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por Anselmo Ferreira Vasconcelos

 

Para onde estamos lançando as nossas “redes”?

 
O momento presente para nós, Espíritos encarnados, é de extrema importância devido aos esforços empreendidos pelo mundo maior no sentido de separar “o joio do trigo”. As mensagens do além-túmulo têm sido contundentes a respeito da gravidade da hora em curso. Com efeito, o planeta está sob intenso ataque das falanges do mal, basta observarmos as dificuldades de implantação de ideias benignas em praticamente todos os quadrantes. Protestos, discursos inflamados (nem sempre fundamentados no bom senso), escaramuças em vias públicas e, acima de tudo, desrespeito, abundam no planeta. As evidências diuturnas indicam que a civilização humana vive um delicado estágio de inflexão comprovado pelos crescentes desatinos.

Posto isto, o autoexame comportamental é indispensável. Nesse sentido, o Espírito Emmanuel brindou-nos com uma elevada mensagem de advertência a respeito da direção que estamos tomando em nossas vidas. Refiro-me ao capítulo 21 da obra Caminho, Verdade e Vida (psicografia de Francisco Cândido Xavier). Mais especificamente, o sábio mentor examina a seguinte passagem do Evangelho: “E ele lhes disse: Lançai a rede para a banda direita do barco e achareis” (João, 21: 6).

Em termos figurativos, Emmanuel sugere que a criatura humana seria uma espécie de “pescador”. De acordo com o seu pensamento luminoso, estamos basicamente pescando os “valores evolutivos, na escola regeneradora da Terra”. Nessa premissa, portanto, a nossa posição perante a vida reflete o “barco”. Diante disso, a cada jornada diária levantamos juntamente com a nossa “rede” de preocupações e interesses. Mas reside aí a questão-chave levantada pelo respeitável orientador: estamos lançando a nossa rede para a “banda direita”?

Ora, a banda direita, nessa avaliação, representa, por exemplo, a perseguição aos ideais superiores da vida, aos caminhos retos, à conduta sem peias e ao olhar compassivo. Dito de outra forma, a criatura humana deveria se perguntar todos os dias como vem pautando a sua existência corpórea. Emmanuel apropriadamente recomenda que “A vida deveria constituir, por parte de todos nós, rigorosa observância dos sagrados interesses de Deus”. No entanto, de modo geral, observa-se ainda considerável distanciamento da criatura em relação ao Criador. Basta observar as enormes dificuldades à materialização dos ideais divinos no planeta. Consideremos igualmente que há muita infelicidade na Terra, a despeito dos expressivos avanços tecnológicos e da fenomenal geração de riqueza.

Apesar disso, vê-se cada vez mais o colapso dos parâmetros e indicadores sociais críticos como: saúde, emprego, renda, violência, por exemplo, em detrimento dos próprios indivíduos e das suas necessidades elementares. O “pão” continua sendo muito mal distribuído no planeta. Em decorrência disso, temos as crescentes imagens da miséria e penúria humana. Em suma, nossa civilização não dá conta – e nem se empenha – de abrigar adequadamente todos os seus componentes. 

Como tal anomalia não se configura por acaso, cabe a pergunta: estamos contribuindo para o sofrimento dos nossos semelhantes? Aceitamos posições hierárquicas ou papéis sociais que fomentam o mal-estar geral só para nos beneficiar? Como elucida Emmanuel: “Frequentemente, porém, a criatura busca sobrepor-se aos desígnios divinos”. Não é difícil compreender que os desígnios celestiais são voltados ao amor, e, como tal, não tem pacto com o egoísmo e a exploração. No entanto, é revelador analisar esse aspecto pelo ângulo coletivo. Uma pesquisa recente do Instituto Gallup sobre o estabelecimento do programa de renda mínima universal – que deveria, em tese, ter a aceitação e apoio incondicional - em três países, Estados Unidos, Reino Unido e Canadá, detectou que apenas 43%, 77% e 75% dos respondentes, respectivamente, são favoráveis a tal medida. Ou seja, uma ideia benfazeja, que poderia mitigar muitos males sociais decorrentes da injusta distribuição de renda, não é, paradoxalmente, vista como uma prioridade absoluta.

Contudo, se estamos lançando as nossas redes de interesses na direção das sombras, é certo que “Estabelece-se, então, o desequilíbrio, porque ninguém enganará a Divina Lei. E o homem sofre, compulsoriamente, na tarefa de reparação”, conforme explica EmmanuelNão é de se estranhar, desse modo, que na atualidade vejamos chocantes expiações coletivas.

Outras questões merecem igualmente a nossa reflexão. Ou seja, a rede dos nossos pensamentos e atos está direcionada, como sugere Emmanuel, para a “verdadeira justiça”? Os tópicos são pertinentes, já que tendemos atavicamente a nos colocar à frente de tudo e de todos quando os nossos interesses são, por alguma razão, supostamente ameaçados. Nessa forma de pensar obtusa e mesquinha, o que importa realmente é a satisfação de obter ganhos não importando se merecidos ou não. Mas, graças ao profícuo trabalho de Allan Kardec, sabemos que o indivíduo voltado ao bem pensa e age coerentemente nesse caminho. No capítulo 17, item 3, da sua altamente esclarecedora obra O Evangelho segundo o Espiritismo, o codificador delineia o comportamento ideal. Suas inspiradas observações descrevem o significado de uma conduta respeitável e digna, que pode servir perfeitamente como bússola moral a todos que desejam lançar as redes na banda direita.

Por sua vez, Emmanuel orienta-nos para o imperativo de consultar “a vida interior, em esforço diário”. Com efeito, o que geramos em nossa tela mental? Nossas ideias e cogitações íntimas são saudáveis? Visam ao bem maior ou se circunscrevem aos vícios ou à busca da realização de aspirações doentias? Há pessoas no mundo “matando” outras mentalmente, só porque não conseguem conviver com os que pensam ou agem diferentemente dos seus valores. Não é mais novidade que a psicosfera planetária está impregnada de vibrações tóxicas expelidas por nós humanos, simplesmente porque não cuidamos dos nossos recursos mentais a contento.

Em síntese, como observa o Espírito Joanna de Ângelis, na obra Dias Gloriosos (psicografia de Divaldo Pereira Franco), respiramos a atmosfera saturada pelo nosso psiquismo, isto é, de acordo com as nossas irradiações mentaisDesse modo, ao buscarmos atingir planos elevados da espiritualidade, obviamente nos nutriremos de energia pura e saudável. Mas, ao optarmos por afundar nos fossos dos desejos brutais, de natureza voluptuosa, haveremos certamente de nos intoxicar devido às emanações pestilentas dali emanadas

Seguindo essa linha de raciocínio, a metáfora da rede aplica-se também ao conteúdo da nossa fala e sobre o que escrevemos. Assim me refiro porque, como se sabe, as pessoas usam intensamente – diria até exageradamente - as inúmeras plataformas sociais e ferramentas digitais, no presente século, para se comunicar e expressar as suas opiniões, gostos e visões. Lato senso, a “fala humana” é disseminada por vários meios – quase sempre sem os necessários filtros da discrição e do comedimento. Por conseguinte, um contingente assustador de indivíduos declara, sem o menor pudor, as suas preferências sexuais, manias e bizarrices. Tem-se a nítida impressão que virou moda expor a própria intimidade, bem como os desajustes comportamentais, como se fossem coisas banais. 

O resultado disso tudo é uma “fala” amplamente contaminada e degenerada. Externa-se o que pensa sem os devidos freios da razão, da ética e do equilíbrio. Triste tempo em que vivemos! A rigor, a nossa boca só deveria emitir palavras cordatas, pensamentos elevados, assim como ideias e argumentos lógicos e racionais. No entanto, a falta de bom senso abriu as portas à libertinagem e irresponsabilidade de vários matizes. Sobre tais disparates temos de admitir que Jesus foi preciso ao observar que “O que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem” (Mateus, 15: 11). Desse modo, que as nossas expressões mirem sempre a banda direita. Portanto, que de nossa boca – e, por extensão, dos nossos escritos – saiam apenas palavras e comentários edificantes e construtivos, que foquem sempre na disseminação do bem, justiça e respeito mútuo.

Por outro lado, para que a nossa rede seja abençoada, é preciso ampliar a qualidade das nossas conexões com os semelhantes. Em outras palavras, elas devem primar pelo teor positivo, empático e solidário. Há muita carência de amor, reconhecimento, e de oportunidades na face do planeta. Sem exagero, bilhões de pessoas estão lutando com extrema dificuldade para sobreviver. Assim sendo, tudo o que pudermos fazer para aliviá-las será certamente reconhecido pela providência divina.  

Pequenos gestos como o sorriso, o aperto de mão, as palavras incentivadoras ou a capacidade de dedicarmos alguns minutos para ouvir o nosso interlocutor necessitado podem fazer enorme efeito benéfico. De maneira análoga, que a nossa participação no mundo seja voltada para colaborar, cooperar, assistir e ajudar em todas as áreas. Imbuídos de tais determinações, dificilmente erraremos em nossas intenções. Para ilustrar cabe resgatar uma experiência vivida há pouco tempo por determinada pessoa das nossas relações.

Recomendado pelo seu médico para fazer um rotineiro exame de saúde (endoscopia), ele agendou o procedimento num grande laboratório de São Paulo. No dia aprazado compareceu à unidade determinada acompanhado da senhora sua mãe (por exigência do laboratório, o paciente não podia estar sozinho).

Preenchidos os papéis e obtida a respectiva autorização do plano de saúde para o exame, meu amigo foi encaminhado ao andar solicitado. Alguns minutos depois, um enfermeiro pediu-lhe que retornasse ao setor de atendimento para esclarecimentos. Surpresos, ele e a mãezinha (octogenária) retornaram à atendente. Ainda mais surpresos foram encaminhados para conversar com o gestor da unidade. O rapaz, muito sem graça, comunicou-lhes que o exame não poderia ser feito devido à idade da acompanhante. Meu amigo contra-argumentou afirmando que quem iria fazer o exame era ele não a genitora. Que poderia ficar, em caso de necessidade, um pouco mais de tempo na unidade para uma eventual recuperação, e que, finalmente, não tinha outra pessoa para acompanhá-lo.

O gestor ouviu-o e disse que tentaria agendar o exame para outra data, já que a decisão do cancelamento do exame era exclusivamente médica. Curioso nisso tudo é que meu amigo não viu a médica responsável, mas ela sabia da idade da sua mãe – sinal de que alguém havia lhe relatado. Em suma, ele não conseguiu fazer o referido exame. Apesar de apelar para o incontestável fato do crescente envelhecimento da população, ele não foi atendido. Prevaleceu o despreparo e radicalismo do laboratório, que não conseguiu divisar um fenômeno demográfico saliente no país e nem tampouco manifestou o desejo de encontrar uma solução viável para as necessidades médicas do meu amigo. Em termos mais concretos, a intolerância e intransigência da médica venceram. Ao meu amigo e sua mãe restou apenas a sensação amarga de serem alvos de desrespeito e desconsideração.

Em decorrência da indesejável experiência, ele foi a outro laboratório e fez o exame. Mas pagou para outra pessoa mais nova acompanhá-lo, a fim de evitar eventuais aborrecimentos. O caso descrito acima serve, até certo ponto, para avaliarmos se as nossas conexões – inclusive as institucionais – são calcadas pela empatia e o firme desejo de sermos úteis e solícitos aos irmãos e irmãs de jornada. Oxalá que a nossa redezinha seja sempre atirada para ajudar os aflitos e em necessidade, não para prejudicar.  

Segue daí outra variável relevante, isto é, os nossos propósitos na vida. Colocado de maneira mais objetiva: quais são as nossas metas e objetivos na presente encarnação? De fato, devemos ponderar com muita responsabilidade a respeito do que pretendemos, pois, seja lá o que escolhermos atingir, nos dará energia e motivação. Se forem propósitos superiores, nada a reparar, mas se forem pautados pelo mal...

Há muita gente no planeta que faz uso da sua inteligência e habilidades para subtrair e dilapidar o patrimônio alheio. É surpreendente ver a quantidade de golpes, arapucas, armadilhas e mecanismos inventados para lesar. Mentes brilhantes empregam todo o seu potencial criativo para explorar impiedosamente os seus(suas) irmãos(ãs). Outros dedicam a sua capacidade para o desenvolvimento de coisas dantescas. Há ainda aqueles que se mantêm manietados ao poder temporal como único objetivo existencial, esquecendo-se do imperativo da morte corporal e da correspondente prestação de contas.

Se o(a) amigo(a) ainda claudica no estabelecimento de nobres propósitos de vida, é hora de repensar profundamente as suas escolhas a fim de que não advenham sofrimentos posteriores. Como pondera o Espírito Joanna de Ângelis, “A aspiração do bom e do belo, da paz e da alegria sinaliza despertamento da consciência para mais altos voos”.

Ao que sabemos, Deus espera de nós nada mais nada menos do que a perfeição. Nesse sentido, há certamente muitos aspectos a melhorar. Assim considerado, que a nossa rede seja sempre atirada na banda direita da sabedoria, da comunhão com os ideais divinos, da vivência e prática de atos benéficos.

 
 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita