Chico Xavier levantara-se cedo e, ao sair, de charrete,
para a fazenda, encontra-se no caminho com o Flaviano,
que lhe diz:
— Sabe quem morreu?
— Não!...
— O Juca, seu ex-patrão. Morreu na miséria, Chico, sem ter nem o
que comer.
— Coitado! E Chico tira do bolso o lenço e enxuga os olhos. — A
que horas é o enterro?
— Creio que vão enterrá-lo a qualquer hora, como indigente, no
caixão da Prefeitura, isto é, no rabecão...
Chico medita, emocionado e pede:
— Flaviano, faça-me um favor: vá à casa onde ele desencarnou e
peça para esperarem um pouco. Vou ver se lhe arranjo um caixão,
mesmo barato.
Flaviano despede-se e parte. Chico desce da charrete. Manda um
recado para seu Chefe. Recorda seu ex-patrão, figura humilde de
bom servidor, que tanto bem lhe fizera. E ali mesmo, no caminho,
envia uma prece a Jesus: “Senhor, trata-se de meu ex-patrão, a
quem tanto devo; que me socorreu nos momentos mais angustiosos;
que me deu emprego com o qual socorri minha família; que tanto
sofreu por minha causa. Que eu lhe pague, em parte, a gratidão
que lhe devo. Ajude-me, Senhor”.
E, tirando o chapéu da cabeça e virando-o de copa para baixo, à
guisa de sacola, foi bater de porta em porta, pedindo uma esmola
para comprar um caixão para enterrar o extinto amigo. Daí a
pouco, toda Pedro Leopoldo sabia do sucedido e estava perplexa,
senão comovida com o ato do Chico.
Seu pai soube e veio ao seu encontro, tentando demovê-lo daquele
peditório.
— Não, meu pai, não posso deixar de pagar tão grande dívida a
quem tanto colaborou conosco.
Um pobre cego, muito conhecido em Pedro Leopoldo, é inteirado da
nobre ação do Chico, a quem estima. Esbarra com ele:
— Por que tanta pressa, Chico?
— Meu Nego, estou pedindo esmolas para enterrar meu ex-patrão.
— Seu Juca? Já soube. Coitado, tão bom! Espere aí, então, Chico.
Tenho aqui algum dinheiro que me deram de esmolas ontem e hoje.
E despejou no chapéu do Chico tudo o que havia arrecadado ate
ali...
Chico olhou-lhe os olhos mortos e sem luz. Viu-os cheios de
lágrimas. Comoveu-se mais.
— Obrigado, meu Nego! Que Jesus lhe pague o sacrifício.
Comprou com o dinheiro esmolado o caixão. Providenciou o
enterro. Acompanhou-o até o cemitério. E já tarde, regressou à
casa. Tinha vivido um grande dia. Sentou-se à entrada da porta.
Lá dentro, os irmãos e o pai observavam-no comovidos. Em prece
muda, agradeceu a Jesus. Emmanuel lhe aparece e lhe sorri. O
sorriso de seu bondoso Guia lhe diz tudo. Chico o entende.
Ganhara o dia, pagara uma dívida e dera de si um testemunho de
humildade, de gratidão e de amor ao Divino Mestre.
Do livro Lindos casos de Chico Xavier, de Ramiro Gama.
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