Eu adoro os pobres!
Eu adoro os pobres! Digo isso com o peito aberto de
satisfação. E com conhecimento de causa. Afinal, sou
filho, neto e sobrinho de operários. Meus avós paternos
eu não conheci. Meus avós maternos sim. E muito bem!
Ambos eram tecelões, o mesmo destino que tiveram minha
mãe e a maioria dos meus tios. Cresci frequentando a
casa dos meus avós, uma casa de vila operária. Neste
local, eu brincava com descendentes de alemães,
africanos, italianos... Todos filhos e/ou netos de
operários, assim como eu.
Foi nesse caldo de vida simples e batalhadora que fui
criado. Sempre estudei em escola pública, meus pais
moravam de aluguel e só foram ter casa própria quando eu
tinha 21 anos. Mesmo assim, financiada. Fui o primeiro
da família a falar idiomas e ter curso superior, sempre
frequentei ambientes de gente rica, tenho amigos ricos
que gostam muito de mim, sou tido como inteligente,
culto, articulado, bem informado, circulo com
desenvoltura pelos mais variados ambientes, inclusive os
luxuosos... No entanto, nunca perdi de vista o ambiente
simples em que fui criado. E como cursei duas faculdades
na área de humanas, agucei ainda mais o meu pendor para
a questão da justiça social, saúde e educação de
qualidade para todos, informação imparcial acessível a
todo mundo etc.
Fora isso, o Espiritismo, religião da família de minha
mãe que adotei como filosofia de vida, fez a grande
caridade de apurar meu senso de justiça social e de
olhar os pobres, simples e oprimidos, com os olhos do
coração. Tive a sorte de ter sido evangelizado e
conduzido por gente lúcida, sensível e com trajetórias
semelhantes à minha. Para completar, a maioria dos meus
companheiros de mocidade espírita e de encontros
estaduais de juventude pensa como eu. Por isso, doutrina
espírita, para mim, sempre foi e sempre será uma
proposta seríssima de revolução social à luz da
imortalidade da alma e do amor ao próximo.
Tenho o hábito de tratar com humanidade e simpatia
moradores de rua, vendedores de bala, pedintes etc. Já
abracei alguns, fiz carinho no rosto, tratei sem medo
eventuais suspeitos que de suspeitos nada tinham e
ganhei a amizade deles... Devo isso à minha família e à
minha formação religiosa e acadêmica.
Certa vez, levei minha mãe para visitar um amigo morador
da Zona Sul carioca. Ele enviuvara e estava morando com
a filha, também amiga de minha mãe. Depois de um período
de prosa, fomos os quatro almoçar num restaurante
próximo. À saída, uma senhora socialmente carente nos
abordou. Estava com uma receita na mão e pediu dinheiro
para comprar o remédio. Era visível a aflição dela.
Talvez estivesse sentindo a dor que o medicamento iria
aplacar. Os amigos de minha mãe ignoraram solenemente a
mulher. Eu e minha mãe é que demos atenção a ela,
conversamos, ouvimos seu relato e providenciamos o
montante para a compra do remédio enquanto os amigos
arrogantes de minha mãe aguardavam no carro. Fiquei
indignado com aquilo. Ao final do dia, já em Petrópolis,
eu e minha mãe lamentamos com nossos familiares sobre a
falta de sensibilidade de pai e filha. Como eles, há
muitos, infelizmente.
Eu sonho com um mundo pleno de oportunidades para todos!
Isso se chama espiritualizar a matéria. Vamos evoluindo
e descobrindo a cura para doenças, melhorando o
transporte e a moradia, aperfeiçoando a educação e a
saúde, dando o ensejo de progresso material e espiritual
a todos... Ricos e pobres sempre haverá, creio. Mas
poucos com tanto e muitos sem nada tendem a desaparecer.
Afinal, todos merecem ter oportunidades para estudar e
prosperar.
Os pobres, como eles são fortes e dignos! Como admiro a
coragem que eles possuem de, todos os dias, enfrentar o
transporte público, ganhar pouco, viver com o orçamento
apertado e, mesmo assim, seguir em frente, com garra e
bom humor. Talvez seja por isso que uma das minhas
músicas preferidas seja “Gente Humilde”, magistral
composição de Chico Buarque, Vinícius de Morais e
Garoto. A turma do subúrbio, o povo que anda de trem, as
casas simples com cadeiras na calçada, as festas de
aniversário com bolo e guaraná, a hospitalidade pra lá
de acolhedora... Só quem entra numa casa simples e come
uma comida caseira feita com carinho pode entender! Eu
entendo, graças a Deus!
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