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por Ricardo Orestes Forni

 

A ciência da paz


“Sede pacientes; a paciência também é uma caridade, e deveis praticar a lei de caridade ensinada pelo Cristo, enviado de Deus. A caridade que consiste na esmola dada aos pobres é a mais fácil das caridades. Mas há uma bem mais penosa, e consequentemente bem mais meritória: perdoar àqueles que Deus colocou em nosso caminho para serem os instrumentos de nossos sofrimentos e pôr em prova nossa paciência.” (E.S.E., capítulo IX)


Ainda que eu passe várias existências no mundo material, vou ter muita dificuldade para colocar em prática essa recomendação de um Espírito amigo ocorrida em Le Havre, 1862.

Se aceitas fazer um teste comigo, vou colocar algumas perguntas sobre a paciência contida no livro Deus te abençoe, psicografia de Baccelli, editora Didier, na página intitulada Mais Fácil.

Vamos lá: como reages quando és tratado com descaso, nesta ou naquela repartição de serviço que buscas; como te revelas ao volante do carro, quando és insultado por um motorista que se apressa no trânsito congestionado; como ficas quando, ao telefone, alguém te destrata e desliga o aparelho, sem oferecer-te chance de revide; como te sentes quando o vizinho lança detritos à porta de tua residência, qual se coubesse a ti a digna tarefa confiada aos garis; como respondes a quem te agride os ouvidos, alteando a voz em diálogo contigo?

Tenho certeza absoluta que muitas outras perguntas poderíamos fazer a nós mesmos sobre a paciência. Por exemplo: como reages quando chegas cansado depois de um dia de serviço e a esposa deseja conversar sobre o dia dela; como está tua paciência com os filhos que necessitam de tua atenção e a quem deves esse tempo pela responsabilidade que assumiste perante as Leis de Deus; quais são os pensamentos que te assaltam quando o patrão critica um serviço que executaste com muito carinho e cuidado; o que sentes quando na Casa espírita companheiros não concordam com tua opinião? E vai por aí afora, podendo cada um levantar uma situação em que a paciência é colocada em teste.

Creio até que seria difícil encontrar o final para as indagações que nos revelariam como vai a nossa paciência, ou, se preferirem, como não vai a nossa paciência.

Jerônimo Mendonça, o Gigante Deitado, que foi um livro de paciência diante de tantas dificuldades que teve de enfrentar e que não o impediram de divulgar a Doutrina Espírita, definia a paciência como a ciência da paz, nome que demos a este artigo.

No livro Pensamentos Que Ajudam, página Danúbio azul, doutor José Carlos de Lucca cita um parágrafo da música “Paciência”, de Lenine e Dudu Falcão: E o mundo vai girando, cada vez mais veloz, a gente espera do mundo, e o mundo espera de nós um pouco mais de paciência.

Particularmente não concordo que o mundo gira mais rápido. Somos nós que vivemos entupindo o dia com mais e mais compromissos, fazendo com que as tradicionais vinte e quatro horas já não tenham todo o espaço que nosso egoísmo, orgulho e vaidade exigem para que possamos nos satisfazer.

Tenho a sensação de que corremos tão celeremente mais rápido atrás das conquistas materiais que ficarão todas na Terra, tendo a necessidade de espichar as horas do dia como alguém que, misturando todos os componentes da receita, fizesse uma massa que precisasse ser comprimida pelo rolo da cozinha para ser esticada, arrumando lugar para os ingredientes de uma torta ou alimento semelhante a serem contidos no seu interior.

Quem sabe a física quântica ou alguma outra ciência ainda desconhecida consiga uma fórmula para alargar o dia atual de vinte e quatro horas? Por enquanto, não é possível. O relógio prossegue em sua marcha indiferente às nossas angústias, anseios ou necessidades.

Vamos nos valer, para encerrarmos, de um trecho do livro mencionado anteriormente do doutor De Lucca: Hoje a ciência já afirma que a impaciência pode ser um fator componente da obesidade, hipertensão arterial e envelhecimento. A impaciência está tirando dias da nossa existência; ela nos acelera tanto, que é provável que venhamos a encontrar a morte mais rapidamente! Talvez não sejamos capazes de mudar a sociedade, mas podemos corrigir alguma coisa em nós mesmos. E o Lenine dá uma dica interessante: “Enquanto o tempo acelera e pede pressa, eu me recuso, faço hora e vou na valsa, a vida é tão rara.” Pensemos nisso: a vida é tão rara! Nossa vida é preciosa para ser desperdiçada em constantes surtos de impaciência.

Para que tanta pressa que gera a falta de paciência que nada resolve e, muito pelo contrário, pode agravar muitas situações?

E, além disso, mais uma coisa: quem corre muito tentando, como já dissemos, engolir o tempo na tentativa inútil de conseguir esse intento, esgota mais rápido o calendário particular da atual existência e chega mais célere ao desencarne. É o que revelam as expressões: o tempo voa, nem vi o tempo passar! Não vê mesmo. A fixação quase mórbida em determinados objetivos leva à miopia ou, até mesmo, à cegueira total sobre o curso inabalável das horas que desfilam no mesmo ritmo de sempre.

Uma vaga para a reencarnação está virando artigo de luxo. Basta analisar estatisticamente o número de filhos que os casais atuais estão tendo. Como não existe outra porta para retornar ao aprendizado no corpo físico, teremos que ficar numa fila enorme e aguardar a nossa vez.

Como não tenho nenhuma pressa de partir deste corpo já envelhecido pelos anos, os que desejarem podem passar à minha frente. Será uma caridade que me farão.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita