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por Temi Mary Faccio Simionato 

 
Mandato mediúnico responsável, clarividência e sonambulismo


Na 2ª Carta aos Coríntios, capítulo 12, versículo 7, Paulo de Tarso, o Apóstolo intrépido, após o comentário de suas próprias visões fora do corpo denso, exclama: “E para que me não exaltasse pelas excelências recebidas, foi-me concedido um espinho na carne”.

Os valores anímicos como faculdades de comunicação entre os Espíritos, qualquer que seja o plano em que se encontrem, não podem perder de vista o mundo mental do agente e do recipiente, porquanto, em qualquer posição mediúnica, a inteligência receptiva está sujeita às possibilidades dos seus próprios pensamentos, e a inteligência emissora está submetida aos limites e às interpretações dos pensamentos que é capaz de produzir.

Fica claro, então, que em todos os casos em que há a emancipação da alma, o homem tem percepções independentes dos sentidos, pois toda percepção é mental. É o caso da clarividência, na qual o médium tem a faculdade de ver sem o auxílio dos órgãos da visão. É alguém dotado de possibilidades neuropsíquicas que lhes estendem os horizontes dos sentidos.

O termo clarividência surge pela primeira vez com seu sentido próprio em O Livro dos Espíritos, questão 455, que o define como: “emancipação da alma que se manifesta, às vezes, no estado de vigília, e produz o fenômeno conhecido pelo nome de segunda vista, que dá aos que a possuem a faculdade de ver, ouvir e sentir além dos limites dos nossos sentidos; (...) veem, por assim, dizer, através da vista ordinária e como por uma espécie de miragem. No momento em que o fenômeno da segunda vista se produz, o estado físico do indivíduo é sensivelmente modificado; o olho tem algo de vago; ele fita sem ver; toda a sua fisionomia reflete uma espécie de exaltação (...) e, para quem desfruta de tal faculdade, ela parece tão natural como a de ver (...)”

Em síntese, podemos chegar à seguinte conclusão com referência às faculdades de vidência e clarividência: todas as pessoas encarnadas podem ver Espíritos por meio do sono; os médiuns videntes veem Espíritos no estado de vigília ou sob transe superficial. Os médiuns clarividentes veem os Espíritos encarnados e desencarnados, o mundo espiritual e acontecimentos diversos sob forma de segunda vista, em estado de sonambulismo ou de desprendimento parcial do corpo físico.  Os Espíritos Superiores, ao promoverem o desenvolvimento destas faculdades, dosam suas percepções para não os desequilibrar.

Em toda a sua história, o Cristianismo mostrou médiuns sonambúlicos sublimes, por terem testemunhado a evidência do plano espiritual. No sonambulismo, a alma se transporta ao local dos acontecimentos, mas pode também presenciá-los a distância como se estivesse vendo uma projeção, podendo falar com exatidão das coisas que a rigor ignora no estado de vigília, ou até mesmo de assuntos que estão acima de sua capacidade, vendo outros Espíritos e recebendo instruções deles. Deus deu esta faculdade ao homem para um fim útil e sério, e não para aprender o que não devem saber, por isso os sonâmbulos não podem dizer tudo.

Todos os efeitos do magnetismo, do sonambulismo, do êxtase, da dupla vista etc., que constituem a quase totalidade dos milagres do Evangelho, pertencem a esta categoria de fenômenos. Sabe-se que estes efeitos são resultantes de aptidões e disposições fisiológicas especiais. Esses efeitos têm se produzido em todos os tempos e têm sido o cunho dos “milagres” tanto como os que procediam de causas impenetráveis. A possibilidade da maior parte dos fatos que o Evangelho cita como praticados por Jesus está completamente demonstrado, pelo magnetismo e pelo Espiritismo, que são puros fenômenos naturais, pois eles se produzem aos nossos olhos, espontaneamente ou provocados.

Na Revista Espírita, de fevereiro de 1867, na página 344, em Dissertações Espíritas, o médium Senhor T..., em sono espontâneo, relata: “(...) O sonambulismo espontâneo... não é, com efeito, senão uma forma de médiuns videntes, cujo desenvolvimento já era anunciado, há algum tempo, assim como o aparecimento de novas aptidões mediúnicas (...) hoje; começa-se a compreender que a visão a distância independe dos órgãos da visão, pode bem ser um dos atributos da natureza humana, e o Espiritismo o explica pela faculdade expansiva e pelas propriedades da alma...”. E, ainda na mesma Revista, no mês de junho, página 261: “(...) De tudo isso concluo que o magnetismo, desenvolvido pelo Espiritismo, é a pedra angular da saúde moral e material da Humanidade futura”.

Sabemos, assim, que o sonambulismo pode ser provocado por ação magnética, mas o que se manifesta nas reuniões mediúnicas é o natural, considerando as explicações de O Livro dos Espíritos, nas questões 223 e 216: “Os fenômenos do sonambulismo natural se produzem espontaneamente e independem de qualquer causa exterior conhecida, mas, em certas pessoas dotadas de organização especial, podem ser provocadas artificialmente, pela ação do agente magnético. O sonambulismo natural é um fato notório, que ninguém pensa em pôr em dúvida, a despeito dos admiráveis fenômenos que apresenta”.

Com Jesus, em Sua luminosa passagem, o homem recolhe o necessário crivo moral para definir responsabilidades e objetivos. O fenômeno mediúnico, por toda parte, foi e será sempre intimado à redenção da consciência. Vemos esses fenômenos em exemplos como da humildade de Estêvão, no livro Paulo e Estêvão, que suporta sereno as fúrias que o apedrejam, aflorando-lhe os mecanismos da clarividência, percebendo a presença Sublime do Mestre, antes de se render à imposição da morte; ou ainda, compadecendo-se de Saulo de Tarso – depois Paulo de Tarso – obsidiado por seres cruéis, que o transformam em desalmado verdugo, aparecendo-lhe Jesus em Espírito,  na senda de Damasco, para ensiná-lo, através de longos anos de renúncia e martírio, a converter-se em padrão vivo de bondade e entendimento.

A questão moral é revelada, então, como a verdadeira fortaleza da Doutrina Espírita que nos deve transformar para melhor. Daí Allan Kardec afirmar na Revista Espírita,novembro de 1861, página 359: “(...) o mais belo do Espiritismo é o lado moral. É por suas consequências morais que triunfará, pois aí está a sua força, pois aí é invulnerável (...)”. Outro ponto de grande importância, que jamais deve ser esquecido pelos espíritas, é que a referência moral do Espiritismo está contida no Evangelho de Jesus. Os Espíritos vêm não só confirmá-la, mas também mostrar a sua utilidade prática, tornando inteligíveis e patentes as verdades que só haviam sido ensinadas sob a forma alegórica. E, juntamente com a moral, trazem-nos a definição dos mais abstratos problemas da existência.

Portanto, os médiuns que fazem mau uso da faculdade mediúnica responderão por isso, cedo ou tarde, uma vez que o dom foi concedido, justamente pelos quais devemos render graças a Deus. Vemos, assim, que a prática mediúnica exige cuidados, requisitando conhecimento e espírito de fraternidade, a fim de auxiliar os médiuns, sem persegui-los, ante o medo do animismo que, por ignorância e desinformação, poderá ser visto como uma mistificação, consciente ou inconsciente, conforme esclarece André Luiz, no livro Nos Domínios da Mediunidade, página 247: “Muitos companheiros (...)  vêm convertendo a teoria animista num travão injustificável a lhes congelar preciosas oportunidades de realização do bem; portanto, não nos cabe adotar como justas as palavras “mistificação inconsciente ou subconsciente” para batizar o fenômeno”.

Desta maneira, poderemos entender que o médium, a benefício de si mesmo e da obra, deverá escolher ambientes onde suas forças morais se consolidem e os propósitos superiores lhe sejam estímulo ao estudo e ao trabalho com Jesus, no esforço constante de autoevangelização, para adquirir a faculdade do discernimento.

Para que o médium de hoje seja amanhã portador de mandato mediúnico, necessário se faz que o Evangelho se torne seu roteiro e Jesus sua meta, enriquecendo a própria alma com a bondade, a discrição, o discernimento, a perseverança e o espírito de sacrifício, sendo, no trabalho, um servidor idealista e desinteressado.

Estudemos a fim de nos identificarmos com o divino Amigo, e que possamos, um dia, transformar as nossas mãos e as nossas palavras em abençoados instrumentos de auxílio a todos aqueles que nos buscam. Não bastam, portanto, mediunidades fulgurantes, mas, sim, a inadiável purificação do espírito para o soerguimento do bem eterno.


Bibliografia
:

XAVIER, C. Francisco – Seara dos Médiuns – ditado pelo Espírito Emmanuel - 20ª edição – Editora FEB – Brasília/DF/ lição 47 – 2015.

XAVIER, C. Francisco – Religião dos Espíritos – ditado pelo Espírito Emmanuel – 22ª edição – Editora FEB – Brasília/DF/ lições 55 e 57 – 2013.

KARDEC, Allan – Obras Póstumas – 11ª edição – Editora LAKE – São Paulo/SP/ página 93 – 1995.

KARDEC, Allan – A Gênese – 28ª edição – Editora FEB - Rio de Janeiro/RJ/ – capítulo 1, item 56 – 1985.


 

 

     
     

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