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por Vladimir Alexei

 

A religião na berlinda


O ser humano, por instinto, de forma natural, sabe que a vida é finita e que a morte é a única certeza que temos na existência. Um dia fecharemos os olhos para não mais abrir nessa vida.

A doutrina espírita nos ajuda a compreender melhor o que ocorre com o ser humano após a sua morte. Porém, nem toda religião é transparente em relação à continuidade da vida. Este, talvez, seja um dos dogmas que se possa considerar importante, afinal, as religiões para não esclarecer seus adeptos da melhor maneira, lançam ideias que são aceitas sem questionar, ainda que haja inquietação interior por parte de alguns adeptos.

A falta de esclarecimento por parte das religiões é intencional. A religião tradicional, materialista, entende que seu profitente busca a “salvação” e, conforme sua crença, a salvação se dá por meio de uma série de atividades, práticas e rituais que, seguidos rigorosamente, transportam o “morto” para o céu. Aqueles que não conseguem seguir os rituais impostos pelas religiões, eximidas de quaisquer responsabilidades caso seu adepto não alcance o céu, vão amargar em um entreposto denominado purgatório até chegar ao destino final, eterno, que é o inferno.

Nessas linhas simplistas é possível perceber que se trata de um processo de salvação. É para isso que as religiões tradicionais ainda constroem templos suntuosos, faraônicos, que visam demonstrar sua importância, poder diante de uma sociedade enferma que, logo baterá a porta em busca de salvação.

No ano de 2022, no período que antecedeu as eleições em primeiro e segundo turnos, bem como durante as eleições e após, observou-se um movimento constrangedor tomando forma na sociedade enferma. Brigas, disputas, pregações inflamadas, profetizações para um candidato, para outro, o ápice do movimento obsessivo chegou, quando um destes ditos representantes de Deus na Terra profetizou a morte de um candidato. Já estava ruim, mas a partir do momento que alguém profetiza a morte de outro, talvez seja o momento para uma reflexão menos apaixonada, desgovernada e mais racional, lembrando que são pastores que possuem rebanhos.

Freud, apesar de materialista e ter optado por ignorar o mundo espiritual, mesmo com todas as evidências que o cercaram durante suas pesquisas, descreveu o presente momento em que as pessoas se descontrolam de forma coletiva da seguinte forma: “a massa é impulsiva, volúvel e excitável. É guiada quase exclusivamente pelo inconsciente (podemos entender, do ponto de vista espírita, pelo inconsciente e os espíritos). (...) A massa é extraordinariamente influenciável e crédula, é acrítica, o improvável não existe para ela. Pensa em imagens que evocam umas às outras associativamente, como no indivíduo em estado de livre devaneio, e que não tem sua coincidência com a realidade medida por uma instância razoável”.

Independente da classificação – que é uma maneira de organizar as informações para melhor utilizá-las –, “massa de manobra”, “obsessão coletiva”, etc., para quem não está envolvido nesse cipoal, é possível perceber com bastante clareza que o propósito da religião se perdeu nas dificuldades humanas. Poderíamos discutir as dificuldades humanas em diversas frentes, como dificuldades morais, intelectuais e espirituais. Esta, é a que mais nos chama a atenção, pela fragilidade.

Nas anotações do evangelista Mateus, cap. 6, versículos 19-21, Jesus disse para que “não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões não minam, nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.

Será que os ensinamentos de Jesus perderam o sentido espiritual para as religiões tradicionais? Será que Jesus é apenas instrumento de poder transitório para as religiões cada vez mais materialistas? Será que Jesus morreu para as religiões?

O Evangelho não mudou. Os ensinamentos de Jesus continuam os mesmos. Entretanto, percebe-se com muita nitidez que os ensinamentos do Cristo estão sendo cada vez mais submetidos aos mandos e desmandos dos desejos materialistas, transitórios, em que a traça e a ferrugem tudo consomem!

A violência se alastrou na velocidade da tecnologia. As redes sociais diminuíram a distância entre a decência e a descrença absoluta, a ponto de as religiões tradicionais não conseguirem mais influenciar seus adeptos e nem muito menos os jovens.

Há rumores de que, pela primeira vez, o número de ateus nos próximos anos será maior no Brasil do que os religiosos tradicionais. E, em se confirmando, uma interpretação possível é o completo e absoluto falimento do sistema religioso tradicional. A religião precisa resgatar a religiosidade nas pessoas, a espiritualização.

As pessoas encontram-se divididas e a religião tradicional insufla esse processo de divisão, com uma pseudopostura de respeito às diferenças. Isso não procede. O papel da religião é apresentar o seu pensamento mais elevado para que seu adepto tenha uma diretriz para seguir diante das tempestades que surgem em seu caminho.

Pastores e Padres se perderam no materialismo gritante e avassalador. Se deixaram influenciar pelas mazelas da sociedade desigual, racista, misógina e ortodoxa, quando se esperava deles a demonstração de caminhos que eles representam – não se espera dessas autoridades religiosas a infalibilidade que lhe são atribuídas e sim, que a direção seja apontada, mesmo que eles não estejam em sintonia com a direção!

O filósofo Luc Ferry nos lembra que a salvação é o grande mote das religiões. Se compulsarmos a história, desde que o homem se desviou do caminho que as religiões pregam, a salvação passou a ser uma questão de honra e por isso, seus representantes “vendem a alma” para encontrar um lugarzinho para seus adeptos no céu.

O momento requer prudência e sabedoria, mas também ousadia em romper com esse ciclo vicioso e retornar à pureza do Cristianismo Primitivo, quando se interpretavam os ensinamentos de Jesus independentemente de seus interesses pessoais! É o momento de aplicar os ensinamentos de Jesus, quando diz que não veio trazer a paz e sim a espada, para que esses fios que nos prendem ao passado de culpa, mandos e desmandos religiosos, sejam desfeitos e tenhamos oportunidade de começar uma nova vida, ainda em vida!

Falamos das religiões tradicionais, mas e no Espiritismo estaríamos agindo da mesma forma?

Busquemos na simplicidade dos ensinamentos do Cristo o resgate aos Seus valores mais profundos e transformadores. Não sejamos motivo de escândalo. Que o desejo de amar seja mais forte do que o de expressar seu descontentamento inócuo, fazendo coro a uma massa disforme, limitada e temerária. Sejamos luz!

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita