo, para a família e para a escola.
Deseja-se a intervenção de uma filosofia prudente.
Urge proporcionar condições de interiorização de uma
cultura para a cidadania, a partir da Filosofia da
Educação, na vida ativa integrada na sociedade, na opção
responsável por: princípios, valores, atitudes,
participação num qualquer domínio democrático da
sociedade. Nesta lógica: elaboração de teorias, projetos
utópicos ou publicação de muitos artigos científicos
podem ser articulados com as experiências vivenciadas
individual e/ou coletivamente; e a sabedoria popular que
resulta da acumulação dos saberes das várias gerações.
Educar para uma cultura da cidadania do século XXI é um
projeto que não pode dispensar a participação, tanto do
cidadão anônimo, quanto do mais ilustrado acadêmico,
porque: «Em termos restritos, a cidadania consistirá,
então, na inserção do indivíduo no espaço político e na
participação dos cidadãos nas instituições sociais. Na
perspectiva do Estado, a cidadania significa lealdade,
participação e serviço em benefício da coletividade. Na
perspectiva do indivíduo, a cidadania traduz-se por
liberdade, autonomia e controle político dos poderes
públicos» (FONSECA, 2001:43).
No exercício da cidadania plena, liberdade e autonomia
são dois valores essenciais à dignidade da pessoa humana
e, qualquer deles, entre muitos outros possíveis, e
igualmente fundamentais, não só devem ser divulgados e
estudados, como também, exercidos plenamente.
O papel da educação revela-se aqui, e uma vez mais, de
extrema importância e, nesse sentido, a escola tem a
grande responsabilidade de ministrar: não só
conhecimentos em redor daqueles valores; como também
transmitir práticas consentâneas com os mesmos, ou seja:
só em liberdade se consegue uma preparação para a vida
autônoma do cidadão, por isso não se aceitará, hoje e
sempre, sem mais discussão, uma escola e uma educação
que ignorem as realidades circundantes a ela.
Qualquer que seja o estatuto da escola: básica,
secundária, técnica, profissional, universidade,
instituto politécnico, pública ou privada, ela não pode
continuar a produzir trabalho científico, investigação,
teorias e críticas a teorias que sirvam apenas para
consumo interno e alimento para novas teorias.
Reconheça-se que: «Uma escola alheada da vida é,
talvez, a principal crítica que se lhe faz hoje. Esta
crítica comporta três dimensões principais,
correspondendo a: (I) redução e abstração do mundo
natural; (II) alheamento das realidades do mundo do
trabalho e (III) não valorização do formando, não
promovendo a criatividade e o desenvolvimento da
sensibilidade e da afetividade» (PORFÍRIO,
1992:108).
Ao novo cidadão que se deseja para este século XXI, deve
ser-lhe concedida a oportunidade de exercer a liberdade
e autonomia nas diversas atividades que,
responsavelmente, vai exercendo ao longo da sua vida,
sem qualquer prejuízo ou benefício por razões de
estatuto racial, social, político, econômico ou
acadêmico.
Capacidades latentes encontram-se nos vários escalões
etários e socioprofissionais e, quando os seus titulares
pretendem colocá-las em prática, de uma forma legal e
legítima, devem ser apoiados, por quem tem o poder
institucional para os apreciar e avaliar.
Pensa-se que deverá ser esta a postura dos responsáveis
pelos sistemas educativos: seja na sua elaboração ou
conceptualização; seja na sua execução e avaliação. Com
tal pressuposto, não haverá inconveniente na aprovação
dos projetos apresentados pelos cidadãos.
Não se justificam certos preconceitos, a propósito de no
país aumentar o número de graduados, nas diversas áreas
do conhecimento, porque isso, a médio prazo, beneficiará
a sociedade em geral, na medida em que passará a existir
uma melhor compreensão dos problemas, mais criatividade
para os resolver, ao invés de se poder estar a cair numa
situação de pessoas indignadas, desmotivadas e
improdutivas, porque não lhes foram reconhecidas
capacidades, vocações, boa vontade, disponibilidade e
alguns sacrifícios para concretizarem um projeto de vida,
assente no conhecimento, na cultura, na liberdade, na
autonomia, em suma, na plena cidadania que assiste à
pessoa humana, genuinamente digna, e que pode ser
apoiada, também, pela comunidade
científico-universitária.
Bibliografia:
DIOGO, José M. L., (1998). Parceria
Escola-Família. A Caminho de uma Educação Participada, Porto:
Porto Editora.
PORFÍRIO, Manuel, (1992). Metodologia
do Projecto Tecnológico, Lisboa: Universidade Aberta.
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