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por Marcus De Mario

 

Espiritismo ou Doutrina Espírita


Constatamos, apesar do imenso crescimento do movimento espírita no Brasil nas últimas décadas, que muitos adeptos ainda não compreenderam a doutrina, insistindo em ficar na sua superfície, sem o devido aprofundamento quanto aos seus princípios e finalidades. Assim, ainda ouvimos expressões tais como espiritismo kardecista, espiritismo de mesa branca, espiritismo umbandista, espiritismo progressista, e ainda esta outra: espírita à esquerda (cremos que deverá igualmente existir espírita de centro e espírita à direita, para sermos justos). Essas expressões, em verdade, são equivocadas. Existe apenas o Espiritismo ou Doutrina Espírita, como muito bem definido por Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, introdução, item 1:

“A Doutrina Espírita ou o Espiritismo tem por princípio as relações do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo invisível. Os adeptos do Espiritismo serão os espíritas, ou, se o quiserem, os espiritistas.”

Allan Kardec não utiliza nenhum adjetivo para classificar a doutrina e seus adeptos.

E para não deixar dúvidas quanto à finalidade do Espiritismo, esclarece em O Que é o Espiritismo, na introdução:

“O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações.”

O que temos assistido é a tentativa de adaptação da Doutrina Espírita às ideias pessoais, às conveniências exclusivistas de pessoas ou de grupos. Exemplo disso é quando, no grupo de estudo da doutrina, o dirigente do Centro Espírita verbalizou que concordava com a doutrina no tocante ao tema em estudo, mas que na sua opinião… Perguntamos: se sou espírita isso quer dizer que concordo com a orientação do Espiritismo, então como posso ter uma opinião pessoal diferente daquilo que digo aceitar e seguir?

Esse movimento aconteceu com o Cristianismo, deturpado que foi pelo Catolicismo e, depois, pelo Protestantismo. Tantas foram as adaptações, as interpretações e as lutas pelo poder material e político, que o Evangelho acabou distanciado da população por muito tempo, e o profundo e sublime ensino “amai-vos uns aos outros” quase foi substituído pelo “odeiem-se uns aos outros”, principalmente com relação aos adeptos de outra crença religiosa que não a sua. Isso não pode acontecer com o Espiritismo.

A finalidade maior do Espiritismo é alavancar o progresso moral da humanidade, o que somente pode acontecer com o progresso moral dos indivíduos, daí porque a defesa que a Doutrina Espírita faz da necessidade da Educação Moral, única força que alcança as causas de todos os problemas humanos: o egoísmo e o orgulho. E não apenas alcança como lhe dá o combate eficaz, desenvolvendo o potencial divino que todos trazemos, fazendo o desabrochar das virtudes, o desenvolvimento do senso moral, substituindo essas duas chagas morais pela caridade e pela humildade.

Sabedor das nossas imperfeições e dificuldades, Kardec produziu belo e profundo texto publicado no capítulo 17, item 4, de O Evangelho Segundo o Espiritismo, com o título Os Bons Espíritas, lembrando-nos que:

“O Espiritismo não cria uma nova moral, mas facilita aos homens a compreensão e a prática da moral do Cristo, ao dar uma fé sólida e esclarecida aos que duvidam ou vacilam.”

É nesse mesmo texto onde encontramos a expressão “Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral, e pelos esforços que faz para dominar suas más inclinações”.

Como podemos perceber, nesse texto Kardec utiliza dois adjetivos para falar do espírita: bom e verdadeiro, o que implica necessariamente na existência do mal e do falso espírita, que nada mais são do que aqueles adeptos de superfície, que não aplicam a si mesmos a transformação moral solicitada pela Doutrina; que ainda se mantém egoístas e materialistas; que utilizam da retórica para defender pontos de vista pessoais; que querem se manter em determinada zona de conforto e, assim, deturpam o ensinamento espírita.

É por tudo isso que temos visto dirigentes espíritas mais preocupados em quantidade de frequentadores no Centro Espírita, do que com qualidade dos adeptos; o tratamento espiritual visando à cura do corpo físico substituindo o estudo da Doutrina Espírita; ritos gestuais na aplicação do passe no lugar da simples imposição das mãos; explicações simplórias sobre a realidade do mundo espiritual; e assim por diante, numa deturpação do Espiritismo bem ao gosto dos que não querem estudar, pensar, raciocinar e, principalmente, realizar sua transformação moral.

Nesse desconhecimento, ou pelo menos na falta de estudo mais profundo, do Espiritismo, acabamos invertendo valores e, ao invés de influenciarmos a sociedade para sua transformação, pegamos ideias da sociedade egoísta, preconceituosa e materialista para introduzi-las no movimento espírita. O movimento deve ser exatamente o contrário, pois compete ao espírita trabalhar para moralizar e espiritualizar as pessoas e as instituições sociais de todos os gêneros, o que não significa impor o Espiritismo a quem quer que seja, mas atuar como verdadeiro espírita, tendo na força do exemplo de pessoa de bem, com o uso do senso moral e a visão espiritualista da vida, sua maior ferramenta, de acordo com os princípios que formam o Espiritismo.

Uma última palavra: não existe autor, encarnado ou desencarnado, que possa substituir Allan Kardec com suas obras, alicerces do Espiritismo. E, parafraseando o Codificador, que nos disse que “fora da caridade não há salvação”, podemos afirmar que fora de Kardec não há Espiritismo ou Doutrina Espírita.


Marcus De Mario é do Rio de Janeiro/RJ; educador, escritor, palestrante; coordenador do Grupo Espírita Seara de Luz; publicador do canal Orientação Espírita no YouTube.



 

     
     

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