Prevalece ainda
em muitos de nós, os seres pensantes, as racionais criaturas do Deus Único, uma
tendência a tudo adaptar, ajustar e, em muitos casos, alterar seja a ideia de
outrem, uma prática qualquer bem estabelecida ou mesmo uma Doutrina; as
possibilidades são incontáveis.
Observa-se
facilmente esta corriqueira conduta nesta parcela da Humanidade Universal. Por
outro lado, argumenta-se, e com razão, que mudanças são esperadas e mesmo
desejadas em tudo que ainda não está acabado, entretanto alterar procedimentos e
ensinos bem estabelecidos e corretos não seria aconselhável.
Sabe-se existir
versões alteradas da Bíblia; para se convencer desta realidade, basta
observar a tradução protestante, cuja coleção de textos religiosos não contempla
o livro de Tobias. Por outro lado, a tradução católica inclui livros ausentes no
correspondente compêndio judaico. É fato notório terem alguns textos do Novo
Testamento sofrido mutilações e adaptações para acomodar as convicções do
tradutor, ou, quem sabe, daqueles que encomendaram a tarefa da tradução; a
propósito, estes fatos podem ter originado o conhecido refrão “tradutor,
traidor”.
São
significativos os exemplos de modificações em importantes textos originais,
contudo esta inclinação se verifica facilmente em ponto menor em outras
situações. Dentre tantas, registraremos alguns poucos exemplos relacionados à
prática na área mediúnica em relação à própria Doutrina dos Espíritos:
· Encaminhar
médiuns sem conhecimento doutrinário para salas mediúnicas, visando, entre
outros estranhos objetivos, compor o quadro deficitário de participantes da
respectiva reunião, não parece ser uma conduta espírita, isto quando a motivação
é o medo de “perder” o médium recém-chegado para outra casa, como se houvesse
uma disputa por número de seguidores entre algumas agremiações. Agindo assim, o
principiante apreenderá que bastaria ser ou estar médium para atuar
mediunicamente, deixando de assimilar a corretíssima conduta para todo o médium
iniciante em estudar detalhadamente todos os aspectos de sua faculdade antes de
poder bem exercitá-la com aproveitamento, primeiro para si mesmo, segundo, para
os outros.
· Acreditar
que trabalhos mediúnicos não podem ser exercidos em recintos diversos, isto é,
uma vez iniciada a atividade em um determinado cômodo ou sala da instituição,
deste local não se poderia mais se afastar, sob pena do resultado não ser mais o
mesmo. Alguns creem existir uma organização especial na atmosfera do lugar
formada talvez por “fluidos mediúnicos”, criada nos primórdios da atividade,
quem sabe algum ambiente “mágico” se formou em função desta nova reunião,
indagam?
· Uma
variante da anterior é admitir que uma sala usada para serviço de passes
magnéticos não possa mais ser usada para, por exemplo, tarefas de evangelização,
pois a atmosfera fluídica formada neste recinto seria incompatível e prejudicial
às crianças.
· Outra
nuance bem semelhante seria a crendice de se manter uma sala apenas para
reuniões mediúnicas, ou seja, naquele ambiente só atividades envolvendo médiuns
podem acontecer.
· Não
observar horário e frequência da equipe sob a alegação de que “muito rigor”
afasta os bons Espíritos, como se observar a disciplina em qualquer reunião
espírita fosse excesso de rigor!
· Aceitar
a chegada do médium fora do horário de início acordado por todos, a título de
que não seria caridoso impedir o ingresso do atrasado e afobado participante,
não demonstra conhecimento doutrinário do dirigente. O tarefeiro imprevidente
não deveria nem tentar adentrar a sala de reunião; ao invés, poderia tomar um
livro espírita e dedicar o tempo correspondente à duração do trabalho para se
ilustrar mantendo a sua atenção voltada aos textos doutrinários. Caso,
evidentemente, os atrasos ou faltas sejam regulares, e não sejam
satisfatoriamente justificados, o integrante deve ser orientado a se afastar
temporariamente, contudo nada impede sua participação nesse período em outras
tarefas da casa, aliás a melhor recomendação. A propósito, em princípio, não é
recomendado aceitar um médium de outra instituição que de lá saiu por “excesso
de rigor” nas atividades. Este candidato deve receber prioritariamente atenção
para bem conhecer quais foram os “excessos de rigor” que o obrigaram a deixar o
trabalho anterior.
· Dedicar
tempo excessivo ou mesmo atividades regulares na reunião para “tratar” de casos
relacionados a familiares e amigos representa outra conduta estranha. É comum o
grupo se deixar levar pela falsa ideia de que deve primeiro atender seus muitos
parentes e conhecidos, afinal, onde estaria a caridade para com os mais
próximos!? deixando parcialmente de assistir os inumeráveis desconhecidos, tão
ou mais necessitados do que os amigos e a parentela. Fazer da reunião mediúnica
uma tarefa familiar e dedicada aos conhecidos, não esquecendo de contemplar os
amigos mais íntimos, não é recomendado. Podemos fazer menção a uma variante
desta conduta, nos casos de tratamentos médicos e espirituais, priorizando pela
direção do trabalho o atendimento dos parentes e amigos do grupo envolvido.
· Receber
necessariamente passe magnético antes da atividade mediúnica é outra ilusão no
movimento, afinal, alega-se, tomar um bom passe antes do trabalho é uma
necessidade para melhor assistir os desencarnados! Poderíamos ajuizar que, se o
trabalhador não se sente pronto, considerando não ter-se preparado adequadamente
durante o dia para a tarefa, não será um passe que o harmonizará e o colocará em
condições necessárias para bem atuar no grupo; é preciso um pouco de bom senso.
A prática se agrava muitíssimo caso o dirigente do grupo, ou mesmo a direção da
casa, tenha conhecimento da rotina e não se manifeste para esclarecer o médium.
· Reunião
pública com médium incorporado possibilitando mensagens ou interpretações de
interesse geral, incluindo respostas às perguntas de uma assembleia heterogênea.
Não há e nunca houve qualquer menção a este tipo de procedimento nas obras
fundamentais e correlatas de Allan Kardec. É natural, pois Doutrina Espírita é
coisa séria. Além de ser uma incorreta apresentação inicial do Espiritismo
àqueles que porventura aparecem pela primeira vez, sugere aos mais antigos que
podem questionar sobre qualquer assunto relativo a seus interesses particulares,
quando na realidade o que deveria ser ensinado é que todos devem ser
incentivados a folhear os livros espíritas e estudá-los com afinco para se
autoesclarecer, buscando responder suas próprias dúvidas e indagações, antes de
formular questões particulares a Espíritos.
· Estudar
em demasia durante a reunião ou suprimir dia(s) das atividades para atender esta
recomendadíssima conduta de estudar obras espíritas não parece igualmente
atitude razoável. O grupo, não se dispondo a utilizar um dia a mais por semana
para estudar, está em caminho oposto ao recomendado pela boa prática mediúnica.
Não se substitui atendimento espiritual por decreto, ou seja: Espíritos
desencarnados, necessitados de atendimento, hoje nem apareçam, pois estamos
estudando! Neste particular item não se pode tentar “matar dois coelhos com uma
só cajadada”, nos dizeres populares. Se o grupo não consegue estudar em dia
diverso da reunião, deve então manter o estudo e não a parte prática, até haver
consenso entre os integrantes em dia e horário viabilizando desempenhar as duas
atividades em momentos diferentes.
· Aceitar
médium em desequilíbrio recém-chegado à casa diretamente em sala mediúnica não
condiz com a boa prática espírita. O médium precisa de equilíbrio para bem se
integrar à tarefa; como entender um candidato em desarmonia íntima, muitas vezes
obsidiado, sob a alegação de que precisa urgentemente “receber Espíritos”, ser
aceito em um grupo já constituído!? Como fica o grupo em presença de um elemento
destoante na equipe? Qual a formação desse dirigente ao aceitar tal conduta?
Seria de fato um grupo mediúnico espírita, ou uma equipe priorizando apenas o
fenômeno e nada mais?
· Reuniões
onde os participantes estão regularmente afastando-se do grupo, e este, por sua
vez, incorporando novos integrantes em consequência destas ausências, também não
representam trabalhos espíritas. O grupo para se harmonizar precisa de tempo, e
não é curto; se na tarefa estão normalmente presentes novos elementos, não há
harmonia possível, ficando a equipe à mercê do desequilíbrio, é preciso observar
o preparo do dirigente ao admitir tal rotina.
Citamos alguns
poucos requisitos indispensáveis para alcançar bons resultados em uma atividade
mediúnica séria à luz do Espiritismo. Se a casa ou os integrantes não conseguem
se organizar utilizando estas rotinas, preferível seria atuarem em outras áreas.
Além de O
livro dos médiuns ser
a referência básica para o entendimento do fenômeno mediúnico, há outras
literaturas muito recomendadas; uma delas é o livro relativamente desconhecido
do “moderno movimento espírita” intitulado Desobsessão.
Publicado em 1964, de autoria de André Luiz, estabelece claros critérios
espíritas organizacionais para bem nortear um trabalho nesta particular área.
O filósofo do
Espiritismo, Léon Denis, registrou em um de seus justos pensamentos: O
Espiritismo será o que o fizerem os homens.
Tudo indica que o sábio de Tours, em 1911, quando a advertência foi
escrita na monumental obra No Invisível, recomendada ao conhecimento de
todos os médiuns, já pressentia ou mesmo conhecia de perto esta tendência do ser
humano, e os companheiros de ideal nas fileiras da Nova Revelação não escapam
desta conduta, adaptando e modificando as orientações espíritas há muito tempo
bem sedimentadas. Aceitam como verdadeira a Doutrina dos Imortais, reconhecem
Allan Kardec como um Espírito superior de elevada evolução, sabem ter o Espírito
da Verdade coordenado todo o elaborado trabalho de codificação do Espiritismo,
contudo, ao “traduzirem” os ensinos, na prática do dia a dia, traem os
princípios doutrinários, vivendo os postulados espíritas da forma como melhor
lhes convém.
Esta situação
presente nada mais representa do que o Espiritismo praticado à moda da casa,
quando dirigentes,
ainda despreparados para dirigir,
fazem vista grossa a tantas irregularidades cometidas e observadas amiúde nas
agremiações. Quem sabe, em breve, se assim o desejarem os desavisados da
Doutrina, teremos um Espiritismo à moda de Allan Kardec e o sábio Léon Denis
poderá tranquilizar-se intimamente, pois ele deve estar bem apreensivo
constatando que a sua importante advertência está-se concretizando, ao menos
nesta importante área de atuação dos espíritas, segundo uma vertente que
certamente não desejou e não deseja.
A forma como
caminha a prática da Doutrina dos Imortais, no tocante às atividades mediúnicas
nos centros ditos espíritas, claramente não ocorre em todos os casos, mas
certamente eles são muitos, e deixa bastante a desejar daquela imaginada por
Allan Kardec, quando em sua simplicidade conversava com os ditos mortos e deles
retirava as informações necessárias para a composição das obras espíritas,
jamais traindo a confiança depositada em sua missão pelo Cristo.
Chega-se ao
absurdo de argumentar-se que Allan Kardec nada disse sobre estas
particularidades da atuação espírita, alguns se aventuram mesmo a sugerir: O
Livro dos Médiunspertence
ao passado, por conta disto, assim acreditamos, Jesus, o nosso Governador,
permitiu a vinda de médiuns de gabarito aqui reencarnando e, através da própria
mediunidade, que nos trouxessem novos compêndios sobre esta temática,
psicografando as chamadas obras subsidiárias. São muitas, basta procurar livros
tratando sobre o assunto de autoria de Chico Xavier, Divaldo Franco, Raul
Teixeira, Yvonne Pereira, e de seus guias espirituais correspondentes; de
Hermínio Miranda e de Therezinha de Oliveira, apenas para citar alguns e ler,
estudar, analisar, refletir detidamente sobre os registros dos Espíritos
encontrados nestes tantos livros, obras estas aguardando pacientemente para
serem descobertas e usadas por todos os envolvidos nesta área belíssima, lei de
Deus certamente, que tanto pode trazer em consolo e esperança aos desalentados,
não só encarnados, quanto à imensa população dos desencarnados.