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por Sandro Drumond Brandão

 

A comunhão enquanto medida da distância entre o Espírito e o Pai


Em O Evangelho segundo o Espiritismo[1] retiramos importantes lições a respeito de duas virtudes ativas e amigas da doçura: a obediência e a resignação.

A primeira consiste na compreensão intelectiva do Espírito acerca do viés inelutável do evento ou circunstância que se apresenta em seu caminho, a despeito de seus projetos pessoais e expectativas. A resignação, por sua vez, é a aceitação pelo coração que ilumina a sua consciência sobre a essência divina do acontecimento que lhe visita, lhe retirando da zona de conforto; desafiando-o em suas limitações; excitando-o em suas virtudes e convidando-o ao bom combate[2].

Diz-se ativas, pois, as suas definições abarcam implicitamente os conceitos de trabalho, de produção e obra. Não se trata de um convite à inércia ou ao conformismo[3], mas, à conformação.

É dizer que a expectativa de Deus em relação ao Espírito que se depara com sua inarredável e imperiosa tribulação é a de que se lance ao bom combate com altivez, coragem, fé e esperança, caminhando e servindo, confiando e trabalhando[4].

Emmanuel na obra Palavras de vida eterna[5] nos lembra que devemos “suportar com paciência os enganos do mundo, sem nos acomodarmos com eles, certos de que é preciso manter indefectível lealdade à aplicação dos preceitos evangélicos a fim de que se nos renove o entendimento.”

No jugo da carne o Espírito encarnado experencia inúmeras oportunidades de exercer sua obediência e, especialmente, sua resignação. Nas aflições da vida corpórea e nos desafios de suas tribulações é chamado a dar o seu testemunho saindo do verbo para a realização. Em sua hora mais escura ou estando aonde a batalha é mais acesa sente no seu âmago o chamado do Pai à demonstração de sua lealdade.

Lealdade como nos ensina Emmanuel na obra Fonte viva:

“Lembra--te de que vives, onde te encontras, por iniciativa do Poder Maior que nos supervisiona os destinos e guardemos lealdade às obrigações que nos cercam. E, agindo incessantemente na extensão do bem, no campo de luta que a vida nos confia, esperemos por novas decisões da Lei a nosso respeito, porque a própria Lei nos elevará de plano e nos sublimará as atividades no momento oportuno.”

A lealdade ao Pai nos é reivindicada a todo momento no Evangelho, enquanto prova de nossa fé e esperança nos teus desígnios, conferindo à nossa aceitação ostensividade por meio de nossas ações[6].

O ensino se inicia com o “licenciado” antropomorfismo de atribuir ao Incriado a ideia de Pai. A esta concepção alia-se a informação de que este Pai é fonte de bondade pura e amor infinito, para a partir daí o nosso Mestre nos ensinar:

E qual o pai dentre vós que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, se lhe pedir peixe, lhe dará por peixe uma serpente? E qual o pai dentre vós que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, se lhe pedir um ovo lhe dará um escorpião? Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais o Pai celestial dará o Espírito Santo àqueles que lho pedirem?[7]

De inquebrantável fé raciocinada somos conclamados a confiar nos desígnios divinos, de modo a sempre condicionarmos nossos pedidos ao juízo justo e perfeito do Pai[8].

Emmanuel nos ensina ser “(...) imperioso, em matéria de petição, rogar isso ou aquilo ao Senhor, sempre de acordo com a Sua Vontade, porque a vontade do Senhor inclui, invariavelmente, a harmonia e a felicidade de nossa vida.”[9]

Contudo, na imperfeição do Espírito reside a leviandade de suas pretensões e a inflexibilidade de seu juízo (recebimento) sobre as decisões do Pai. É no endurecimento de sua recepção que extraímos graves misérias. Mergulhados em deletéria contrariedade renunciam à posição de filhos amorosos em abono à indignação e rebeldia[10].

Na irresignação tomamos noção da distância que nos separa de Deus. Negligenciamos instinto basilar de adoração para, calcados em nosso orgulho[11], defendermos anormal discordância da vontade da Perfeição.

De outro lado, a lealdade do filho resignado o aproxima do Pai pela escolha de compreender a se rebelar, acolhendo com o coração vibrante a oportunidade de progresso[12].

Ensina-nos Allan Kardec[13]:

Deveis considerar-vos felizes por sofrerdes, visto que as dores deste mundo são o pagamento da dívida que as vossas passadas faltas vos fizeram contrair; suportadas pacientemente na Terra, essas dores vos poupam séculos de sofrimentos na vida futura. Deveis, pois, sentir-vos felizes por reduzir Deus a vossa dívida, permitindo que a saldeis agora, o que vos garantirá a tranquilidade no porvir.

Por essa razão a maior ou menor comunhão dos Espíritos encarnados com os desígnios celestiais é a medida exata de sua distância em relação a Deus. Somente na certeza de que a vontade divina é mais sábia e misericordiosa do que o capricho próprio é que encurtamos a lonjura que estamos Dele.

 

Referências bibliográficas:

DE CAMPOS, Humberto (Espírito). Boa Nova. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Brasília: FEB, 2020.

DIAS, Haroldo Dutra (Trad.), 1971- O novo testamento, tradução de Haroldo Dutra Dias. – 1. ed. – 11. imp. – Brasília: FEB, 2020.

EMMANUEL (Espírito). Palavras de vida eterna. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Uberaba: Edição CEC, 1998.

EMMANUEL (Espírito). Fonte viva. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Rio de Janeiro: FEB, 2000.

EMMANUEL (Espírito). Segue-me!... Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Matão: O Clarim, 2012.

EMMANUEL (Espírito). Vinha de luz. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Brasília: FEB, 2019.

KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. P. 316.


 

[1] KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. P. 138.

[2] Combater o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé”- Paulo. (II Timóteo, 4:7.)

[3] “E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”. PAULO (Romanos, 12:2.).

[4] “Recordemos que a tribulação produz fortaleza e paciência e, em verdade, ninguém encontra o tesouro da experiência, no pântano da ociosidade. É necessário acordar com o dia, seguindo-lhe o curso brilhante de serviço, nas oportunidades de trabalho que ele nos descortina.” (EMMANUEL (Espírito). Vinha de luz. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Brasília: FEB, 2019.

[5] EMMANUEL (Espírito). Palavras de vida eterna. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Uberaba: Edição CEC, 1998.

[6] “Que não amemos de palavras nem de língua, mas de obras e de verdade” – João (I João, 3:18)

[7] Lc 11:11-13

[8] “E esta é a confiança que temos para com Ele, que se pedirmos alguma coisa segundo a Sua vontade, Ele nos ouve.” – (I João, 5:14)

[9] EMMANUEL (Espírito). Segue-me!... Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Matão: O Clarim, 2012.

[10] “E o mandamento que era para a vida, achei eu que me era para a morte.” Paulo (Romanos, 7:10)

[11] “O pusilânime não pode ser resignado, do mesmo modo que o orgulhoso e o egoísta não podem ser obedientes” (KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. P. 138.)

[12] “Por isso também os que sofrem, segundo a vontade de Deus, encomendam as suas almas ao fiel Criador, na prática do bem”. Pedro (I Pedro, 4:19)

[13] ” (KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. P. 86.)


Sandro Drumond Brandão é dirigente do Centro Espírita Santo Agostinho, de Belo Horizonte (MG)



 

     
     

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