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por Flávio Bastos do Nascimento

 

Carta a um amigo ante a pandemia

 
O questionamento formulado por meio de aplicativo de telefonia móvel resultou na seguinte carta a um amigo diante da pandemia:

“Amigo, como é que a filosofia espírita enxerga e trata este momento que estamos vivendo? Pergunto porque no meio de tanto bombardeio de regras e interesses estou buscando uma forma mais tranquila e equilibrada de lidar com isto”.

Meu caro amigo, fico feliz que você esteja buscando na Doutrina dos Espíritos os esclarecimentos necessários à nossa vida, porque ela é todo um manancial que nos dessedenta, nos conforta, nos explica a razão dos sofrimentos e nos estimula a prosseguir caminhando.

Tem razão quando diz que estamos sendo bombardeados com informações por todos os lados, muitas vezes desencontradas; o momento pede calma e equilíbrio, sem sombra de dúvida, quando notamos que os próprios especialistas da área da saúde, pesquisadores e cientistas de longa data, muita vez, ainda estão tentando se entender.

Neste ponto, é interessante regrarmos o acesso aos noticiários, porque sabemos que há muito interesse em alarmar, em chocar, ao lado daqueles que desejam realmente informar. Saibamos filtrar o que nos chega.

Logo de início, aprendemos em Espiritismo que a morte não existe, não no sentido em que é retratada, como o fim de tudo, o rompimento de todos os laços afetivos, a destruição sem remédio. Ao longo dos tempos, não poucos artistas a representaram como uma dama cadavérica, trajada de preto e encapuzada, tendo numa das mãos esqueléticas uma foice, pronta a cortar o fio da vida. Prefiro a expressão do santificado Francisco de Assis, que a chamou, carinhosamente, “irmã morte”!

O túmulo configura a porta de saída do cenário terrestre, assim como o berço é a porta de entrada; tenhamos em mente o sonho de Jacó, na Bíblia, onde ele visualizou uma imensa escadaria, ligando a Terra ao céu, com uma movimentação intensa de pessoas, umas subindo, outras descendo. Ali está figurado, na simbologia onírica, o transitar incessante das almas que chegam e das que partem do plano espiritual – todos os dias – para nós, espíritas, umas estão reencarnando, ou seja, retornando ao plano de matéria mais densa e outras estão desencarnando, isto é, voltando à dimensão extrafísica, de onde viemos e para onde nos dirigimos, sendo que a marca principal daqui é a impermanência e a de lá, a perenidade.

Quantas pessoas renascem no planeta, todos os dias? Milhares, centenas de milhares e outras tantas desencarnam, diariamente. Disso, da fatalidade da partida, todos temos a certeza e, mesmo assim, guardamos a tendência de fugir do assunto, muitos nem sequer mencionam a morte, não querem saber, como a criança que tapa os próprios olhos e acredita, assim, que os outros não a podem mais enxergar.

Aqui vale conferirmos O Livro dos Espíritos, na pergunta de n. 728, com a qual Allan Kardec inaugura o capítulo da Lei de Destruição, como uma das Leis Divinas (ou Naturais). Os imortais superiores responderam que “Preciso é que tudo se destrua para renascer e regenerar. Porque, o que chamais destruição, não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e melhoria dos seres vivos”. (grifei)

Meu irmão, estamos vivenciando na Terra os dias da grande transição planetária, em que sairemos de um orbe de provas e de expiações para um patamar de regeneração. De um mundo onde o mal ainda prepondera no íntimo das criaturas humanas, para um estágio em que exista um equilíbrio entre as forças do mal e do bem, da luz e da sombra. É um processo longo e demorado, que se estenderá ainda por muito tempo, no qual muitos são convocados ao retorno repentino para o lado de lá, de onde retornarão, com a mentalidade renovada, auxiliando no progresso geral.

Ocorre que quando enrolamos demais na jornada evolutiva, a Providência Divina nos chama à realidade, nos forçando a avançar. Recordemos que o Mestre Jesus, enviado pela Divindade a nos servir de Caminho para a Verdade e para a Vida, há mais de dois mil anos, baseou toda a Boa Nova no Amor, a Deus, a nós mesmos e a todas as outras pessoas, no entanto, ainda vacilamos, hesitantes, em exercitar tal forma de amar.

Se nos decidíssemos, verdadeiramente, a trilhar pelos caminhos do amor, a dor não nos visitaria com tanta frequência.

Ainda em O Livro dos Espíritos, na questão de n. 737 e nas seguintes, o Codificador trata dos “Flagelos destruidores”, e compreendemos que esses grandes choques, como os que agora sentimos, em virtude da pandemia, funcionam como a estocada que faz o gado avançar. Porque estávamos acomodados, displicentes, fez-se necessário o solavanco.

Notemos que nos encontrávamos à beira de um conflito nuclear, em que os E.U.A. flertavam com a morte brusca de milhões, ora com a Coreia do Norte, ora com países do Oriente Médio e dali viesse, talvez, a impossibilidade de continuação da vida humana sobre a Terra, porque outras superpotências poderiam entrar em guerra, cada uma defendendo os seus aliados. Agora, com a epidemia de coronavírus espalhada no globo, ao menos por enquanto, as atenções se voltaram para a pesquisa de remédios, tratamentos e esforços dirigidos à busca da vacina, em consórcios científicos internacionais.

Equipes de Fórmula 1 estão desenvolvendo aparelhos de ventilação mecânica mais eficientes, fábricas de automóveis se reconfiguraram para atenderem à demanda por tais equipamentos e grupos de jovens empreendedores, aqui no Brasil e em todo o mundo, desdobram esforços para encontrarem meios de produzirem respiradores artificiais mais baratos.

Ao menos por agora, nos damos conta que Deus nos concede ar puro todos os dias, o qual poluímos, e não nos cobra nada pelos litros e litros de oxigênio com que inflamos e desinflamos nossos pulmões, a cada inspiração e exalação, conduzindo os recursos necessários ao campo celular.

Da mesma forma o Pai Eterno faz com a água, a luz solar e todos os demais recursos dos quais dispomos, à vontade, para a manutenção da nossa saúde, entretanto, preferimos valorizar em demasia simples instrumento de troca, o dinheiro, em detrimento das riquezas verdadeiras, as quais desprezamos. Em geral, na vida em sociedade, optamos pelas coisas, ao invés das pessoas, chegando a confundir estas com aquelas, nos relacionando por interesse, em vez de buscarmos enxergar a essência dos outros seres humanos, na corrida consumista desenfreada, nos consumindo, ao mesmo tempo em que exaurimos os recursos naturais.

Sob a aparência da normalidade, nos esquecemos da finitude, que marca a nossa condição humana. O vírus nos fez lembrar que temos um prazo de validade e, portanto, devemos valorizar ao máximo cada minuto, cada hora, cada dia, porque, afinal, não sabemos exatamente quando soará o momento da partida. Aliás, o grau de letalidade da nova síndrome é baixo, se comparado a outras doenças infecciosas, sem falar de outras causas: para ficarmos em apenas um exemplo, dados da Organização Pan-americana de Saúde – OPAS, vinculada à OMS, de fevereiro de 2019, dão conta que a cada ano, a vida de aproximadamente 1,35 milhão de pessoas é interrompida devido a um acidente de trânsito.

Quantos irmãos e irmãs nossos, todos eles também filhos de Deus, sofrem a fome todos os dias, sob o peso da miséria em que são relegados?

Em um país de recursos variados como o Brasil, não deveria haver ninguém residindo em favelas, nem no meio das ruas, ao deus-dará; tudo isso é fruto do nosso egoísmo, que prefere fazer de conta que não é conosco, já que não nos atinge. Porém, o surto pandêmico nos chamou a atenção para o fato que vivemos em relações interdependentes, que necessitamos do agricultor, da faxineira e do entregador de pizza, assim como do médico, do bombeiro e do juiz de direito.

Esta que atravessamos, como todas as crises, revelam o melhor e o pior que carregamos no íntimo. Saibamos cultivar o bem, renovando o mal que ainda existe em nós.

No mais, meu amigo, sigamos com as nossas vidas, agora mais alertas, procurando usufruir da “vida em abundância” que nos oferece Jesus de Nazaré, cientes de que somos Espíritos imortais, só o corpo de carne é perecível.

Como afirmou a mensageira de Nossa Senhora, Maria de Nazaré, a Chico Xavier: “Isso também passa”. Também essa fase de surto pandêmico passará; aproveitemos para nos renovar, em espírito, demonstrando em atos a gratidão a Deus, mais à frente, quando voltarmos a usufruir da liberdade que tanto menosprezamos.

Fica aqui o desejo sincero de podermos nos abraçar, mais adiante.

Segue trecho do Caderno de Mensagens, capítulo 7, “Entrevistando André Luiz”, com esta resposta psicografada pelo inesquecível médium mineiro, para nossa reflexão:

32. Se a ciência humana se servir de seus recursos, pondo em risco a estabilidade do Planeta, é de se esperar esteja a Humanidade da Terra sujeita a uma intervenção direta da parte de outros planetas?

 “Nossa confiança na Sabedoria da Providência Divina deve ser completa. Ainda mesmo que a Terra se desintegrasse numa catástrofe de natureza cósmica, Deus e a Vida não deixariam de existir. Uma cidade arrasada num cataclismo não significa a destruição de um povo inteiro. Justo que, em nos considerando coletivamente, temos feito por merecer longas aflições e duras provas na Terra, entretanto, diante da Infinita Bondade, devemos afastar quaisquer ideias sinistras da cabeça popular, carecedora de harmonia e esperança para evoluir e servir. Amemo-nos uns aos outros. Realizemos o melhor ao nosso alcance. Convençamo-nos de que o bem vive para o mal como a luz para a sombra. Edifiquemos o mundo melhor, começando em nós mesmos, e confiemos na palavra fiel do Cristo que prometeu amparar-nos e auxiliar-nos ‘até o fim dos séculos’. E assim nos exprimindo, não nos propomos afirmar que, a pretexto de contar com Jesus, podemos andar irresponsáveis ou desatentos. Não. Forçoso trabalhar e cumprir as obrigações que a vida nos trace, a fim de sermos amparados e auxiliados por ele, sejam quais forem as circunstâncias.”


  

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita