Relações
artificiais
Para evoluir, o ser humano foi chamado a viver no mundo
em sociedade(1), e seu isolamento social e
cultural, desde que voluntário, reflete apenas o ato
egoísta de pensar só em si mesmo e uma pretensa
superioridade sobre os outros.
“O meio natural de evolução – diz Herculano Pires –,
para o homem e para todas as coisas e todos os seres, é
a relação.”(2)
“O homem deve progredir, mas sozinho não o pode fazer
porque não possui todas as faculdades: precisa do
contato dos outros homens. No isolamento, ele se
embrutece e se estiola.”(3)
A experiência que faz amadurecer a alma flui mais
autêntica e eficiente nas relações interpessoais. O
homem precisa do homem. Em matéria de aprender sentimento
nada substitui o contato direto, o calor da palavra, a
permuta de energia e conhecimento entre as pessoas nas
relações objetivas da vida material.
Porém, as circunstâncias do desenvolvimento do mundo
atual têm feito as pessoas buscarem alternativas de
convivência que acabam se opondo aos seus verdadeiros
interesses naturais. A violência e o medo na vida
moderna (mas não só isso) estão afastando cada vez mais
umas das outras, forçando-as a se relacionarem por vias
artificiais.
Cercadas por grades e sistemas de segurança, fechadas em
seus condomínios, apartamentos e escritórios, é possível
que se sintam mais seguras para se entregarem ao “faz de
conta” das redes sociais e às facilidades tecnológicas,
mas não percebem que esse distanciamento aumenta o mal
social.
O vai e vem condicionado e restritivo dos shoppings, o
confinamento dos membros da família, cada um no seu
cômodo, os incontáveis guetos religiosos que se isolam
em pequenos (ou grandes) rebanhos que não se afinam uns
com os outros, tudo isso concorre para que as pessoas se
afastem da vida real.
As diferenças e atritos em nosso mundo decorrem (também)
da heterogeneidade de condição dos homens. Seus
problemas pessoais e de relacionamento do passado e do
presente precisam ser resolvidos na Terra e não num
mundo imaginário. Isolando-se, não encontrarão
parâmetros, portanto ficarão sem muitas respostas. O
processo de crescimento é em boa medida individual, mas,
sem referências práticas externas, a experiência humana
será pobre e limitada.
A espiritualização do homem, que passa antes pela sua
humanização no plano da matéria, requer compatibilidade
entre suas ações e o seu desejo de liberdade e
plenitude, que muitos chamam de felicidade. Isso ele
conseguirá vivendo entre os homens, procurando aprender,
acertar e influir positivamente.
É preciso pensar que, se o homem, por força da Lei de
Deus, assume o compromisso de reencarnar na Terra,
estará aceitando tacitamente sua meta principal aqui:
evoluir. Precisará da diversidade humana como forma de
ganhar experiência e garantir a sua formação como
indivíduo. A diversidade servirá de matéria de análise
sobre como melhor agir nesse mundo, sobre o que aceitar
e o que evitar.
Em consequência, conclui-se: assim como não dá para “se
jogar no mundo”, não dá também para se encastelar no
egoísmo individual ou de grupo.
O mundo atual, passível de progresso, não pode
prescindir da colaboração de todos e de cada um em
particular. Talvez precisemos retomar algumas práticas
antigas no campo da convivência, abandonadas pela
ansiedade do futuro, e implementá-las com amor e
fraternidade: as reuniões em família, as visitas, as
conversas, o abraço, a gentileza e os pequenos favores,
os elogios, as “lembrancinhas”... Não se trata de voltar
ao passado, mas de enriquecer o presente com emoções
duráveis. Creio que isso fará bem a todos.
Referências:
(1) O
Livro dos Espíritos,
Allan Kardec, questão 766, LAKE.
(2) Agonia
das Religiões,
J. Herculano Pires, Paidéia, 1.976.
(3) O
Livro dos Espíritos, Allan
Kardec, questão 768, LAKE.
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