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por Bruno Gomes Carvalho Pinto

 

Compreensão espírita da homoafetividade


“Eu sei, e estou certo no Senhor Jesus, que nada é de si mesmo imundo a não ser para aquele que assim o considera; para esse é imundo.” - 
Romanos 14:14.


O tema homossexualidade, que outrora era tabu, passou a ser discutido abertamente em diversas esferas, como religiosa, jurídica e médica. Diante disso, é natural questionar sobre a contribuição do Espiritismo para o entendimento desse assunto.

Em 2016, o Sumo Pontífice da Igreja Católica, o Papa Francisco, declarou que os gays e outras pessoas que a Igreja marginalizou no passado, como os pobres e explorados, mereciam um pedido de perdão[1].

O antropólogo Luiz Mott[2] explica que, ao longo de milênios, o Ocidente repetiu que o erotismo e o amor entre pessoas do mesmo sexo eram o mais “torpe, sujo e desonesto pecado”. As declarações do Papa Francisco constituem, portanto, significativo avanço na área religiosa.

Já no Oriente, em setembro de 2018, a Suprema Corte da Índia descriminalizou a homossexualidade e aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Até então, a homossexualidade poderia ser punida com a prisão perpétua pela legislação daquele país[3].

E no aspecto científico, o médico Andrei Moreira, presidente da Associação Médico-Espírita de Minas Gerais (AME – MG), esclarece que, em 1973, a Associação Americana de Psiquiatria deixou de considerar a homossexualidade uma doença, o que também foi feito pelo Conselho Federal de Psicologia, no Brasil, em 1985. A Organização Mundial de Saúde (OMS), por sua vez, excluiu a homossexualidade de sua lista de doenças mentais em 1990 e, no ano seguinte, a Anistia Internacional passou a considerar a violência contra homossexuais como uma violação aos direitos humanos[4].

Segundo a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, as evidências científicas indicam que a preferência sexual é determinada biologicamente durante a formação, ainda no útero, de determinadas regiões cerebrais, como hipotálamo. Houzel pondera, contudo, que o comportamento sexual não é explicado exclusivamente pela biologia porque o ser humano pode decidir o que fazer com sua preferência sexual[5].

Os fatos relatados até aqui indicam evolução gradual no respeito aos direitos dos homossexuais. Mas, para se conhecer a contribuição do Espiritismo sobre o tema, deve-se recorrer às obras de Allan Kardec e a publicações de médiuns sérios.

Na Revista Espírita, de janeiro de 1866, no artigo “As mulheres têm alma?”, Kardec aponta que a reencarnação é uma provável origem da condição homossexual[6].

Em consonância tanto com as assertivas de Kardec quanto com a Ciência, o Espírito Joanna de Ângelis ratifica que a homoafetividade não é uma doença, mas uma condição cuja origem é assinalada geneticamente, de forma que a produção hormonal seja compatível com as heranças espirituais do passado[7].

No livro Sexo e Consciência, Divaldo Franco aborda outros fatores que podem originar a homossexualidade, como o abuso na polaridade masculina ou feminina que impõe o retorno em polaridade inversa. Além do pretérito espiritual, o médium esclarece que a origem dessa orientação sexual pode estar na encarnação atual, como experimentações na adolescência e até obsessão espiritual[8].

Diante dos argumentos apresentados tanto pela Ciência quanto pelos Espíritos, verifica-se que as generalizações sobre as causas da homossexualidade são inadequadas. Cada estágio nessa condição tem uma gênese particular.  

 Tanto os cientistas quanto os autores espíritas pesquisados concordam que não devemos discriminar ninguém por causa da orientação sexual. A neurocientista Suzana Herculano-Houzel diz que, por ser a orientação sexual inata, tentar mudá-la é injusto, inútil e inviável[9].

O presidente da AME – MG, Andrei Moreira, assevera que os homossexuais devem ser acolhidos no meio espírita, tendo campo de trabalho e oportunidade de estudo, da mesma forma que os heterossexuais[10]. A opinião do Espírito Joanna de Ângelis sobre esse assunto é a de que o amor sempre definirá os rumos em favor do ser humano em qualquer circunstância[11].

Além disso, Jesus Cristo evidenciou, através de palavras e atitudes, que não compactua com discriminação. É o que se vê, por exemplo, na parábola do bom samaritano e no encontro de Jesus com a samaritana no poço de Jacó.

Conforme as Notícias Históricas, contidas na Introdução de O Evangelho segundo o Espiritismo, os samaritanos eram tidos como heréticos pelos ortodoxos e, portanto, perseguidos e desprezados. Na referida parábola, contudo, o Cristo coloca o samaritano, que age com amor ao próximo, acima do ortodoxo, que falta com a caridade[12]. E, ao falar com a samaritana no poço de Jacó[13], Jesus demonstrou seu respeito por alguém que era duplamente discriminada pela sociedade da época: por ser mulher e por ser samaritana.

Emmanuel, pela psicografia de Chico Xavier, também preconiza o tratamento digno a todos quando informa que a ocorrência da homossexualidade na comunidade humana é uma experiência natural, asseverando que homossexuais e heterossexuais merecem o mesmo respeito[14].

Outra importante contribuição de Emmanuel e de Chico Xavier para a compreensão desse assunto foi dada no programa Pinga Fogo, da extinta TV Tupi, em 1971:

“Se as potências do homem na visão, na audição, nos recursos imensos do cérebro (...) foram dadas ao homem para a educação, para o rendimento no bem, isto é, potências consagradas ao bem e à luz em nome de Deus, seria o sexo, em suas várias manifestações, sentenciado às trevas?” (Grifo nosso). [15]

Quando Chico concedeu essa entrevista, a homossexualidade ainda era classificada como doença pela ciência materialista, situação que só começou a mudar em 1973. Suas declarações, portanto, antecipavam o conhecimento científico vindouro. Fénelon assinala, em O Evangelho segundo o Espiritismo: “Como sabeis, cristãos, o coração e o amor devem marchar unidos à Ciência (...) A lei dos mundos é a lei do progresso”.[16]

Desse modo, como a caridade, a reencarnação, o progresso e a fé raciocinada são alguns dos pilares do Espiritismo, os ensinamentos dessa consoladora Doutrina nos levam a acolher fraternalmente os irmãos que estagiam na homoafetividade, sem os condenar nem discriminar, entendendo que essa orientação, assim como outras experiências de uma encarnação, contribuem para a evolução espiritual.

 


 

Referências:

 

[1] Deus o fez assim, diz papa a homem gay. Disponível emfolha Uol   Acesso em 9 de agosto de 2018.

 

[2] GUIMARÃES, Márcia. Relação de afeto e direitos: preconceito e violência contra homossexuais exigem criação de leis para proteger cidadãos. Psique Ciência & Vida, São Paulo, Editora Escala, ano 2, n. 16, 2007, p. 39 – 40.

 

[3] Índia descriminaliza homossexualidade em decisão histórica. Disponível em globo.com  Acesso em 22 de setembro de 2018.

 

[4] OLIVEIRA, Wanderley. Homossexualidade sob a ótica do Espírito imortal. Revista Cristã de Espiritismo, São Paulo, Ed. Minuano, ano 10, n. 86, 20--, p. 6 – 12.

 

[5] HOUZEL, Suzana Herculano. O cérebro homossexual. Mente & Cérebro, São Paulo, Ed. Duetto Editorial, ano XIV, n. 165, 2006, p. 46 – 51.

 

[6] KARDEC, Allan. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos. Ano 9, n. 1, p. 17 e 18, respectivamente, jan. 1866. Trad. Evandro Noleto Bezerra. FEB.


[7] FRANCO, Divaldo. Encontro com a paz e a saúde. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 3. ed. Salvador: Leal, 2007, cap. 8.


[8] FRANCO, Divaldo. Sexo e Consciência. Luiz Fernando Lopes (org.). 1. ed. Salvador: Leal, 2016, cap. 7.

 

[9] HOUZEL, Suzana Herculano. O cérebro homossexual. Mente & Cérebro, São Paulo, Ed. Duetto Editorial, ano XIV, n. 165, 2006. p. 46 – 51.

 

[10] OLIVEIRA, Wanderley. Homossexualidade sob a ótica do Espírito imortal. Revista Cristã de Espiritismo, São Paulo, Ed. Minuano, ano 10, n. 86, 20--. p. 6 – 12.

 

[11] FRANCO, Divaldo. Encontro com a paz e a saúde. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 3. ed. Salvador: Leal, 2007, cap. 8.


[12] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. imp. Brasília: FEB, 2013. Introdução, it. 3, p. 22 e 23; cap. 15, p. 201 e 202, respectivamente. 


[13] João 4: 1 – 30. Bíblia Online. Disponível em  biblia on-line Acesso em 22 de setembro de 2018.

 

[14] XAVIER, Francisco C. Vida e Sexo. Pelo Espírito Emmanuel. 27. Ed. 2. imp. Brasília: FEB, 2015. cap. 21.


[15] ______. Pinga-Fogo com Chico Xavier. Saulo Gomes (org.). Catanduva: InterVidas, 2010, cap.35, p. 106.

 

[16] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. imp. Brasília: FEB, 2013, cap. 1, it. A Nova Era. Pelo Espírito Fénelon, p. 43.   


Este artigo foi contemplado no concurso “A Doutrina Explica”, ocorrido em 2018, promovido na turma do Curso de Palestrantes Espíritas do Distrito Federal, na Federação Espírita do Distrito Federal (FEDF). O autor integra a equipe de trabalhadores do Centro Espírita Irmão Áureo.

 
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita