Artigos

por Leda Maria Flaborea

 

A cada um seu cuidado


“Levanta-te direto sobre teus pés.”
 - Paulo (Atos, 14:10)


No livro Caminho, Verdade e Vida, lição 79, Emmanuel, estimado benfeitor espiritual, através da bendita psicografia de Francisco Cândido Xavier, inicia o texto dizendo: “De modo geral, quando encarnados no mundo físico, apenas enxergamos os aleijados do corpo, os que perderam o equilíbrio corporal, os que se arrastam penosamente no solo, suportando escabrosos defeitos... Não possuímos suficiente visão para identificar os doentes do espírito, os coxos do pensamento, os aniquilados de coração”.

A esmagadora maioria de pessoas constitui-se de almas doentes que desconhecem a necessidade da saúde espiritual para, junto com a saúde do corpo, harmonizar-se com tudo que as cerca. Isso se chama, segundo alguns instrutores espirituais, saúde integral.

Não há ainda, para o homem comum, a consciência de que tanto o corpo quanto o espírito têm necessidades indiscutíveis. Enquanto a criatura permanece no corpo material, é natural que se preocupe com o problema da própria manutenção.

Na questão 718, de O Livro dos Espíritos, Kardec pergunta aos Espíritos superiores: “A Lei de Conservação obriga a prover as necessidades do corpo?” E os benfeitores espirituais respondem que sim, porque sem a força e a saúde o trabalho seria impossível. Vivendo, pois, uma vida material, é necessário cuidar dela, seja no âmbito do próprio corpo, seja na vida de relação que estabelece com os demais seres.

O problema não está nessa necessidade natural, mas na maneira como entendemos isso, entendimento esse que nos coloca sob a força das leis divinas, que tudo harmonizam no Universo. Nisso reside, então, o conceito de que cada escolha que fazemos está sujeita às consequências que a presidem, isto vale, também, para as questões do Espírito que necessita de manutenção e cuidados.

Do ponto de vista do Espírito, o corpo é uma prisão da qual ele necessita para viver experiências planetárias, em cumprimento evolutivo que lhe norteia a existência. Em última análise, esse corpo é sua casa.

Não sem razão, André Luiz, amoroso benfeitor espiritual, lembra: “cada dia é novo ensejo para adquirirmos enfermidades ou curar nossos males. O melhor remédio, antes de qualquer outro, é a vontade sadia, porque a vontade débil enfraquece a imaginação e a imaginação doentia debilita o corpo. Doença do corpo pode criar doença da alma, e doença da alma pode acarretar doença do corpo. ¹ Portanto, nossa obrigação é cuidar dele com respeito, o que vale dizer que todo aquele que acreditar que, maltratando o corpo, purifica a alma, comete ação contra o patrimônio divino”. ²

Por que o corpo é patrimônio divino? Muitos dizem: “esse corpo é meu e faço o que quiser com ele”. Será que ele pertence verdadeiramente a nós? Somos Espíritos criados imortais, usando um corpo como instrumento para experiências evolutivas. Então, quem diz que o corpo é seu, pressupõe que ele pertença ao Espírito. Se assim é, por que esse aparelho físico não o acompanha quando se liberta e vai para o plano espiritual?  

Sabemos que isso não acontece, temos consciência de que a matéria fica e o Espírito segue sozinho. Então, reafirmamos a questão: a quem pertence o corpo? Podemos responder, sem medo de errar, que ele é patrimônio divino, emprestado ao Espírito para que, através dele, possa se manifestar no mundo ao qual foi chamado a viver. E por ser emprestado é que precisamos zelar por ele.

O que significa, diante dessa afirmação, cuidar do corpo? Recorramos a Kardec. Em O Livro dos Espíritos, questão 719, o Codificador pergunta aos Espíritos superiores: “É repreensível ao homem procurar o bem-estar?” A resposta é clara: “O bem-estar é um desejo natural. Deus não proíbe senão o abuso, porque o abuso é contrário à conservação. Ele não incrimina a procura do bem-estar, se esse bem-estar não é adquirido às custas de ninguém e se não deve enfraquecer, nem as vossas forças morais, nem vossas forças físicas.

Podemos pensar, então, que cuidar do corpo significa nutri-lo, proporcionando-lhe bem-estar através da higiene, exercícios físicos e alimentação adequada – tudo isso sem exageros –, evitando os vícios – não importa quais sejam eles – que, lentamente, vão destruindo o que está sob nossa responsabilidade. Nosso corpo físico é um conjunto de órgãos vivos com necessidades peculiares, e ignorar essas necessidades é ignorar as leis da Natureza.

Ideias errôneas, que ainda hoje permeiam nossa existência – muitos povos as cultuam –, são levadas a extremos, constituindo-se em obstáculos ao caminhar evolutivo. De um lado, temos os que acreditam que maltratando o corpo purifica-se o Espírito; de outro, os que não acreditando que exista o Espírito, ou mesmo aceitando a ideia de sua existência, não o valorizam, cuidando apenas de cultuar o corpo. Extremos que se chocam e que acabam praticando violências recíprocas. Entre esses dois extremos, há uma multidão de criaturas preguiçosas e indolentes em relação ao corpo. Encontramos também aqueles que não se interessam em fortificar o Espírito com valores morais. É necessário compreender que ambos estão ligados entre si e que os excessos de um trazem consequências para o outro. ³

Dessa forma, quando nossa atenção está voltada para o fortalecimento dos músculos, esquecemo-nos de dar força ao Espírito, preparando-o para enfrentar os problemas do dia a dia. Se, de um lado, nossa atenção se concentra somente nas coisas do Espírito, não nos damos conta de que precisamos viver as coisas do mundo. Caso contrário, não progrediremos e não faremos progredir o que está ao nosso redor. É tolice ignorar que assim evitaremos as tentações, pois é na luta contra elas que nos tornamos mais fortes. A verdade é que, em ambas as situações, deixamos de cumprir as Leis do Trabalho e do Progresso, dadas a nós, por Deus, para nossa evolução.

O que fazer, então? O equilíbrio é sempre o melhor caminho! Tanto o corpo físico quanto o Espírito possuem necessidades particulares, que precisam e devem ser atendidas, pois elas se complementam. Buscar esse equilíbrio com calma, respeito e dignidade é nossa tarefa planetária, objetivando crescimento e evolução em todos os setores da vida, é sem dúvida alguma uma tarefa individual, porque cada um de nós será responsável pelas escolhas que quiser. É interessante destacar que nada fazer é, também, uma escolha, e arcaremos com as consequências advindas dela.

É bom não esquecer, também, que vigilância espiritual não exclui previdência material e vice-versa. É necessário ter prudência no que armazenamos na matéria ou no campo do Espírito – sentimentos menos edificantes são grandes entraves ao nosso progresso –, porque ainda não conseguimos viver plenamente os ensinamentos de Jesus. Torna-se fácil compreender, sob esse foco, o porquê do alerta evangélico do “vigiai para não cairdes em tentação”.

De tudo o que foi dito conclui-se, portanto, que a missão do Evangelho no mundo é muito maior e mais bela do que aquela que possamos imaginar. Jesus, médico das almas, ainda permanece derramando sobre todos nós as bênçãos do Seu amor. A cura do nosso Espírito doente é mais importante que a cura do corpo, pois é perene... Viajaremos no tempo com outros corpos físicos saudáveis ou não, mas o Espírito será o mesmo. Se ele estiver saudável a viagem será amena e feliz. Para isso, faz-se necessário aguçarmos os ouvidos guardando as palavras do Mestre, através dos ensinamentos que Seus apóstolos deixaram para todas as gerações.

É imprescindível nos erguermos sobre nossos pés, individualmente, sem a ilusão de já termos asas de anjos que ainda não merecemos. Ergamo-nos do chão frio da inércia para o calor do movimento construtivo, elevando-nos do vale da indecisão para a montanha do serviço edificante. Só assim conseguiremos fugir da treva, penetrando na luz. Só assim conquistaremos a reconstrução dos próprios ideais.

Se é verdade que estamos empenhados em nossos soerguimentos, como tantas vezes afirmamos, coloquemo-nos de pé, afastando-nos de vez de situações que dizemos querer abandonar. Aperfeiçoamento pede esforço, pois ninguém progride sem renovar-se. Desejamos um novo horizonte em nossas vidas? Isso é justo. Mas, para consegui-lo precisamos nos elevar. Se aspiramos uma vida superior é preciso caminhar para frente, balizados pelos ensinamentos de Jesus.

Emmanuel deixa claro para todos nós, pela bendita mediunidade de Francisco Cândido Xavier, no livro Fonte Viva, lição 141, palavras de otimismo que nos convidam: “sê otimista e diligente no bem, entre a confiança e a alegria, porque enquanto o envoltório de carne se corrompe pouco a pouco, a alma imperecível se renova de momento a momento, para a vida imortal”.

Nosso tempo é agora, e hoje é o dia que nos compete fazer o que deve ser feito em nosso benefício. O amanhã? Bem... esse é desígnio divino.

 

Bibliografia:

1 – XAVIER, F. C. e Waldo VIEIRA. O Espírito da Verdade (Espíritos diversos). 10ª edição. Rio de Janeiro/RJ, lição 32, 1997.

2 – KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, questões 718 a 727.

3 – KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo – capítulo V, item 26 e capítulo 17, item 11.  
 


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita