Palestra espírita: 15 ou 30 minutos?
A questão que enseja este artigo foi levantada por uma
conhecida minha. Encontramo-nos casualmente e lhe
perguntei se continuava frequentando a Casa X onde nos
conhecemos no passado não tão distante. Ela é professora
de destacado colégio em São Paulo. Portanto, conhece,
certamente muito bem todos os macetes da pedagogia
moderna. Aliás, segundo os meus modestos conhecimentos a
respeito, lecionar para adolescentes e jovens constitui
uma das mais desafiadoras tarefas da atualidade.
Afinal, esse grupo etário é altamente inquieto, e, assim
sendo, são acostumados a agir consoante o que lhes “dá
na telha”, como prescreve o já não tão famoso dito
popular. Cumpre reconhecer que nem sempre recebem a
adequada educação familiar. Por essa razão, são
crescentes as manifestações de violência contra os
docentes no país. Em alguns casos, os próprios pais
tomam as dores dos seus filhos perversos e irrompem
sobre os(as) pobres educadores(as).
A propósito, para entretê-los nas salas de aula, uma
gama considerável de métodos de ensino foi recentemente
criada - quase todos no exterior - tais como adaptative
learning, blended learning, byod, coding, gamification,
makerspace, project-based learning, soft skills, só
para citar alguns. Ou seja, na atualidade tem-se como
essencial a criação do elemento lúdico em sala de aula
para atrair a atenção do alunado (sim, leitor, os jovens
e adultos modernos têm grande dificuldade de
concentração em aulas expositivas). Não é por outra
razão que a função de professor está aparentemente se
transformando para facilitador do conhecimento. Não vou
entrar no cerne das propostas acima, pois fogem ao
objetivo do texto. É inegável que elas têm a sua
importância no desenvolvimento do aprendizado. Mas há
também que se reconhecer que certas disciplinas não se
encaixam nessas técnicas. A natureza do assunto, o
escopo da matéria, a profundidade dos temas, enfim,
podem não se coadunar com tal maneira de ensinar. Esse é
o caso do Espiritismo.
A referida colega admitiu que não conseguia ir mais ao
Centro. Surpreso com a revelação, sutilmente lhe “dei
corda”... Ela rapidamente contou-me que ia lá, mas a
cabeça estava em outro lugar (em casa, segundo ela, e o
dever de dar a janta à filha e de se preparar para o dia
seguinte). Confessou-me, em dado momento, que achava as
preces muito demoradas, bem como as palestras... A sua
opinião era similar à de um conhecido seu da Federação
Espírita do Estado de São Paulo, que advogava no máximo
15 minutos de exposição, pois daí pra frente “a mente se
perde”. Lembrou as pessoas que ficavam dormindo na
audiência (fez-me recordar de uma engraçada passagem
narrada pelo médium Divaldo Pereira Franco). Queria
explorar ainda mais a sua opinião, mas como ela estava
atrasada não foi possível avançar. Todavia, consegui
arrancar-lhe as razões da ausência daquela Casa
Espírita. “Prefiro fazer em casa com a oração”,
disse-me, por fim.
Fiquei a imaginar se todos pensariam assim. Concluí que
seria pouco provável, já que a unanimidade é algo muito
rara de se alcançar em qualquer esfera. Ponderei o que
achariam os expositores que se empenham em trazer um
rico conteúdo aos frequentadores, bem como exemplos
concretos. Pensei, enfim, na espiritualidade que tanto
se esforça para nos ajudar com a luz do esclarecimento e
inspiração. Lembrei-me, por fim, de Allan Kardec e a sua
frase lapidar contida em O Evangelho segundo o
Espiritismo: “Espíritas! Amai-vos, este o primeiro
ensinamento; instruí-vos, este o segundo”.
Ora, sabemos perfeitamente bem que a leitura não é uma
prioridade para a maioria das pessoas. Ademais, hoje ela
disputa o tempo de lazer dos indivíduos com uma série de
outros hábitos tais como redes sociais, jogos
eletrônicos, a ida aos barzinhos depois do expediente,
conversas pelo WhatsApp, Netflix e assim por diante. Em
todo caso, a instrução (conhecimento e assimilação de
conteúdo) pressupõe dedicação. As palestras nas Casas
Espíritas são indubitavelmente fonte de aprendizado,
desde que haja um mínimo de disposição de nossa parte em
ouvir, de fato. Como ensina o Evangelho: “Se
alguém tem ouvidos para ouvir, ouça” (Marcos
4: 23).
Para que não pairasse qualquer dúvida a respeito, Kardec
também destacou na introdução d’O Livro dos Espíritos que
“... estudos requerem atenção demorada, observação
profunda e, sobretudo, como aliás o exigem todas as
ciências humanas, continuidade e perseverança”.
Desse modo incontestável, o indivíduo só avançará na
agenda do Espírito se houver sincero empenho de sua
parte. É verdade que, às vezes, o expositor pode não
estar muito inspirado ou o tema não ser do nosso agrado
pessoal. Todavia, se vamos a uma missa ou a um outro
culto religioso somos impelidos a prestar atenção no
orador – até por uma questão de respeito. Tal
procedimento não é diferente no Espiritismo.
Se algo desejamos aprender concernente à nossa condição
espiritual, é preciso um mínimo de esforço, não importa
se a Casa Espírita adote o padrão de 15 ou 30 minutos de
palestra construtiva. O que realmente conta é a nossa
boa vontade em ouvir aquilo que precisamos lá no cerne
da nossa alma. Se fizermos a nossa parte, alguma coisa
na exposição certamente será proveitosa para nós.
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