Artigos

por Anselmo Ferreira Vasconcelos

 

O poder da razão como atenuante à dor e ao sofrimento


Comprovando o seu papel de Consolador Prometido, o Espiritismo continua a espalhar esclarecimentos e elucidações às almas encarnadas preocupadas com a sua origem e destino. Os mais sequiosos em se aprofundar nos escaninhos da verdade divina encontram nessa doutrina certamente forças e inspiração para o enfrentamento das vicissitudes, bem como explicações racionais, sensatas e objetivas para os grandes enigmas existenciais. Um deles, sem dúvida, que aflige toda a humanidade é o fenômeno da dor e do sofrimento. Desse modo, entender o seu caráter terapêutico é vital para compreender o pensamento divino. Em outras palavras, não basta apenas sofrer; é preciso também entender porque passamos por essa experiência.

Nesse sentido, o Espírito Joanna de Ângelis elucida, na obra Plenitude (psicografia de Divaldo Pereira Franco), que:

“Certamente, o sofrimento faz parte da vida, por ser mecanismo da natureza, através do qual o progresso intelecto-moral se expressa e consolida.

“O diamante bruto aguarda a lapidação para fulgir como estrela luminosa.

“Os metais necessitam da alta temperatura, a fim de amoldarem-se à beleza e à utilidade.

“A madeira experimenta os instrumentos cortantes para desempenhar os papéis relevantes a que está destinada.

“O rio cava o próprio leito por onde corre. 

“Igualmente, o espírito necessita lapidar as arestas que lhe encobrem a luminosidade, e, para tal, o sofrimento se apresenta como ocorrência normal, que o conhecimento e a força de vontade conseguem conduzir com equilíbrio, alcançando a finalidade sublime a que se encontra destinado”.

Vê-se, portanto, que se trata de etapa natural no caminho evolutivo à qual todos estamos submetidos. Posto isto, o processo de aperfeiçoamento moral e intelectual dos indivíduos pressupõe vários estágios nesse tópico em particular. Assim sendo, à medida que se avança no terreno do entendimento tudo vai ficando mais claro. Embora sejamos dotados do DNA divino, cabe a cada um de nós a tarefa do autoburilamento, e as sucessivas encarnações são o meio mais eficaz para que tal meta seja atingida.

Vale também recordar que toda conquista humana expressiva – seja ela em que área for - vem geralmente acolitada por ingentes sacrifícios e dedicação. Pergunte-se, por exemplo, a um atleta, a um pesquisador-acadêmico, ou a um músico sobre os esforços por eles empreendidos para algo conquistar ou deixar a sua marca, e certamente os seus relatos revelarão, na essência, horas e mais horas de sofrimento e comprometimento. Tal preço parece ser inevitável para todos os que almejam alcançar algo mais, inclusive na esfera da autoiluminação.

Definitivamente, não se consegue atingir as culminâncias da espiritualidade sem os espinhos da dor e do sofrimento. Paulo de Tarso, o intimorato apóstolo dos gentios, descobriu isso às portas de Damasco através da convocação de Jesus para que ele cooperasse no serviço divino. Nesse sentido, em maior ou menor grau, chega a hora em que todo o indivíduo é também convidado a mostrar o tamanho e a coerência da sua fé. O Cristo de Deus não pede o nosso sacrifício como outrora ocorreu nos circos romanos. Aquele foi um momento histórico que demandou tal providência para que a verdade celestial se estabelecesse no mundo por meio da reforma dos valores humanos. E cabe ressaltar que Jesus foi o primeiro a perecer para que o início da transformação das criaturas se desenrolasse no planeta.

A precária condição espiritual em que ainda nos encontramos requer acentuado empenho de nossa parte para que nos autoburilemos. Como explica Joanna de Ângelis, no livro Autodescrobrimento: Uma Busca Interior (psicografia de Divaldo Pereira Franco)“Da insensibilidade inicial à percepção primária, dessa à sensibilidade, ao instinto, à razão, em escala ascendente, o psiquismo evolve, passando à intuição e atingindo níveis elevados de interação com a Mente Cósmica”. Sendo o sofrimento (pelo menos a dor-evolução) parte relevante do processo ascensional, conforme mostram as evidências, é preciso, então, (1) assimilar tal imperativo e (2) trabalhar para que ele não seja desnecessariamente ampliado. 

Desse modo, no primeiro caso cabe estudar as suas manifestações nas vidas humanas, já que há muito a aprender nesse sentido. Muitas pessoas passam por experiências acerbas, às vezes, que perduram toda uma existência, e observando-as podemos muito aprender. No segundo caso, evitando-se condutas e atitudes que possam agravar a nossa situação. Como bem afirmou Léon Denis, no livro O Problema do Ser, do Destino e da Dor, “[...] A dor será necessária enquanto o homem não tiver posto o seu pensamento e os seus atos de acordo com as leis eternas; deixará de se fazer sentir logo que se fizer a harmonia [...]”.  Eis a causa de muitos males que nos atormentam ao longo do caminho, nascidos de nossa imprudência, falta de bom senso, sentimentos obscuros e, especialmente, ausência de luz dentro de nós.

Como outrora ensinou o filósofo Aristóteles (384-322 a.C.), no seu seminal livro, Nicomachean Ethics, a sabedoria prática (a boa deliberação) pressupõe a ação benéfica, a coisa certa, realizada da maneira e na hora certas. Infelizmente, não raro os indivíduos deixam-se arrastar por estranhas fixações, culminando em atos maléficos e com consequências nefastas. E tal desarmonia não deixa de ser notada pelos maiorais da espiritualidade, cabendo ao infrator a necessidade de empreender o devido reparo no momento oportuno. Porém, o sofrimento que daí advenha não será caracterizado como um elemento evolutivo propriamente dito, mas de ajuste às leis divinas, já que essas não comportam a ideia ou prática do mal. 

Posto isto, só o entendimento nos leva à razão e essa à atitude positiva. Assim sendo, não acrescentemos maior quota de sofrimentos e desgostos em nossos passos. Foquemos igualmente no aprendizado espiritual donde se obtém diretrizes existenciais seguras à nossa vitória e progresso. Lembremos: a razão (fé raciocinada) nos estimula a evitar os tropeços éticos e morais. Por fim, tenhamos sempre em mente que só se avança se Deus e o próximo forem efetivamente alvos dos nossos melhores sentimentos e ações.  

 
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita