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por Regina Zanella

 
Como me tornei espírita

Nasci em 24 de junho de 1964, em Votuporanga, SP. Fui adotada aos 5 meses de idade por Anita e Antônio Zanella, ambos filhos de italianos. Até os 5 anos de idade residimos próximos a um Centro Espírita, Emmanuel, que não cheguei a conhecer, a uma Igreja Católica e a uma vizinha presbiteriana.
Aos domingos, me perdia sempre durante a missa, na Igreja Matriz, pois era muito grande; no final o padre sempre anunciava ter encontrado uma criança perdida. Gostava mais dos presbiterianos, pois tinham uma sala para crianças, com papel, giz, lápis de cor.
Aos 10 anos, já em outra cidade, comecei a frequentar a sede paroquial, o grupo de jovens, a cantar no coral, a ler uma leitura ...
Aos 15 de idade voltei a viver em Votuporanga. Tentei ir à missa, mas discordava em boa parte do sermão, me vinha um calor que me sufocava, e algo dentro de mim protestava.
Naquela época, minha avó materna, italiana, me disse que sua tarefa neste mundo se concluiria em fevereiro de 1980, e ela me avisaria. Josephina Succi desencarnou na noite de 11 de fevereiro, como por ela previsto, e em sonho me acordou, dizendo ter chegado o momento. Já estava vestida quando os familiares telefonaram comunicando a notícia. Durante todo o velório, minha avó conversou comigo, contando‐me inclusive fatos da sua juventude, que eu não conhecia. Quando disse à minha mãe, todos começaram a desconfiar que tinha alguma coisa de errado comigo.
Vim para a Itália em 1987, após a Faculdade de tradutor em alemão. Realizei trabalhos na moda, no jornalismo e na TV, como no Brasil, e também de tradutora de inglês em feiras.
Trabalhei em seguida como assessora de Imprensa para o Consulado Brasileiro em Milano, e algumas firmas italianas. Paralelamente me ocupava também da organização de eventos, e foi durante a organização de um deles, que comecei a ouvir vozes insistentes, que me exortavam à oração, a ler o Evangelho... Procurei uma amiga italiana médium, pedindo orientação. Ela me levou a um frade franciscano, conhecido por seus prodígios, Padre Tito. O mesmo me disse que eu me preparasse, pois em pouco tempo ficaria como Joana D’Arc e deveria tomar muito cuidado, pois poderia ser perigoso. Depois de alguns dias as vozes se intensificaram, assim como as visões. Fui internada em Hospital Psiquiátrico como esquizofrênica, mantida com camisa de forcas e amarrada no leito desde os pés para não fugir, pois as visões continuavam. Passados alguns dias, tive um sonho com minha avó, que dizia que eu não tinha nada, que o meu problema era outro, mas que os médicos não tinham preparação para entender. Recomendou que eu não tomasse os remédios, pois, como estava, até com baba na boca, por causa dos fortes medicamentos, eu não recuperaria a razão.
Acordei outra, e comecei a fazer segundo o seu conselho, salvo para as injeções, que não conseguia evitar. Meu namorado de então, hoje meu companheiro, Mássimo, esteve sempre presente, desolado porquanto dito pelos médiuns: “A moça está completamente desequilibrada, começaremos a ver algum resultado daqui a um ano, avise os familiares sobre a situação”.
Porém, contrariamente às previsões médicas, me recuperei rapidamente e tive alta. Voltei ao Padre, que me disse se tratar de mediunidade, e que eu não tomasse mais remédios e nem voltasse ao Psiquiatra.
Mudei muita coisa na minha vida. No ano seguinte, trabalhando como jornalista, fui convidada a fazer matéria sobre um orador brasileiro, aqui em Milano. Compareci assim ao Centro Vita Nuova; o orador era Divaldo Pereira Franco. Nunca tinha ouvido falar nele antes. O amigo que me convidou à sua palestra, Claudiano Filho, começou a deixar xerox de livros espíritas na minha caixa do correio. No mesmo ano sonhei com a morte de meu pai, e fui ao Brasil. Aí chegando, fiquei sabendo quem era meu pai biológico; fui procurá‐lo, e, lá chegando, me disseram que estava atrasada de dois dias, pois o mesmo havia falecido e sido enterrado no dia anterior.
Retornei à Itália, passaram‐se alguns meses, sonhei novamente a morte de meu pai, mas desta vez vi o caixão, e, dentro dele, o padre adotivo, a pessoa que mais amava.
Voltei ao Brasil, pedi à minha mãe que me recomendasse um Centro Espírita, ela me indicou o Emmanuel, aquele, a poucos quarteirões da casa onde nasci.
Voltei às origens. No centro voltaram as imagens, as vozes, e a confirmação do eminente desencarne de meu pai. Sob recomendação do Sr. Romeo Grisi, comecei a ler para meu pai “E a vida continua”, a fim de prepará‐lo para o seu desencarne, ocorrido 17 dias após eu ter entrado pela primeira vez em um Centro Espírita.
Assim, como minha avó anos atrás, meu pai conversou comigo durante e após o sepultamento, dando‐me provas das quais não podia duvidar. Era aterrorizante a ideia de falar a meus familiares, e ser internada novamente, a única pessoa a seguir‐me nesta “aventura” foi Mássimo.
Qual não foi a minha surpresa quando escutei minha mãe “confessando” aos meus dois irmãos, Glória e Wagner, que nossos avós paternos, italianos, eram espíritas desde os anos 40. Difícil, porém, foi a aceitação da parte de meus irmãos eu me tornar espírita.
Dali, o começo dos estudos, a mudança radical de vida e de propósitos, que continua até hoje.
Nestes anos sempre me preocupei em entender por que o Espiritismo era tão pouco conhecido aqui na Itália, por que não existiam Centros espíritas, livros traduzidos – e nesta busca conheci Dorival Sortino, da Casa do Nazareno Edições.
Como era natural, entrei em contato com o Centro “Vita Nuova”, pois era o único em Milano conhecido como Espírita. Era frequentado quase totalmente por italianos; estudavam o lado científico do Espiritismo, o religioso não era considerado, conheciam algumas práticas espíritas, mas também por causa do preconceito na Itália não vinham sendo aplicadas, pelo menos em público. A meu ver, houve um pequeno sincretismo com outras práticas espiritualistas, mas o Vita Nuova realizou um trabalho que nenhum grupo ou centro espírita, aqui na Itália, ainda hoje, conseguiu igualar.
Palestras, vasta e rica biblioteca, revista espírita... 
Hoje as atividades infelizmente são muito reduzidas.
Assim sendo, caros amigos, este tem sido o nosso trabalho de grupo em todos estes anos de atividade, dar vida a um Movimento espírita italiano, não somente de brasileiros no exterior. Divulgar o Espiritismo para que ele seja conhecido pelo que realmente é, não pelo que leigos, ignorantes, pessoas de má-fé e má conduta vêm fazendo em muitos anos. Derrubar barreiras, construir caminhos novos, por isso o nosso grupo se chama “Sentieri dello Spirito” (Caminhos do Espírito) e, como diz uma canção de Milton Nascimento: “todo artista tem de ir aonde o povo está”, e nós lá vamos, levando a mensagem espírita.
Percebemos que se ficássemos sentados na nossa sala, esperando que os Espíritos conduzissem espíritas até nós, faríamos como o mau servo da Parábola dos talentos: antes de multiplicar a mensagem, a teríamos somente para nós.
Em 1996, quando começamos, não existiam espíritas, mas potenciais espíritas. Emmanuel diz que a maior caridade que podemos fazer pelo Espiritismo é a sua divulgação.
Para nós não importa se é brasileiro, italiano ou de outra nacionalidade qualquer, o Consolador prometido pelo Cristo não faz distinção de fronteiras, de línguas, raças ou posição social, simplesmente Consola.
Ainda estamos trabalhando, e ainda temos muito, mas muito, pela frente. Estamos fazendo a nossa parte, dentro das nossas limitadas possibilidades de divulgação, todavia, não era e não é nossa intenção fazer proselitismo.
Nestes anos levamos muitas pedradas também, principalmente dos companheiros brasileiros, que, não aceitando a nossa “diversidade” em fazer palestras em italiano, de procurar uma maior integração, porque somos alegres (até isso) e outros pequenos particulares que nada têm a ver com a fraterna visão espírita, levantaram palavras difamatórias sobre o nosso trabalho.
Mas estamos na certeza de que estamos trabalhando para o Cristo, nas bases do Seu Evangelho e da Doutrina Espírita.
A dura realidade humana às vezes machuca, mas são pedregulhos que com certeza contribuem para o nosso amadurecimento, como na mensagem de Emmanuel, “Amigos e Inimigos” (apesar de esperar não ter inimigos, somente diferentes opiniões), publicada no livro “Passos da Vida”:


“O amigo é uma bênção. Mas o inimigo é também uma ajuda se soubermos tirar vantagem da sua hostilidade.
Porque somos seres imperfeitos, ainda em evolução, precisamos de um amigo que nos encoraje e de um inimigo que nos controle.
Jesus foi categórico no recomendar-nos: 'Amai os vossos inimigos'. Saibamos agradecer quem corrige os nossos erros, vigiando os nossos passos em direção de um caminho melhor”. 
(Traduzido do italiano, pois não tenho o texto em português.)


Regina Zanella participa ativamente do movimento espírita na Itália, onde reside desde 1987.


 


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita