Artigos

por Claudio Viana Silveira

 

O barco


Fazia-se o mais absoluto silêncio nas proximidades do estaleiro no qual eu estava recolhido… No final da tarde de inverno, trabalhadores e pescadores daquela área já se haviam aconchegado a seus lares.

Eu me mexia num suave bailado que me proporcionava a brisa suave e o mar calmo, meu habitat, meu aconchego…. Ora, também eu possuía um aconchego!

Parecia não haver viva alma por perto, mas nos arredores avistei o vulto de um jovem rapaz e, como estávamos solitários, ele e eu, procurei chamar-lhe a atenção e puxar conversa:

- Sabes?! – disse-lhe eu – fui trazido a este estaleiro pelo Prático destes mares, pois me achava bem doente; meu motor sofreu avarias, mas já foi recuperado por Equipe Competente que aqui esteve, mas meu casco… ah, esse ainda carece de reparos. Está botando água!

O jovem, de uma forma lacônica, mas doce, disse-me que disso tudo já sabia.

Intrigado e tagarela, questionei meus botões – ou seriam as boias que protegem meu casco? – como ele disso saberia?

Não contendo minha curiosidade e no afã de ‘desnudar’ o misterioso e novo companheiro, continuei com meu discurso:

- Breve, breve, retornarei às minhas travessias; passageiros, trabalhadores, parceiros precisam com urgência de meus serviços; mais alguns reparos em meu velho casco, uma repintura, um retoque no meu letreiro, e voltarei à ativa!

Mais tranquilo ainda do que antes e com voz suave e clara, o jovem, que parecia estar ali junto comigo embarcado, disse:

- Sei também disso, meu caro amigo!

Meu amigo? De onde me conheceria? Como sabia todas as coisas a meu respeito? Seria um de meus clientes de travessia que eu não estava reconhecendo?

Não suportando mais a curiosidade questionei novamente o meu mais novo amigo:

- Afinal, meu amigo, quem és e como sabes tantas coisas a meu respeito?

Com a voz mais suave ainda disse ser um velho conhecido e que eu já atravessara ele e sua Equipe inúmeras vezes, porém, no afã de minhas tarefas ele passara despercebido.

- Mas, e hoje, meu amigo – questionei-o com derradeira pergunta –, que fazes por aqui, em noite tão fria e perante minha temporária inutilidade? Por que não estás no regaço de tua família?

- Minha família és tu – respondeu-me com iluminado carinho. Depois de me teres servido com desvelo, hoje, amanhã e até que melhores, eu é que velarei para atravessares esta fase  de  temporária inutilidade!...

* * *

O socorro está mais perto do que imaginamos. Ele, porém, se torna mais evidente quando a inutilidade temporária nos toma conta e precisamos parar, retificar a máquina, reparar nosso casco, aplicar-lhe pintura nova!...

 
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita