Culto a
bobagens
Gilberto
Dimenstein,
63 anos,
jornalista
conceituado,
veio a
público
pela
primeira
vez após
iniciar-se
no
tratamento
de grave
câncer
de
pâncreas
com
metástases
ao
fígado,
dizendo:
Aquele
Gilberto
Dimenstein
de antes
do
câncer
morreu; câncer
é algo
que não
desejo
para
ninguém,
mas
desejo
para
todos a
profundidade
que você
ganha ao
se
deparar
com o
limite
da vida.
Não
queria
ter ido
embora
sem essa
experiência,
pois
grande
parte da
minha
vida foi
marcada
pelo
culto a
bobagens.
É como
se eu
estivesse
passando
por um
lugar
lindo em
um trem
em alta
velocidade:
vendo
tudo
borrado.
Com o
câncer
começaram
a
aparecer
coisas
incríveis,
as
relações
emocionais
se
sofisticam
– só
agora
descobri
a
profundidade
da
relação
homem/mulher;
a pessoa
do seu
lado o
tempo
todo.
Não
conhecia
essa
cumplicidade
nesse
nível.
Nós
vivemos
nos
meios
digitais
a era da
indelicadeza,
500 mil
pessoas
criticando.
Eu
acabei
entrando
no mundo
das
gentilezas.
Cada
pessoa
tem uma
palavra,
um chá,
uma
oração,
um olhar
gentil.
O outro
mundo
vai
ficando
ridículo![i]
A
experiência
da
doença
severa,
da dor e
da
proximidade
da morte
ativa em
nós
pensamentos
diferentes
sobre a
vida e
nos
sensibiliza
para uma
visão
diferente
das
coisas.
Bom
seria se
essas
visões
diferentes
do
habitual
se
instalassem
independentemente
da dor.
Jesus
propôs
isso e
grande
parte de
seus
ensinamentos
tinha
como
foco
direcionarmos
nossos
desejos
e nossas
perspectivas
para o
belo, o
bom, o
justo, o
solidário,
o sadio,
o ético:
“Buscai
primeiro
o reino
de
Deus...”[ii]
Simone
Weil, a
filósofa
cristã
francesa,
dizia
que nós
sofremos
certa
deformação
decorrente
de nossa
vida na
atmosfera
da
sociedade
contemporânea,
e até
nossas
aspirações
em prol
de uma
sociedade
melhor
trazem a
sua
marca.
Nossa
sociedade
está
atacada
de uma
mania
única: a
monomania
da
contabilidade.
Para ela
nada tem
valor se
não pode
ser
registrado
em
francos
e
centavos,
onde as
coisas
representam
o papel
dos
homens e
os
homens
representam
o papel
de
coisas.
Segundo
Simone,
o mal
essencial
da
humanidade
é a
substituição
dos fins
pelos
meios.
Considerava
os fins
como a
vida
humana
em sua
plenitude,
ou seja,
o ser
espiritual
e os
meios
como os
recursos
que
permitem
ao
indivíduo
desenvolver
a sua
espiritualidade:
o comer,
o beber,
o fazer
sexo,
comprar
o
necessário
à
sobrevivência,
possuir
o
essencial
à vida
etc.
Segundo
essa
filósofa
é essa
inversão
da
relação
entre o
meio e o
fim,
essa
loucura
fundamental,
que
explica
tudo o
que há
de
insensato
e triste
no curso
da
história.[iii]
Revivendo
Jesus, o
Espiritismo
nos
convoca
a
examinarmos
atentamente
o que
temos
cultuado
em nossa
vida.
Bobagens?
Tolices?
Futilidades?
Inconsequências?
Excessos?
Aguardar
o
câncer,
o
sofrimento
atroz ou
perdas
doídas
para
ativarmos
atitudes
de vida
saudável
e
produtiva
é
desnecessário.
Podemos
fazer
isso
agora!
[i] Folha de São Paulo, 31/12/19.
[iii] Simone Weil – A condição operária e outros estudos sobre a opressão - Ecléa Bosi.
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