A vida, eu e a Vida
Desguarnecido Dele, sucumbo às minhas deformidades,
Sem Ele, só me resta eu, e eu comigo é só luta.
Desguarneço-me Dele quando O dispenso,
Dispenso-O porque estou feliz no mundo.
Esqueço-me de que feliz no mundo é diferente de ser
feliz com Ele em Seu mundo.
A vida apresenta sua exação:
Sou devedor.
Eu, o filho do mais Rico,
Renuncio ao auxílio da Perfeição pela sabedoria dos
imperfeitos,
Endivido-me ainda mais.
Meus débitos morais são excruciantes,
Fortalecem-se com a minha inércia,
Dominam-me pela minha invigilância
E me desfalecem pelo meu medo.
Olho em torno de minha casa e não encontro saída.
Sou credor de mim mesmo,
Indecoroso mal me habita.
Não se pode fugir de si mesmo.
Minha consciência é implacável.
Perturbado, procuro Quem nunca se escondeu,
Provoco Quem ansiava ser provocado,
Incomodo Quem aguardava pacientemente por mim,
Descubro que só Nele reside a resposta.
Sinto-me irrefutavelmente só e ao mesmo tempo
inelutavelmente amparado.
É Ele o imaterial que me acolhe no momento em que o
material se nega a responder.
Somos eu e Ele agora.
Sinto-me desatendido em meio ao atendimento.
Sou material. Só me é atraente o visível e o imediato.
Sua beneficência desperta em meu Espírito a mais
profunda contrariedade.
Discordo do óbvio, elevo-me; a erudição do Bem me despe
por inteiro.
Sou assolado pela melhor e mais justa razão.
Regozijo-me com tão salutar revés e aprendo que Ele é
Pai.
O autor reside em Belo Horizonte (MG).