Renúncia
Renúncia pode ser entendida como ato de negar, rejeitar,
afastar, recusar, deixar, desistir, privar ou abandonar
algo, alguém ou comportamento para assumir outra
atitude.
Religiosamente, pode-se renunciar o mal para praticar o
bem; renunciar o apego material para privilegiar a
aquisição de bens espirituais; renunciar aos benefícios
do mundo material para aceitar as privações e os
sofrimentos da vida; renunciar a si mesmo para servir e
ajudar o próximo; renunciar o orgulho e a soberba para
agir com humildade; dentre outros tantos.
A renúncia poderá motivar um comportamento oposto, tal
como: a renúncia à raiva, ao ódio, à vingança e à
perseguição que poderá estimular a compreensão, o
perdão, a reconciliação e a pacificação.
Francisco de Assis, em certo momento de sua existência,
renunciou a uma vida de riqueza, com seus benefícios,
para outra de privação e pobreza, modificando totalmente
a forma de agir. Além disso, renunciou a si mesmo para
dedicar-se aos mais necessitados. Francisco praticou o
amor em sua plenitude e na mais sublime expressão,
distribuindo-o para todos indistintamente.
A reflexão sobre Francisco de Assis está na renúncia que
mudou a sua vida para dar a ela novo rumo e sentido. O
primeiro passo foi a libertação das amarras que lhe
prendiam e impediam tomar o caminho da verdade e da
vida, e no desapego das coisas materiais que
dificultavam tomar nova direção e orientação,
principalmente se essa direção fosse no sentido oposto
ao que vinha vivendo até aquele momento.
O amor aos bens terrenos constitui um dos maiores óbices
ao adiantamento moral e espiritual. Pelo apego à posse
de tais bens, afasta-se o amor na sua pureza de coração.
O Cristo em sua missão, até o martírio na cruz, ensinou
e testemunhou o amor divino e a renúncia plena,
principalmente diante da traição, da humilhação e do
abandono a que foi submetido, inclusive dos seus
discípulos. A ingratidão recebida por Jesus, após
inúmeros benefícios proporcionados, conduz a profundas
reflexões sobre o seu sublime amor por todos nós.
O amor verdadeiro e sincero nunca espera recompensa,
sendo a renúncia essencial para a prática do puro amor,
incondicionalmente.
Contudo, nem todos os aflitos pretendem renunciar às
causas de suas desesperações e tampouco os tristes
querem fugir à sombra para o encontro com a luz. É quase
impossível melhorar moralmente sem sacrifícios e
renúncias.
Muitos caminhos se apresentam na vida: os que conduzem
às perturbações e desarmonias espirituais; e os
caracterizados pela renúncia aos valores transitórios e
às ilusões da matéria. Escolher um caminho ou outro
depende de nós.
Pelas experiências educativas, em seu processo
evolutivo, o Espírito desenvolve a capacidade de
discernimento entre o bem e o mal, aprendendo a fazer as
escolhas mais acertadas que auxiliarão no propósito de
mudança.
Entretanto, nem sempre revelamos a disposição para
renunciar às infindáveis requisições do mundo material
para seguir Jesus. Indispensável cultivar a renúncia
exemplificada pelo Cristo para conquistarmos a
capacidade de sacrifício que permitirá a sublimação em
mais altos níveis.
Assim, em todas as circunstâncias a que somos chamados
para o serviço edificante na construção do reino de Deus
dentro de nós, será imprescindível a prática do puro
amor, induzindo-nos à renúncia de nós mesmos para que
prevaleça a vontade divina, para o benefício próprio e
dos nossos semelhantes.
O Espírito Emmanuel, em Renúncia, psicografia de
Francisco Cândido Xavier, do livro O Espírito da
Verdade, no capítulo 59, trata das renúncias a
pessoas que não podem significar em abandono ou
indiferença, mas sim um devotamento maior a elas:
“Se teus pais não procuram a intimidade do Cristo,
renuncia à felicidade de vê-los comungar contigo o
divino banquete da Boa-Nova e ajuda teus pais.
Se teus filhos permanecem distantes do Evangelho,
renuncia ao contentamento de sentir-lhes o coração com o
teu coração na senda redentora e ajuda teus filhos.
Se teus amigos não conseguem, ainda, perceber o amor de
Jesus, renuncia à ventura de guardá-los no calor de tua
alma, ante o sol da Verdade, e ajuda teus amigos.
Renúncia com Jesus não quer dizer deserção. Expressa
devotamento maior.
Nele mesmo, o Senhor, vamos encontrar o sublime exemplo.
Esquecido de muitos e por muitos relegado às agonias da
negação, nem por isso se afastou dos companheiros que
lhe deram as angústias do amor não amado.
Ressurgindo da cruz, ele, que atravessara sozinho os
pesadelos da ingratidão e as torturas da morte, volta ao
convívio deles e lhes diz confiante:
‘Eis que estarei convosco, até ao fim dos séculos’.”
Ainda Emmanuel, em Renunciar, na psicografia de
Francisco Cândido Xavier, do livro Caminho, verdade e
vida, no Capítulo 154, esclarece sobre o verdadeiro
sentido da renúncia para a conquista da vida eterna:
“E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs,
pai, mãe, mulher, filhos ou terras, por amor do meu
nome, receberá cem vezes tanto e herdará a vida eterna.
(Mateus, 19:29)
Neste versículo do evangelho de Mateus, o Mestre divino
nos induz ao dever de renunciar aos bens do mundo para
alcançar a vida eterna. Há necessidade, proclama o
Messias, de abandonar pai e mãe, mulher e irmãos do
mundo. No entanto, é necessário esclarecer como
renunciar.
Jesus explica que o êxito pertencerá aos que assim
procederem por amor de seu nome.
À primeira vista, o alvitre divino parece contrassenso.
Como olvidar os sagrados deveres da existência, se o
Cristo veio até nós para santificá-los? Os discípulos
precipitados não souberam atingir o sentido do texto,
nos tempos mais antigos. Numerosos irmãos de ideal
recolheram-se à sombra do claustro, esquecendo
obrigações superiores e inadiáveis.
Fácil, porém, reconhecer como o Cristo renunciou.
Aos companheiros que o abandonaram aparece, glorioso, na
ressurreição. Não obstante as hesitações dos amigos,
divide com eles, no cenáculo, os júbilos eternos. Aos
homens ingratos que o crucificaram oferece sublime
roteiro de salvação com o Evangelho e nunca se descuidou
um minuto das criaturas.
Observemos, portanto, o que representa renunciar por
amor ao Cristo. É perder as esperanças da Terra,
conquistando as do Céu.
Se os pais são incompreensíveis, se a companheira é
ingrata, se os irmãos parecem cruéis, é preciso
renunciar à alegria de tê-los melhores ou perfeitos,
unindo-nos, ainda mais, a eles todos, a fim de trabalhar
no aperfeiçoamento com Jesus.
Acaso, não encontras compreensão no lar? Os amigos e
irmãos são indiferentes e rudes? Permanece ao lado
deles, mesmo assim, esperando para mais tarde o júbilo
de encontrar os que se afinam perfeitamente contigo.
Somente desse modo renunciarás aos teus, fazendo-lhes
todo o bem por dedicação ao Mestre, e, somente com
semelhante renúncia, alcançarás a vida eterna.”
No livro O Consolador, Emmanuel, na psicografia
de Francisco Cândido Xavier, na pergunta 331, comenta
sobre pessoas que realizaram renúncia para o cumprimento
de suas missões sagradas:
“Pergunta: Como devemos interpretar a sentença: ‘Há
eunucos que se castraram a si mesmos, por causa do reino
dos Céus’?
Resposta: Almas existem que, para obterem as sagradas
realizações de Deus em si próprias, entregam-se a
labores de renúncia, em existência de santificada
abnegação.
Nesse mister, é comum abdicarem transitoriamente as
ligações humanas, de modo a acrisolarem os seus afetos e
sentimentos em vidas de ascetismo e de longas
disciplinas materiais.
Quase sempre, os que na Terra se fazem eunucos para os
reinos do Céu, agem de acordo com os dispositivos
sagrados de missões redentoras, nas quais, pelo
sacrifício e pela dedicação, se redimem entes amados ou
a alma gêmea da sua, exilados nos caminhos expiatórios.
Numerosos Espíritos recebem de Jesus permissão para esse
gênero de esforços santificantes, porquanto, nessa
tarefa, os que se fazem eunucos, pelos reinos do céu,
precipitam os processos de redenção do ser ou dos seres
amados, submersos nas provas e, simultaneamente, pela
sua condição de envolvidos, podem ser mais facilmente
transformados, na Terra, em instrumentos da verdade e do
bem, redundando o seu trabalho em benefícios
inestimáveis para os entes queridos, para a coletividade
e para si próprios.”
Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec aborda a
renúncia por meio do celibato:
“699. Da parte de certas pessoas, o celibato não será um
sacrifício que fazem com o fim de se votarem, de modo
mais completo, ao serviço da Humanidade?”
“Isso é muito diferente. Eu disse: por egoísmo. Todo
sacrifício pessoal é meritório, quando feito para o bem.
Quanto maior o sacrifício, tanto maior o mérito.”
Kardec comenta: “Não
é possível que Deus se contradiga, nem que ache mau o
que ele próprio fez. Nenhum mérito, portanto, pode haver
na violação da sua lei. Mas, se o celibato, em si mesmo,
não é um estado meritório, outro tanto não se dá quando
constitui, pela renúncia às alegrias da família, um
sacrifício praticado em prol da Humanidade. Todo
sacrifício pessoal, tendo em vista o bem e sem qualquer
ideia egoísta, eleva o homem acima da sua condição
material.”
Por fim, cita-se mensagem
deixada pelo Mestre Jesus, no Evangelho de Mateus (16:
24-25): “Se
algum quiser vir nas minhas pegadas, renuncie a si
mesmo, tome a sua cruz e siga-me, porquanto aquele que
quiser salvar a vida a perderá e aquele que perder a
vida por amor de mim a encontrará de novo.”
Bibliografia:
Bíblia Sagrada.
CAMPOS, Humberto de (Espírito); (psicografado
por) Francisco Cândido Xavier. Boa
Nova. 37ª Edição. Brasília/DF: Federação
Espírita Brasileira, 2016.
EMMANUEL
(Espírito); na psicografia de Francisco Cândido Xavier;
coordenação de Saulo Cesar Ribeiro da Silva. O
Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo
Mateus. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2017.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon
Ribeiro. O Livro dos Espíritos. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
MOURA,
Marta Antunes de Oliveira. Estudo
aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de
Jesus – Parte I. Orientações espíritas e sugestões
didático-pedagógicas
direcionadas ao estudo do aspecto religioso do
Espiritismo.
1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira,
2015.
MOURA,
Marta Antunes de Oliveira de (Organizadora). Estudo
aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de
Jesus – Parte II: orientações espíritas e sugestões
didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto
religioso do Espiritismo.
1ª Edição. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação
Espírita Brasileira, 2016.
MOURA,
Marta Antunes de Oliveira (organizadora). Estudo
aprofundado da Doutrina Espírita: Cristianismo e
Espiritismo. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2017.