As células constituintes das muitas sociedades são as famílias, sendo patente o
desajustamento destas sociedades quando as famílias apresentam-se
desequilibradas; por outro lado, se as famílias estão mais bem ajustadas, os
seres coletivos constituídos por essas mesmas sociedades também fazem-se mais
harmônicos como um todo.
De modo semelhante, as células formadoras do movimento espírita, presença física
no seio das comunidades disseminando as práticas e ensinos da Doutrina dos
Imortais, são as Casas Espíritas, abrigando as “famílias espíritas”.
Estas agremiações, embora saibamos estarem os espíritas em níveis evolutivos
diversos, pois cada qual viveu as suas particulares experiências ao longo do
tempo de maneira única, deveriam possuir um modo de atuação, senão idêntico, ao
menos similar; afinal, os postulados espíritas são únicos, baseados nas obras
fundamentais e outras publicadas por Allan Kardec, sendo assim, não se justifica
inventar e criar conceitos práticos absolutamente novos, pois a Doutrina ainda
se está estabelecendo no mundo; então, como poderia já necessitar ajustes e
modificações substanciais em suas bases? Não faz sentido.
Contudo, observam-se condutas estranhas dentro do movimento, oriundas de desejos
pessoais dos seus praticantes, às vezes influenciados pela espiritualidade
inferior, desconsiderando estar o Espiritismo, como sabemos, ainda
consolidando-se, através de muitas lutas e desafios. Agindo assim, criam
novidades práticas que podem desvirtuar os objetivos verdadeiros do Espiritismo.
Considerando esta realidade, buscando alinhar alguns conceitos sobre o tema,
retirados apenas de uma das muitas literaturas confiáveis – Trilhas
da Libertação –,
listamos, na ordem em que foram surgindo nessa obra, algumas advertências
apontadas por Espíritos de considerável evolução sobre as finalidades de uma
Casa Espírita, unidade básica do movimento:
I - “Compreende-se o conceito que assevera: Onde
predomina o interesse pelo dinheiro escasseiam as austeridades morais,
particularmente onde deve viger a gratuidade dos serviços, desde que se derivem
da ação mediúnica. A Sociedade Espírita é lugar de iluminação da consciência, de
enobrecimento moral e ação caridosa, sem cujas vivências descaracteriza-se,
mundaniza-se e torna-se um clube onde predominam a insensatez, o engodo, a
exploração.”1
Esta orientação chama particularmente a atenção para a delicada questão do
dinheiro. Principalmente em relação à gratuidade das tarefas desempenhadas em
uma Casa Espírita. Jamais pode haver qualquer aceitação de bens materiais, sejam
eles quais forem em troca dos serviços prestados. Esta advertência foi feita,
pois o trabalho de Manoel Philomeno de Miranda, autor desta obra, se desenvolveu
em um Centro onde o principal médium recebia presentes pelos trabalhos de cura
realizados.
Podemos aproveitar esta lição e dilatar um pouco mais o conceito, lembrando não
ser de bom tom fazer propaganda aberta buscando-se dinheiro em uma Casa
Espírita, seja por qual razão for. Por conta disto, André Luiz asseverou2:
“Nas
reuniões doutrinárias, jamais angariar donativos por meio de coletas, peditórios
ou vendas de tômbolas, à vista dos inconvenientes que apresentam, de vez que
tais expedientes podem ser tomados à conta de pagamento por benefícios. A pureza
da prática da Doutrina Espírita deve ser preservada a todo o custo.”
Se a Casa precisa de dinheiro em situações especiais, além das despesas
corriqueiras, como sugestão, convoquem-se os antigos trabalhadores e dirigentes
e façam um mutirão onde cada qual poderia doar uma parte das necessidades,
proporcionalmente à situação financeira de cada um, porém, assim entendemos,
nunca colocar cartazes e avisos dando ciência das necessidades financeiras da
Casa; isso pode criar um entendimento errado nos frequentadores, que podem
ver-se obrigados a doar em troca dos possíveis benefícios obtidos na
Instituição.
Aproveitando ainda a recomendação de Manoel Philomeno quando comenta o perigo de
transformar-se a Casa em um clube, é sempre bom recordar: em clubes realizam-se
bingos, rifas e festas dançantes, jamais em Centros Espíritas.
II - “Certamente, a função da mediunidade não é
de promover curas, como arbitrariamente supõem e pretendem alguns
desconhecedores da missão do Espiritismo na Terra. Fossem eles vinculados à
Doutrina e seria incompreensível tal comportamento. Entretanto, em uma Sociedade
Espírita, a tarefa primacial é a de iluminação da consciência ante a realidade
da vida, seus fins, sua melhor maneira de agir, preparando os indivíduos para a
libertação do jugo da ignorância, a grande geradora de males incontáveis. Apesar
disso, o amor de Deus permite que nós também, os desencarnados, procuremos
auxiliar as criaturas humanas, quando enfermas, sem nos entregarmos à
injustificável competição com os médicos terrenos, fazendo crer que tudo
podemos...”3
Neste parágrafo comenta-se a questão das curas em Centros Espíritas, pois a Casa
visitada nesta obra atuava com um médium curador desorientado, juntamente com o
seu “guia”, devido à sua vaidade e invigilância. O Centro Espírita pode ser
visto, dentre outras formas, como um hospital, não há a menor dúvida, mas de almas,
e não de corpos físicos. É de notar na atualidade uma tendência em certas
Instituições privilegiando as alegadas curas físicas, em uma tentativa leviana
de aumentar o número de frequentadores. Anuncia-se uma palestra sobre a
possibilidade de curas e a Casa se enche de ávidos doentes buscando o
restabelecimento da debilitada saúde através de, quem sabe, possíveis milagres.
É fato, a humanidade esta doente, mas do Espírito, e este, enquanto estiver
adoecido moralmente, faz o corpo adoecer fisicamente, e não o contrário. Dessa
forma, a prioridade de uma Casa seria a de educar os doentes - todos nós -, para
aprender a não mais adoecer, livrando-se estes assim das suas muitas mazelas,
que nada mais representam do que respostas imediatas aos desatinos perpetrados
pelos Espíritos em função de condutas distanciadas dos princípios divinos na
presente existência, bem como nas anteriores.
Igualmente, valendo-se desta sábia diretriz, espera-se que Instituições
Espíritas não se transformem, brevemente, em consultórios psicológicos
mediúnicos, em uma tentativa vã de rivalizar com os profissionais da área em
questão. Não há nada contra o estudo da Série Psicológica de Joanna de Ângelis,
muito pelo contrário; esta pode e deve ser analisada em profundidade, pois são
obras que nos ensinam muito sobre psicologia, contudo, à luz do Espiritismo.
III - “Para o bem de todos nós, sugerimos que
ainda este mês retornemos aos trabalhos de origem que motivaram a criação da
nossa Instituição. Consideramos que a caridade das curas do corpo é de grande
relevância, mas o nosso compromisso é com a saúde espiritual das criaturas. O
nosso é o programa de iluminação das consciências, a fim de que nos não
divorciemos da atividade primeira, que é a transformação moral dos homens para
melhor, permanecendo nos socorros aos efeitos da inadvertência, da desordem e do
desrespeito às leis soberanas da vida.”4
Mais uma vez a sabedoria da espiritualidade esclarecida faz-se presente quando
sugere à Casa em questão o retorno às origens, quando não havia a preocupação
com curas de corpos materiais, destacando ser o compromisso da Doutrina com a
renovação das criaturas, ou seja, dos Espíritos, pois estes, renovados,
aprendendo verdadeiramente a praticar o orar
e vigiar pelo
estudo continuado das lições espíritas, poderão conduzir-se equilibrados nas
respectivas existências, sem deixar-se desanimar ou abater-se por possíveis
doenças-provas ou doenças-expiações. A prioridade de uma Instituição Espírita é
educar, e o melhor roteiro hoje existente para iluminar a mente do Espírito
imortal através das leis imutáveis de Deus encontra-se nas obras de Allan
Kardec.
IV - “Por tal razão, a Casa Espírita avança para
a condição de Educandário, fornecendo os contributos para o estudo e a análise
das criaturas, libertando-as das crendices e superstições, ao tempo em que lhes
oferece os recursos para a ação com liberdade sem medos, com responsabilidade
sem retentivas, perfeitamente lúcidas a respeito do destino que lhes está
reservado, ele próprio resultado das suas opções e atitudes. Uma sociedade que
se conduza fiel a esses conceitos e determinações torna-se justa, equânime e os
membros que a constituam serão, sem dúvida, felizes.”5
Percebe-se mais uma vez a preocupação dos Espíritos lúcidos em ratificar a
finalidade primordial de uma Casa Espírita: educar o ser imortal.
E
mais, se observarmos que a obra de que foram retiradas estas poucas citações
data de 1996, quando, segundo o entendimento da espiritualidade superior, a Casa
Espírita estaria avançando para a condição de um Educandário, não se compreende
como, passados mais de vinte anos, parte do movimento espírita, representado por
algumas Instituições, ainda assim insiste em transformar os Centros em
consultórios médicos!
Aos caros amigos de crença, hoje formando a grande família espírita, acreditamos
ser este um dos mais relevantes desafios a nos alcançar: manter as unidades
básicas do movimento, ou seja, as muitas Instituições divulgadoras da Doutrina,
pequenas células constituindo o tecido espírita nas diversas comunidades,
alinhadas hoje e sempre somente aos postulados e práticas apresentadas na
literatura verdadeiramente espírita.
Pela tarefa inadiável da educação, em seu sentido mais amplo, seguramente
poderemos levar adiante a mensagem extraordinária legada pelo trabalho
incansável do mestre lionês Allan Kardec.
Referências:
1 FRANCO,
Divaldo P. Trilhas
da Libertação.
Pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda. 9. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB,
1996. cap. 5 – O
médium Davi e o Dr. Hermannn Grass.
p. 50.
2 VIEIRA,
Waldo. Conduta
Espírita.
Pelo Espírito André Luiz. 13. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1987. cap. 11 – No
Templo.
3 ______.
______. cap. 6 – O
desafio.
p. 55.
4 ______.
______. cap. 8 – Serviços
de desobsessão.
p. 68.
5 ______.
______. cap. 8 – Serviços
de desobsessão.
p. 73.