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por Rogério Coelho

 

Conclave de líderes


Grande distância medeia entre possuir uma grande missão e ser um grande missionário


“(...) antes o maior entre vós seja como o menor; e quem governa como quem serve.” 
- Jesus. (Lc., 22:26)


Ermance Dufaux descreve[1] uma reunião realizada no “Hospital Esperança”, Instituição criada por Eurípedes Barsanulfo no Mundo Espiritual, que presta relevantes e variados serviços de socorro e esclarecimentos tanto a encarnados como a desencarnados.

Nesse conclave, a plateia estava constituída por mais de mil formadores de opinião do movimento espírita: médiuns, escritores, articulistas, dirigentes, etc... A direção estava a cargo do próprio Eurípedes Barsanulfo, do Dr. Bezerra de Menezes e do prof. Cícero Pereira, que foi encarregado a fazer os comentários em nome dos dois primeiros.

Em síntese, o professor Cícero conclamou a todos os dirigentes ali presentes (emancipados pelo sono físico) a focar a atenção na reforma íntima, no combate ao egoísmo, ao orgulho, à vaidade e ao vício do prestígio...  E não foi sem inquietudes que a plateia ouviu as admoestações, uma vez que todos, sem exceção, sabiam muito bem dos espinhos que traziam na carne.

Dentre os comentários surgidos após a palestra, vamos destacar o de Dona Maria Modesto Cravo1: “(...) a doença da autossuficiência espiritual ou o fascínio com a importância grandiosa que muitos corações supõem possuir nos serviços de Jesus, é um terrível mal que assola a maioria das leiras de trabalhos espiritistas, bem como as expressões religiosas de todos os tempos.

Os amigos espíritas especialmente os mais experimentados na arte de liderar, precisam vigiar com muita cautela o encanto que tem devotado às suas "folhas de serviços". Bastas vezes confundem quantidade de tarefas e realizações com ascensão evolutiva, como se fizessem carreira nos ofícios de sua espiritualização. Ocorre que muitos corações de ideal, em todas as atividades doutrinárias, têm passado pelas tarefas sem se educarem através delas, e quanto mais expressivas elas são, mais aumentam os riscos de vaidade e ilusão. Temos por aqui vastos pavilhões de médiuns, divulgadores, escritores, evangelizadores da juventude, presidentes de centros espíritas, dispensadores da caridade pública, todos abençoados com as luzes da Doutrina Espírita, entretanto, sem conquistarem sua luz própria. Sufocaram-se no orgulho com a cultura e a experiência doutrinária e negligenciaram o engrandecimento moral de si mesmos através da reeducação dos hábitos e da aquisição de virtudes eternas.  É um engano milenar da ilusão humana, ainda afeiçoada a vantagens, exteriores sem a consolidação dos ensinos, cristãos no próprio coração. Como disse o Senhor: "o Reino de Deus não vem com aparência exterior”.[2]

Uma das principais imperfeições dos líderes é serem excessivamente controladores por julgarem enxergar mais... Carregam consigo uma das mais antigas mazelas humanas: O desejo de serem servidos – uma faceta emocional sutil do desejo de serem amados ou da necessidade de serem queridos e aprovados pelos outros, a qual termina por ser transferida para o costume de serem bajulados e incensados pelos que os rodeiam.  Esse velho monstro da alma surge sorrateiramente como um hábito doentio de ordenar e comandar pessoas, já experimentado em muitas e muitas vidas sucessivas, uma forma de satisfação do egoísmo humano.

Considerando o vício de prestígio que carregam esses corações, são intensamente atraídos para posturas de destaque. Adoram os cargos e o poder e, embora possamos encontrá-los também distantes dos títulos, estes são por eles possuídos no campo psicológico.  São criaturas que realizam muito e tem significativa visão de conjunto das necessidades do movimento social em torno das ideias espíritas, apenas pecando pelo orgulho em que se inspiram por suporem possuir todas as respostas e caminhos para todas as necessidades e percalços da Seara. Isso lhes torna úteis em certas situações e extremamente rejeitados pela arrogância em outras ocasiões, quando excedem na sua suposta sapiência e grandeza.

Verdadeiramente, nossos irmãos que aqui estiveram guardam conquistas apreciáveis, porém, nem sempre conseguem deixar de se enganar pelo sibilino personalismo que ainda carregam.  Uma vez nessa postura fica fácil reconhecer-lhes as imperfeições prejudiciais ao serviço da obra cristã, porque não ouvem opiniões por julgarem terem as melhores, guardam convicções pessoais exacerbadas, não dão atenção às críticas, quase sempre decidem sozinhos, tornam-se pouco afetivos, muito racionais e adoram mandar sem fazer, ordenar sem cumprir... O conjunto dessas, características promove-os a uma das condições mais inaceitáveis na atualidade para quaisquer grupamentos que se proponham a crescer espiritualmente: o autoritarismo.

(...) Uma cultura de grandeza tem estimulado esse drama ético entre os coidealistas no plano físico. Grande distância medeia entre possuir uma grande missão e ser um grande missionário. De fato, quantos foram brindados com a Doutrina Espírita são como a "luz do mundo", contudo, temos que ser honestos e considerar que boa parcela dos irmãos tem sucumbido aos golpes sutis do orgulho, julgando-se bem mais valorosos que realmente o são para os ofícios da causa. Não somente esses mil, mas uma infinidade de homens e mulheres da direção nos arraiais espiritistas se encontram nas garras da autossuficiência fascinados por seus feitos e com sua bagagem, nutrindo pouca disposição para serem avaliados e criticados em suas ideias e ações. Gostam mesmo é de serem admirados e aprovados sem restrições, sendo que alguns adoram impressionar...

(...) Muito desapego e coragem serão exigidos de todos nós para que deixemos as fantasias da autossuficiência, que nos fazem sentir um pouco melhores diante de nossa inferioridade, e assumirmos, enquanto é tempo, a condição psicológica prenunciada há mais de dois mil anos pelo Mestre do Amor, quando assinalou[3]“(...) mas não sereis vós assim; antes o maior entre vós seja como o menor, e quem governa, como quem serve”.

Não é, portanto, sem motivo, que Ferdinando, Espírito protetor enviou esta página[4]:


MISSÃO DO HOMEM INTELIGENTE NATERRA

Não vos ensoberbais do que sabeis, porquanto esse saber tem limites muito estreitos no mundo em que habitais.  Suponhamos sejais sumidades em inteligência neste planeta: nenhum direito tendes de envaidecer-vos. Se Deus, em Seus desígnios, vos fez nascer num meio onde pudestes desenvolver a vossa inteligência, é que quer a utilizeis para o bem de todos; é uma missão que vos dá, pondo-vos nas mãos o instrumento com que podeis desenvolver, por vossa vez, as inteligências retardatárias e conduzi-las a Ele...

(...) A inteligência é rica de méritos para o futuro, mas, sob a condição de ser bem empregada.  Se todos os homens que a possuem dela se servissem de conformidade com a vontade de Deus, fácil seria, para os Espíritos, a tarefa de fazer que a humanidade avance.  Infelizmente, muitos a tornam instrumento de orgulho e de perdição contra si mesmos.  O homem abusa da inteligência como de todas as suas outras faculdades e, no entanto, não lhe faltam ensinamentos que o advirtam de que uma poderosa mão pode retirar o que lhe concedeu”.                                                


 


[1] - OLIVEIRA, Wanderley Soares. Reforma íntima sem dor. 3.ed.BHte: INEDE, 2003, cap. 30, p.175-191.

[2] - BÍBLIA, N.T. Lucas. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1983. cap. 17. vers 20.               

[3] - BÍBLIA, N.T. Lucas. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1983. cap. 22. vers 26.                

[4] - KARDEC, Allan. O Evangelho Seg. o Espiritismo. 121.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, cap. VII, item 13. 

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita